ONU preocupada com a situação dos Direitos Humanos na Guiné-Bissau
24 de janeiro de 2013Execuções, buscas domiciliárias extrajudiciais, ameaças, raptos e espancamento de políticos. Todos estes atropelos aos direitos humanos são citados no mais recente relatório das Nações Unidas sobre a Guiné-Bissau, constituindo algo "intolerável" para o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.
A situação na Guiné-Bissau é delicada, várias agências da ONU e outras organizações têm alertado para o facto do país estar refém dos traficantes internacionais de droga e do controlo da situação política estar dependente dos mesmos. Ban Ki-moon afirmou-o também em Dezembro, de forma inequívoca, quando foi apresentado um relatório no Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Guiné-Bissau: o tráfico de droga aumentou muito desde o golpe de Estado de 12 de abril liderado pelo agora chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA), general António Indjai, e faz-se com a cumplicidade das chefias militares e da elite política.
Na mais recente avaliação da situação guineense as Nações Unidas consideram inquietantes "a contínua falta de controlo e supervisão civil sobre as forças de segurança e defesa e tentativas insistentes de alguns políticos para manipular os militares para benefícios sectários". Tentativas que minam "o funcionamento eficaz das instituições estatais e sublinham a necessidade urgente de mudar radicalmente a forma como a política é conduzida no país, bem como o imperativo da reforma dos setores de Segurança e Justiça".
Roteiro de transição que inclua eleições
Se há um consenso, pelo menos a nível internacional, quanto à necessidade de resolver os problemas estruturais da Guiné-Bissau, nomeadamente reformar os sectores de Segurança e Defesa da Guiné-Bissau e ultrapassar a impunidade, também é evidente que esta é uma tarefa complexa, exigindo enormes recursos e que tem esbarrado na oposição interna das hierarquias militares.
Tanto a União Europeia como Angola viram, por exemplo, frustrados os seus esforços de reforma das Forças Armadas Guineenses. Aliás, uma das causas para o golpe de Estado de 12 abril é precisamente a resistência dos militares guineenses à tentativa de reforma empreendida pelos angolanos.
A poucas semanas da chegada à Guiné-Bissau do ex-presidente timorense José Ramos-Horta, que irá liderar a UNIOGBIS, missão criada para consolidar a paz na Guiné-Bissau, as Nações Unidas apelaram ao "diálogo entre todas as partes" de forma a que seja possível definir um roteiro de transição que inclua a realização de eleições.
Este diálogo poderá estar facilitado uma vez que o PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde), liderado pelo primeiro-ministro deposto Carlos Gomes Júnior, exilado em Portugal, assinou o "Pacto de Transição" reconhecendo o actual poder político. De acordo com o porta-voz do partido, Óscar Barbosa, o documento foi rubricado, porque o PAIGC considera reunidas as condições para que seja constituído “um governo inclusivo, de base alargada e de emanação parlamentar”.
Dificuldades em mobilizar a comunidade internacional para o financiamento das eleições guineenses
No início desta semana, Serifo Nhamadjo, presidente de transição, anunciou o adiamento das eleições gerais, promessa feita pela Junta Militar quando tomou o poder, sem adiantar uma data para a realização das mesmas. “Estava previsto que no fim da transição, houvesse eleições gerais, em Maio de 2013. Isso é impossível. Tecnicamente há muitas coisas a fazer”.
Em Dezembro, a comissão eleitoral guineense considerou serem necessários 30 milhões de euros, a revisão da legislação eleitoral e um recenseamento, para que se pudessem organizar eleições. Ramos-Horta, que no inicio de Fevereiro chega a Bissau, já disse que será difícil mobilizar a comunidade internacional para apoiar as eleições nas Guiné-Bissau, devido aos “constantes recuos no processo na Guiné-Bissau, alguma desilusão, desencanto”.
Contexto regional pode ser favorável à Guiné-Bissau
A tensão regional que se vive no Mali, Nigéria e Argélia "pode ser a salvação da Guiné-Bissau", afirma Bernardo Pires de Lima do IPRI, Instituto Português de Relações Internacionais.
Entrevistado pela DW África o analista considera que "há o perigo de um descalabro total na região, com a diluição de fronteiras existentes e proliferação de redes ligadas ao crime organizado e narcotráfico que alimentam o islamismo radical. E este islamismo em última análise pode estender à Guiné-Bissau". Este argumento do "perigo das islamização do país pode despertar o interesse internacional para questão guineense".
Bernardo Pires de Lima vai ainda mais longe, Portugal, antiga potência colonial, devia "apelar a uma conferência internacional sobre a Guiné-Bissau, em sede da União Europeia (EU), e colocar a CPLP num patamar de discussão com UE que não tem sido feito".
Autora: Helena Ferro de Gouveia
Edição: António Rocha