Moçambique: Recenseamento eleitoral só com "padrinhos"?
11 de abril de 2024O recenseamento eleitoral começou há quase um mês e, tanto a oposição, como a sociedade civil moçambicana, queixam-se de irregularidades.
O delegado político da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) na Zambézia, Inácio Reis, denuncia que, em vários postos, continua a ser preciso ter um "padrinho" para conseguir ter cartão de eleitor.
"Aquilo que presenciámos nalguns postos de recenseamento é que prevalece o problema de sempre, a circulação de listas que são preparadas antecipadamente por grupos dinamizadores, que levam essas listas aos brigadistas", afirma Inácio Reis.
"Ao terminar essas listas, eles acabam dizendo que o [computador] está avariado. No dia seguinte, aparecem os mesmos líderes comunitários com outras listas", continua.
Na província da Zambézia, isso tem acontecido em particular nos distritos de Mulevala, Maganja da Costa, Pebane e Lugela, denuncia Inácio Reis.
Queixas de irregularidades em eleições passadas
As queixas são semelhantes às de outros recenseamentos, para outras eleições, e noutras regiões: tem havido denúncias de avarias constantes, supostamente simuladas pelos brigadistas, e de registo de eleitores facilitados ou "apadrinhados" por régulos e secretários dos bairros.
Nesse aspeto, não mudou muito, comenta Inácio Reis.
O delegado político da RENAMO na Zambézia diz que o seu partido tem alertado constantemente os órgãos eleitorais para essas irregularidades, mas as denúncias "caem em saco roto":
"Todos os processos, todos os recursos que a RENAMO submete, nenhum lhe é favorável, porque os funcionários que estão lá nos órgãos eleitorais são os mesmos, as pessoas que estão lá nos tribunais são as mesmas: tudo é FRELIMO. Porque a FRELIMO controla todas as instituições do Estado", refere o político.
O porta-voz do comité provincial da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) na Zambézia, Manuel Franco, não se quis pronunciar sobre as denúncias da RENAMO, nem sobre o processo de recenseamento em curso. Remeteu-nos à Comissão Provincial de Eleições (CPE).
Contactado pela DW, Emílio Mpanga, o presidente da CPE na Zambézia informa que, desde que o recenseamento começou, a 15 de março, não recebeu quaisquer queixas da RENAMO: "Não temos nenhuma reclamação desta natureza", sublinhou.
Mais denúncias
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) afirmou, esta semana, que, em Moçambique, já se recensearam quase 60% dos eleitores previstos, apesar de alguns contratempos por causa das chuvas ou da instabilidade na província de Cabo Delgado. Não falou noutro tipo de incidentes.
Mas as denúncias de "dupla ou tripla inscrição" de eleitores ou do suposto favorecimento de militantes da FRELIMO continuam a preocupar vários membros da oposição e da sociedade civil. O Centro de Integridade Pública (CIP) disse, por exemplo, que há "mais equipas" de recenseamento em zonas associadas habitualmente ao partido no poder, a FRELIMO, do que em zonas da RENAMO, "dificultando, desse modo", o registo de possíveis simpatizantes da oposição.
Manteigas Bulaisse, ex-cabeça de lista da RENAMO em Gurué, considera que a culpa é também do seu partido, alegadamente por haver pessoas "infiltradas" no recenseamento, que estariam a ajudar a FRELIMO a ganhar as eleições. "Pessoas da RENAMO ligadas ao STAE [Secretariado Técnico de Administração Eleitoral] deletam nomes. Eu vi com os meus olhos ser vendida uma lista de eleitores da RENAMO", afirmou Bulaisse.
Contudo, o delegado político da RENAMO na Zambézia, Inácio Reis, diz que isso não faz sentido.
"Nunca foi reportada uma 'infiltração'. Pode haver pessoas de má-fé, mas não acredito que um membro da RENAMO comprometido com a causa possa fazer esse tipo de ato", rematou.
O recenseamento termina a 28 de abril. As eleições gerais estão marcadas para 9 de outubro.