Novos confrontos na República Centro-Africana
24 de abril de 2018Na semana passada, várias facções da ex-coligação rebelde Seleka, maioritariamente muçulmana, prometeram marchar na capital, Bangui, em resposta às ofensivas da Missão de Paz da ONU (MINUSCA). Grupos cristãos seguiram o exemplo.
Há vários meses que o bairro PK5, onde reside a maioria dos muçulmanos de Bangui, é palco de confrontos violentos. Além disso, paira novamente na República Centro-Africana (RCA) a ameaça de um conflito religioso.
Ainda assim, o primeiro-ministro Simplice Sarandji garante que o Governo é capaz de conter a violência. "Tal como o Presidente, pedi ao povo que não entre em pânico. O Governo está a tomar medidas para acabar com esta guerra", assegura. "Há quem fale numa eventual desestabilização do regime, mas não é o caso. Os centro-africanos estão vigilantes."
Críticas à MINUSCA
Mas a população aponta o dedo às forças do Governo e aos capacetes azuis da MINUSCA, por não conseguirem controlar a situação. Numa nova tentativa de promover a reconciliação, o Presidente Faustin Archange Touadéra encontrou-se com representantes de grupos políticos e movimentos rebeldes, na sexta-feira (20.04). Mas a desmobilização dos grupos armados avança a passos lentos. E a frustração aumenta.
"Lamentamos a posição do representante do secretário-geral da ONU, que disse que é preciso esperar 40 anos para que a paz regresse definitivamente ao país", declarou Aurelien Simplice Zingas, secretário-executivo da associação política Kélémba-PDS.
"Tenho mais de 50 anos, isto significa que a paz não vai voltar ao meu país antes da minha morte. A MINUSCA tem de ser robusta para trazer a paz ao país", argumenta o deputado.
O conflito agravou-se quando combatentes do autoproclamado grupo "autodefesa" do bairro muçulmano PK5 pegaram em armas. Dizem que as preocupações da população muçulmana da RCA não estão a ser levadas a sério e acusam o Governo de tomar o partido das milícias cristãs anti-Balaka.
Após o contra-ataque da MINUSCA, no início de abril, os habitantes do PK5 depositaram os corpos das vítimas junto ao quartel-general da missão das Nações Unidas. "A violência no PK5 já dura há muito tempo. Grupos criminosos instalaram-se no bairro, têm muitas armas e a violência contra a população é inaceitável. As pessoas não aguentam mais e pediram ajuda à ONU. E nós respondemos a esse pedido", justifica o líder da MINUSCA, Parfait Onanga-Anyanga.
Mas as críticas à MINUSCA multiplicam-se. Os centro-africanos pedem uma ação robusta contra os responsáveis pela violência. No entanto, a Missão da ONU só pode agir se estiver sob ameaça direta.
Cenário caótico
O exército nacional, por sua vez, sofre com a falta de financiamento e equipamento. Antoinette Montaigne, ex-assessora da Presidente de transição Catherine Samba-Panza, e responsável pela Academia de Paz e Desenvolvimento Efecivo, descreve um cenário caótico na RCA, com "centenas de milhares de deslocados internos, centenas de milhares de refugiados que colocam os países vizinhos em risco e ameaçam desencadear uma crise regional".
A economia nacional está em baixa, "mas os grupos armados prosperam e aumentam as tarifas que cobram à população", explica. Antoinette Montaigne. E o Estado, diz, não pode cumprir as suas obrigações por causa dos cofres vazios Antoinette Montaigne.
Entretanto, esta segunda-feira (23.04), o Presidente Faustin-Archange Touadéra afirmou que quer "acelerar" o desarmamento, desmobilização e reintegração dos membros dos grupos armados.
Touadéra falava numa reunião nas Nações Unidas sobre o processo de paz na RCA, numa altura em que o Governo ainda tem muitas dificuldades em controlar os grupos rebeldes nas zonas mais afastadas da capital.
A República Centro-Africana vive um complicado processo de transição desde 2013, quando os rebeldes Seleka derrubaram o Presidente François Bozizé, dando origem a uma onda de violência sectária entre muçulmanos e cristãos que causou milhares de mortos.