Parlamento alemão não reconhece genocídio na Namíbia
24 de março de 2012A 2 de outubro de 1904, o comandante das tropas alemãs no que era então o Sudoeste Africano Alemão, General Lothar von Trotha, promulgou uma ordem que viria a ser infame. Nela, anunciava que qualquer herero, armado ou não, encontrado dentro das fronteiras alemãs, seria abatido. E acrescentava que não seriam poupadas mulheres e crianças.
O povo herero foi obrigado a fugir para o deserto, o que equivaleu a uma pena de morte: entre 70 mil a 100 mil hereros e namas pereceram nos anos seguintes, a grande maioria da população destas etnias no território colonial alemão.
Associações e ONGs pedem reconhecimento
As associações das vítimas namibianas, assim como organizações não-governamentais alemãs, há muito exigem o reconhecimento deste massacre como genocídio. Em finais de fevereiro, o grupo parlamentar do Partido A Esquerda (Die Linke), introduziu um pedido neste sentido, apresentado pelo deputado Niema Movassat.
"Centenas de milhares de pessoas foram enforcadas e abatidas a tiro. Foram expulsos para o deserto e impedidos de aceder a fontes, morrendo de sede. Foram condenadas a trabalhos forçados em campos de concentração. Há que assumir a responsabilidade pelo sucedido. Nunca foi reconhecido que se tratou de genocídio. Nunca houve um pedido de perdão oficial", declara o deputado.
Matthias Basedau, especialista em assuntos africanos do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA), em Hamburgo, considera que a hesitação alemã tem a sua raiz em considerações de ordem económica.
A Namíbia é hoje considerada pelos alemães sobretudo um destino turístico. O especialista considera que "se em vez disso a Namíbia fosse um parceiro económico importante, o problema seria tratado de maneira muito diferente".
Propostas rejeitadas no Parlamento
Entretanto, os dois outros partidos na oposição em Berlim, os sociais-democratas (SPD) e os Verdes (Die Grüne), apresentaram a sua própria proposta ao Parlamento. Ela lembra que o governo de coligação SPD/Verdes no início da década instaurou um fundo de assistência aos familiares das vítimas, que, no entanto, nunca chegou a arrancar. Agora, os partidos querem reanimar este fundo e dotá-lo de mais meios.
Mas a maioria governamental rejeitou as duas propostas. Egon Jüttner, deputado da União Democrata-Cristã (CDU) da chanceler, Angela Merkel, argumenta que passou demasiado tempo sobre o sucedido.
"A convenção que pune o genocídio só foi promulgada em 1948. A Alemanha aderiu em 1955. É por isso que o governo não reconhece oficialmente o sucedido como genocídio. É claro que temos que ajudar a Namíbia, e as reparações passam pela assistência ao desenvolvimento. Numa base per capita, a Namíbia é o país que mais recebe assistência alemã", defende.
Mas para Henning Melber, analista especializado na Namíbia da Fundação sueca Dag Hammarskjöld, que viveu muitos anos no país africano, no entanto, esta história ainda não chegou ao fim. "Na Namíbia existe uma sensibilidade colectiva muito forte para as injustiças cometidas, para além de uma tradição de oralidade importante. O sofrimento das vítimas fará parte do imaginário colectivo namibiano ainda por muitos e longos anos", diz.
Autora: Cristina Krippahl
Edição: Cris Vieira / Renate Krieger