Polícia impede protesto em Luanda
8 de outubro de 2022A marcha contra a proibição do uso do cabelo crespo em algumas escolas de Luanda, prevista para acontecer este sábado (08.10), foi impedida pela polícia. O jornalista da DW e 14 manifestantes foram detidos e levados pela esquadra policial.
No fim desta tarde, porém, tanto o jornalista Borralho Ndomba como os demais detidos foram postos em liberdade.
Entre os cidadãos que pretendiam realizar a marcha estavam estudantes, encarregados de educação e alguns professores insatisfeitos com a proibição do uso dos cabelos crespos.
Um professor presente na marcha disse que considera racista a imposição das autoridades. "Nosso cabelo é nossa identidade cultural", disse ele, com um cartaz nas mãos onde se lia a mensagem "meu cabelo, minha identidade. Cabelo 'black' importa".
Detenções
Segundo o Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA), cerca de 14 estudantes foram detidos quando tentavam marchar em Luanda. Em declarações à DW, o presidente do MEA, Francisco Teixeira criticou a violência policial contra vários manifestantes.
"Estamos tristes e insatisfeitos com a postura da polícia. Eram apenas crianças que queriam manifestar, não percebo porque a tamanha brutalidade", disse.
O correspondente da DW África, Borralho Ndomba, que fazia uma transmissão em direto no local, também foi levado pela polícia e ficou detido por cerca de uma hora.
"Ao tentar questionar a razão do impedimento, forçaram-me a subir no carro, onde fui colocado com mais três estudantes", disse. O jornalista relata que foi obrigado a interromper as entrevistas e a filmagem e que teve a sua carteira e o telefone apreendidos.
Numa nota de repúdio no fim da tarde deste sábado, o Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) condenou veementemente a ação da polícia angolana, exigindo explicações sobre as sucessivas detenções de jornalistas no exercício da profissão.
"Este sábado foi o jornalista e correspondente da Voz da Alemanha, Borralho Ndomba, que se viu obrigado a interromper a transmissão que fazia da manifestação de estudantes e foi levada para a esquadra debaixo dos assentos do automóvel", lê-se na nota
"O SJA condena de modo veemente o abuso da autoridade dos efectivos da Polícia Nacional, presentes no Cemitério da Santana, e gostaria de saber se os jornalistas precisam de autorização, à luz da Constituição da República e da Lei de Imprensa, para cobrir quaisquer manifestações", escrevem.
Medo dos "cabeludos"
Dig Paihama, um dos jovens que pretendia participar na marcha, afirma que a repressão demonstra que as autoridades estão com medo dos angolanos "cabeludos".
"Na verdade, eles têm medo. De acordo com a Constituição, nós não violamos nada. E nada nos impede manifestar", desabafou.
A proibição do cabelo crespo é motivada pela educação ocidental, diz Paihama. "Esqueceram que somos africanos e temos uma identidade", disse o jovem angolano que incentiva os filhos usarem o cabelo crespo.
O tema da proibição do uso do cabelo crespo nas escolas em Luanda voltou a baila na últimas semanas, após uma mãe ter denunciado a proibição da entrada do seu filho num dos colégios de Luanda pela mesma razão. Também uma estudante do ensino médio foi retirada da turma por não pentear o cabelo. O Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA) diz que já recebeu diversas denúncias.
Na semana passada, a DW África tentou ouvir os Ministérios da Educação, da Cultura e do Turismo, sem sucesso. Em comunicado, o Ministério da Educação condenou "a descrição que tem havido nas escolas devido ao cabelo natural dos alunos".