Omar al-Bashir não será extraditado do Sudão
12 de abril de 2019O organismo das Nações Unidas para os Direitos Humanos pediu esta sexta-feira (12.04) às autoridades do Sudão que cooperem com o Tribunal Penal Internacional (TPI) para que o ex-Presidente Omar al-Bashir responda por crimes contra a humanidade. "Já em 2005 uma resolução do Conselho de Segurança da ONU pediu ao Governo do Sudão que prestasse a ajuda necessária ao TPI e vamos continuar a pedir", afirmou a porta-voz Ravina Shamdasani, em conferência de imprensa.
O recém-criado Conselho Militar já anunciou que Omar al-Bashir não será entregue ao TPI nem a qualquer organismo internacional durante o período de transição, mas o ex-chefe de Estado poderá ser julgado no Sudão "se forem provadas as acusações contra ele".
O ex-Presidente é alvo de acusações de instâncias jurídicas internacionais por responsabilidades em crimes de guerra na região de Darfur. Omar al-Bashir, que governou o Sudão durante 30 anos e também chegou ao poder através de um golpe militar, foi indiciado pelo Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, por alegações de genocídio.
Na quinta-feira (11.04), o ministro da Defesa, Awad Mohamed Ibn Auf, anunciou na televisão estatal "a queda do regime e a detenção num lugar seguro do seu líder", Omar al-Bashir. O governante também anunciou o estabelecimento de um Conselho Militar de Transição por dois anos, que liderará em conjunto com o chefe de Estado-Maior do Exército, general Kamal Abdelmarouf.
A ONU também está preocupada com o facto de o exército ter declarado a suspensão da Constituição do país durante um período de transição de dois anos. "Não há indícios de que o povo vá participar neste período de transição", o que leva as Nações Unidas a pedir às autoridades um esforço para "uma verdadeira participação da sociedade civil e das vozes dissidentes", disse a porta-voz Ravina Shamdasani.
Além da suspensão da Constituição, os militares que levaram a cabo o golpe de Estado declararam o estado de emergência no Sudão durante os próximos três meses e fecharam as fronteiras e o espaço aéreo. O Governo e a presidência foram dissolvidos e imposto um recolher obrigatório.
Conselho Militar promete dialogar com forças políticas
Após a destituição do Presidente, depois de mais de quatro meses de contestação popular, o Conselho Militar de Transição prometeu esta sexta-feira (12.04) que irá dialogar com todas as "forças políticas" do país.
Numa conferência de imprensa na capital, Cartum, transmitida pela televisão, o general Omar Zain al-Abideen, apresentado como chefe do Comité Político Militar estabelecido pelo Conselho Militar, disse que a futura administração será um "Governo completamente civil", mas pediu às forças políticas que entrem em acordo sobre esse governo, sem, no entanto, especificar uma data para a sua implementação.
Omar Zain al-Abideen sublinhou, no entanto, que o ministro da Defesa será um membro do exército e que os militares também vão "participar na nomeação do ministro do Interior".
O general também confirmou que o Presidente deposto está "atualmente detido". "A nossa principal missão é preservar a segurança e a estabilidade do país", disse Zain al-Abideen, afirmando que o exército "não permitirá qualquer violação de segurança" em todo o território do Sudão. Prometeu ainda que os militares não ficarão no poder mais de dois anos.
Milhares de manifestantes nas ruas
Na manhã desta sexta-feira (12.04), milhares de manifestantes acamparam à porta do Ministério da Defesa, em Cartum, para exigir a formação de um governo civil, desafiando o recolher obrigatório imposto no dia anterior. Opõem-se à criação de um conselho militar de transição e prometeram continuar os protestos até que seja estabelecido um governo civil.
Populares e ativistas montaram grandes tendas nas imediações do ministério. "As pessoas trouxeram comida e distribuíram água entre a multidão" que se aglomerou no local, descreve a agência Reuters.
A Associação de Profissionais do Sudão (SPA), que tem sido uma importante força na organização dos protestos contra Bashir, pediu aos manifestantes para continuarem nas ruas. A porta-voz da SPA, Sara Abdelgalil, disse à DW que a sua organização rejeita um regime militar, que apenas "recicla os mesmos membros do regime".
Os protestos iniciados em dezembro, inicialmente motivados pelo aumento do preço do pão e de outros bens essenciais, acabaram por transformar-se num movimento contra Omar al-Bashir, que liderava o país desde 1989, quando chegou ao poder através de um golpe de Estado.
Especialistas das Nações Unidas condenaram, entretanto, o "excesso de força" utilizado contra manifestantes durante os protestos no Sudão, tendo também apelado ao conselho militar que está a ser formado para que "responda às queixas legítimas do povo".
Os especialistas mencionaram também detenções em larga escala e agressões contra jornalistas pelas forças de segurança sudanesas. "Neste momento de crise, o exercício de direitos de liberdade de expressão e de reunião pacífica devem ser protegidos e garantidos", afirmaram os representantes especiais das Nações Unidas para os direitos de liberdade de reunião e de associação, Clement Nyaletsossi Voule, e para a promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão, David Kaye.
UE apela a transição para regime civil
A União Europeia (UE) reiterou esta sexta-feira (12.04) o apelo à cessação da violência no Sudão. A porta-voz para os Negócios Estrangeiros, Maja Kocijancic, salientou a "necessidade de uma transição para um Governo civil", lembrando que "só um processo político credível e inclusivo pode responder às aspirações do povo sudanês".
A porta-voz remeteu ainda para uma declaração divulgada pelos 28, que apelam "a todas as partes para abandonarem a via do conflito" e salientam que "só um processo político credível e inclusivo pode responder às aspirações do povo sudanês".
O presidente da Comissão da União Africana (UA), Moussa Faki Mahamat, condenou o golpe de quinta-feira, que diz "não ser a resposta apropriada". Em comunicado, o responsável lembrou a Declaração de Lomé, de 2000, que "condena fortemente qualquer mudança de Governo de forma inconstitucional e que coloca os Estados-membros a respeitar o Estado de Direito, os princípios democráticos e os direitos humanos".