Mondlane: "A FRELIMO deve vergar-se e repor a verdade"
6 de novembro de 2024Em entrevista exclusiva à DW, o candidato presidencial Venâncio Mondlane confirma que já foi procurado pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) para um diálogo com o objetivo de superar a inédita crise política que o país enfrenta, mas considera a abordagem "caótica".
Os seus limites nessa pressão contra o Governo incluem, entre outros pontos, ver o partido libertador "vergar-se e repor a verdade eleitoral".
Sobre um eventual estado de sítio a ser decretado pelo Presidente da República, Mondlane entende que o poder político "perdeu o timing", pois o povo já está mobilizado a nível nacional para os mega-protestos de amanhã convocados por ele.
Falando à DW, o candidato não demonstrou receio de ser abatido se for por uma causa nobre, que é a dignidade e o bem-estar dos seus compatriotas.
DW África: Ontem, o Presidente da República apelou à união dos moçambicano, de manhã e, à tarde, o ministro da Defesa intimidou o povo... Como qualifica esta tática de "carrot and stick" usada pelo Governo da FRELIMO?
Venâncio Mondlane (VM): Isto é típico de governos cínicos. É típico de uma ausência de visão nos processos de negociação e de reconhecimento de que as políticas públicas da FRELIMO, ao longo de 50 anos, foram desastrosas.
Aqui, a questão que se coloca, não é propriamente uma questão apenas de justiça eleitoral, que nós queremos, mas sim todo um conjunto de indicadores sociais e económicos que se mostraram um verdadeiro desastre para a população. É por isso que a população acaba por se associar a este movimento.
As questões que estão a ser colocadas nos cartazes, nas reivindicações e nas manifestações passam pela questão eleitoral, mas também estão associadas a outras causas. Por isso, temos várias classes profissionais a aderir ao movimento, como médicos, professores, militares e até policiais, que têm feito vários vídeos. A questão eleitoral acabou sendo o motor que levou a população a protestar contra um conjunto de desastres na gestão pública acumulados ao longo de 50 anos.
DW África: Um eventual estado de sítio ou a atual situação de crescente intimidação, e a mega-manifestação convocada por si seriam incompatíveis. Estaria disposto a ceder frente às ameaças?
VM: Eu acho que perderam o timing. O estado de emergência teria feito sentido se tivesse sido acionado antes, como uma medida preventiva. Nesta altura, com o povo mobilizado e as manifestações sendo generalizadas a nível nacional, acredito que o estado de emergência não surtirá efeito nenhum.
DW África: É tido como um homem a abater. Vai correr o risco de se tornar o segundo herói Mondlane a ser morto pelo inimigo?
VM: Há 20 anos que sou um alvo a abater. Portanto, planos contra a minha vida e integridade física não constituem novidade para mim. O que importa é a minha convicção profunda de que estou a defender valores que vão além da vida física, que é transitória e fugaz. Os valores são intemporais, passam por gerações. Então, vale a pena lutar pelo que prevalece e perdura no tempo, em vez de pelo que é efémero, como a nossa vida física.
DW África: Já foi procurado oficialmente para um diálogo com a FRELIMO?
VM: Sim, já fui contactado por várias figuras do partido FRELIMO. Algumas disseram vir em nome próprio, outras afirmaram ter mandato, enquanto algumas eram oportunistas. Já fui abordado por eles, e não temos problemas em entrar num diálogo, desde que seja estruturado de forma sistemática, consistente e coerente. Neste momento, tudo é fragmentado e caótico.
DW África: Tanto o seu discurso como o da FRELIMO sobem de tom. Qual é o seu limite, em termos de pressão, para alcançar o que deseja?
VM: O limite para atingir os objetivos, que não são apenas meus, mas de todo o povo, seria o momento em que o Governo da FRELIMO vergasse os seus joelhos e aceitasse que deve repor a verdade eleitoral e deve aceitar uma série de condições que o povo vem reivindicando há mais de 50 anos.
O que queremos em Moçambique é simples: Primeiro, a reposição da verdade eleitoral. Em segundo lugar, é preciso acabar com um erro histórico que foi cometido: Acabar com a despartidarização completa do Estado Moçambicano.