O que a África pode esperar de Trump?
15 de novembro de 2016As declarações públicas do Presidente eleito dos EUA, Donald Trump, sobre a África até agora limitaram-se às ameaças de que ele próprio ocupar-se-ia da prisão dos Presidentes Robert Mugabe, do Zimbabwe, e Yoweri Museveni, do Uganda. Sobre a África do Sul, Trump diz ter simpatia, mas declara ser um reduto do crime prestes a explodir.
Já em termos económicos, Donald Trump deverá priorizar negócios benéficos ao seu país, acreditam os especialistas. Com o slogan "América em primeiro lugar", diminuem expetativas positivas para os países que recebem ajuda em projetos de cooperação para o desenvolvimento.
“A África não deverá ser prioridade para a política externa norte-americana", diz o analista político queniano Barrack Muluka em entrevista à DW. Os EUA, porém, são parceiros importantes para os Estados africanos. O país é um dos principais doadores em projetos de desenvolvimento, além de ser o segundo maior investidor.
Lei de Crescimento e Oportunidades para a África (AGOA)
O Presidente eleito estaria interessado nas relações comerciais com benefícios para os EUA. Por isso, analistas acreditam que a Lei de Crescimento e Oportunidades para a África (AGOA) - que concede isenção de algumas taxas para entrada de produtos africanos nos Estados Unidos - seja revista.
Contudo, o economista e sociólogo alemão Robert Kappel defende que o fato não teria grandes mudanças para os países africanos, pois não são parceiros comerciais suficientemente importantes para os EUA.
A África poderia até mesmo beneficiar-se indiretamente da política comercial protecionista de Trump, acredita o analista, principalmente se ele negar o acordo de comércio entre os EUA e a Europa (Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento - APT).
“As facilidade aduaneiras entre os EUA e a União Europeia tornariam o continente africano ainda mais isolado”; diz Kappel, ex-chefe do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA) em entrevista à DW.
África subsaariana
A África subsaariana beneficia-se largamente dos projetos públicos para cooperação e desenvolvimento dos EUA. Desde 2011, esse país gasta em média por ano 8,28 mil milhões de euros, valor cinco vezes maior do que o total em 2001.
Os EUA são por isso o terceiro maior doador para África, atrás da Europa e China.
O governo Trump, porém, seguirá a linha do Partido Republicano e concederá “menos ajuda no concerne aos projetos de cooperação que não beneficiam os EUA”, acredita o economista e sociólogo alemão Robert Kappel.
O projeto “Power Africa”, iniciado pelo atual presidente Obama, poderá não ter continuidade com Trump. O projeto pretende levar eletricidade à 60 milhões de pessoas em África. Até 2018, serão necessários cerca de 6,44 mil milhões de euros do orçamento norte-americano, por isso este projeto de eletrificação corre o risco de ser deixado de lado.
Sobre essa ajuda financeira enviada à África, Trump twittou: "Cada centavo enviado por Obama [à África] será roubado – ali há corrupção desenfreada!", disse.
Considerando-se tais declarações, o mesmo deverá valer para o Plano de Emergência para o Combate ao HIV/Sida (PEPFAR), iniciado pelo então Presidente Republicano George W. Bush.
Cerco ao terrorismo
O Boko Haram na África Ocidental, os extremistas islâmicos no Sahel, o Al-Shabaab e os piratas na Somália: o empenho dos EUA contra o terrorismo e o crime organizado em África é, há anos, parte da estratégia global anti-terror do país.
O engajamento militar dos EUA em África, contudo, pode ser reduzido com Trump. “Não há interesse estratégico dos EUA na região africana ao sul do Saara”; acredita Stephen Chan, Professor do Instituto de Estudos em África e Oriente Médio da Universidade de Londres (SOAS).
Já Zachary Donnenfeld, do Institutito Sul-africano para Estudos em Segurança, acredita que os ataques norte-americanos a África por meio de drones devem aumentar, pois Trump já anunciou que seguirá uma linha dura contra o terrorismo.
Ao lado de sua retórica anti-islâmica, poderiam intensificar-se ofensivas de grupos terroristas "se Trump levar a cabo a política externa que tem anunciado, esse seria o mais efetivo instrumento de recrutamento por organizações terroristas pelo mundo”, diz Donnenfeld.