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Moçambique: Reações da FRELIMO foram apenas "um formalismo"

24 de outubro de 2024

À DW, analista nota que intervenções de repúdio de membros da FRELIMO aos últimos acontecimentos em Moçambique "foram muito suaves" e "tentaram não pisar a linha vermelha interna" do partido.

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Campanha eleitoral da FRELIMO, outubro 2024
Analista nota que intervenções de repúdio de membros da FRELIMO "foram muito suaves"Foto: ALFREDO ZUNIGA/AFP/Getty Images

Em entrevista exclusiva à DW África, o pesquisador João Mosca, do Observatório do Meio Rural, aborda a postura da FRELIMO, partido no poder em Moçambique, nos mais recentes incidentes ocorridos em Moçambique.

João Mosca fala ainda das tensões internas que refletem uma disputa por recursos e negócios, além da falta de abertura ao diálogo com outros setores da sociedade, principalmente em momentos de tensão.

DW África: Os considerados "guardiões morais da FRELIMO" repudiaram prontamente os assassinatos de Elvino dias e de Paulo Guambe, enquanto a FRELIMO que governa mostrou por algum tempo indiferença. Que sinais exterioriza a FRELIMO com essa dualidade de atitudes?

João Mosca (JM): Dentro da FRELIMO existem várias correntes. E isso significa que o posicionamento que eles têm em relação ao que se está a passar em todo o país revela claramente essas diferenças. As correntes têm fundamentalmente a ver com a questão do acesso a recursos e negócios.

Os que repudiaram estas manifestações fizeram-no através de intervenções muito suaves, quase que obrigatórias numa situação destas, mas mantiveram um certo equilíbrio e um certo "não pisar a linha vermelha interna" da FRELIMO. Não nos podemos esquecer que estamos num momento de transição para uma possível nova governação da FRELIMO e todas essas pessoas que já intervieram estão a posicionar-se para ter uma maior ascendência e maior protagonismo, não só interna como externamente.

João Mosca, pesquisador do Observatório do Meio Rural
João Mosca, pesquisador do Observatório do Meio RuralFoto: DW/J. Beck

DW África: Foi apenas um formalismo, a seu ver?

JM: Foi claramente um formalismo, porque as pessoas que fizeram essas declarações, no passado, foram pessoas não menos violentas ou agressivas do que estas manifestações que estão a acontecer. Foram protagonistas de situações de conflitualidade muito alta. E agora são eles que, de uma forma um pouco oportunista, ou pelo menos conveniente, perante a situação, se vêm manifestar desta forma tão suave para que os seus posicionamentos não fiquem comprometidos à posteriori.

DW África: Vê a atual FRELIMO, considerada tirana e gananciosa, pronta para negociar um possível governo de unidade nacional, como pretendem alguns setores da sociedade moçambicana?

JM: A FRELIMO não tem qualquer tradição de negociação, desde a sua fundação, em 1962. Sempre foi um partido autoritário, monopartidário. Foi um partido, inclusivamente, de génese militar, e esse militarismo mantém-se.

Fazer alianças com outras forças pode ter várias interpretações. Primeiro, procurar uma situação de maior estabilidade interna para que os negócios possam funcionar com relativa estabilidade política e tranquilidade no país - daí captar mais investimento externo e mais donativos externos. Por outro lado, fazer com que essas novas possíveis alianças ocupem também alguns posicionamentos de natureza económica, mas sempre numa situação absolutamente subalterna.

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Mas eu não creio que o processo de alianças com outras forças possa acontecer, até porque a RENAMO e o MDM possivelmente irão ter uma quebra muito alta [nas eleições geraisde 9 de outubro]. Até se fala que a própria RENAMO tenha enchido urnas para aumentar a sua participação e garantir o tal segundo lugar [da oposição].

DW África: Ou seja, até na fraude, desta vez, a RENAMO poderá ter compactuado com o partido no poder…

JM: Esse pacto não é de agora. Desde a morte de Dhlakama, tem-se assistido a um conjunto de pactos silenciosos ou de distribuição de alguns recursos pelas elites da RENAMO.

Estes pactos servem fundamentalmente para distribuir pela RENAMO algumas cadeiras de poder - de muito baixo nível hierárquico - dentro da estrutura do Estado ou de outras instituições. Há também uma distribuição de negócios a um nível muito baixo, porque as principais famílias que existem dentro da FRELIMO dominam completamente os setores fundamentais da economia moçambicana.

"Que se procure a verdade nos consensos e no diálogo"

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África