Nigerianas e a Europa: um sonho que se tornou pesadelo
9 de janeiro de 2012Muitas raparigas nigerianas não resistem à tentação quando lhes prometem emprego como cabeleireiras ou vendedoras na Europa. A história costuma acabar mal: muitas delas são obrigadas a prostituir-se, inlcuindo na Alemanha. Mas não revelam o sofrimento, mesmo quando são salvas pela polícia. Tudo por causa da magia.
Mary é uma das nigerianas que escapou por um triz. Ela é pequena e frágil, tem 17 anos, mas parece mais nova. E não se chama Mary, mas prefere não revelar a sua identidade. Há algumas semanas que vive num abrigo para mulheres com outras cinco jovens, em Benin City, no sul da Nigéria. Segundo Mary todas partilhavam um sonho: “Queríamos ir para a Europa porque aqui estamos a sofrer. Ouvi dizer que na Europa toda a gente tem comida, mesmo quando não tem dinheiro.”
Mas Mary não tencionava mendigar. Queria trabalhar, como empregada doméstica ou cabeleireira. Por isso aceitou a oferta de um homem que lhe prometeu emprego na França. Mary conta que não tiveram de pagar antecipadamente pela viagem. O pagamento seria feito na França, quando tivessem dinheiro. Mas o mais importante o passador não lhes contou: que iríam trabalhar como prostitutas.
Polícia no bom caminho, mas sem domínio do terreno
Um destino ao qual Mary escapou à justa. A polícia deteve o passador clandestino na fronteira. Há oito anos, a polícia da Nigéria criou um departamento contra o tráfico humano, que hoje tem representações em todo o país. De acordo com o agente Igri Edet Mbang: “Assim que alguém nos telefona a participar um caso indicando-nos uma morada, vamos lá e tratamos do assunto”.
Nos últimos anos, o departamento registou vários sucessos. Mas ninguém sabe ao certo quantas raparigas são traficadas para a Europa. Alguns passadores recorrem a métodos particularmente pérfidos. Antes da viagem, as jovens têm que se submeter a um ritual de juju. Trata-se de uma espécie de magia negra muito comum no sul da Nigéria. Também Mary passou pelo ritual, durante o qual teve que comer uma papa de cereais misturada com aparas das suas unhas e alguns cabelos, ao que se seguiu uma fórmula mágica. O feiticeiro ameaçou com consequências terríveis, caso ela falasse sobre a viagem.
É um método que dá bons resultados, diz Roland Nwoha, da organização “Ida Renaissance”, que se ocupa das jovens que regressam da Europa. Nwoha explica:
“Normalmente a magia basta para controlar as jovens. Na Ásia e na Europa do Leste é necessário pagar a guardas para vigiarem as mulheres. Aqui não”.
Uma crença que atrapalha as investigações
O medo do feitiço é muito grande. Ninguém fala voluntariamente à polícia ou ao juiz, nem mesmo quando os traficantes estão na prisão. Por isso os investigadores trabalham com truques. As jovens que regressam da Europa são levadas novamente a um feiticeiro, para desfazer o feitiço. Mary acaba de se submeter a mais esse riual, ela garante que se sente melhor e está certa de uma coisa: o passador clandestino não a incomodará mais.
Porém, Mary não sabe qual vai ser o seu futuro, nem onde vai viver. Gostaria de regressar à escola e terminar o liceu. Entretanto estas jovens estão estigmatizadas. Roland Nwoha explica que outras têm sucesso no exterior, mas estas mulheres regressam de mãos vazias. Para a família elas são umas fracassadas e mais um fardo. Muitas vezes as famílias venderam os seus pertences para financiar a viagem para a Europa.
Para além da má experiência na tentativa de realizar um sonho, o drama destas mulheres termina com um peso de consciência. Roland Nwoha da "Ida Renaissance" diz: "As jovens que regressam sem nada ainda por cima têm má consciência porque causaram a perda de propriedade da família”.
Autora: Marc Dugge/Cristina Krippahl
Edição: Nádia Issufo/António Rocha