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Procuradoria angolana acusada de pressionar vítimas nas Lundas

António Cascais1 de julho de 2013

Linda Moisés da Rosa perdeu dois filhos nas zonas de concessão de diamantes das Lundas. Diz ter sido aliciada a declarar falsamente que “foram elementos da UNITA e não soldados angolanos” quem assassinou os seus filhos.

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Linda Moisés da Rosa é uma das mulheres citadas no livro “Diamantes de Sangue - corrupção e tortura em Angola”Foto: DW/A. Cascais

Oriunda da província da Lunda Norte, Linda Moisés da Rosa é uma mulher modesta, mas determinada e destemida. Esta camponesa de perto de 50 anos de idade é uma das mulheres citadas no livro “Diamantes de Sangue - corrupção e tortura em Angola”, lançado em 2011, em Portugal, pelo ativista angolano Rafael Marques. No livro são descritos vários casos concretos de mortes e abusos perpetrados por algumas das principais figuras militares de Angola.

A camponesa já pediu explicações às autoridades para o que Rafael Marques classifica de “assassinatos perpetrados por soldados angolanos e por agentes de empresas de segurança, contratados por altos militares ligados ao poder angolano.” Encontra-se temporariamente em Luanda, na tentativa de obter justiça que tarda em chegar.

Rafael Marques
As investigações de Rafael Marques sobre as graves violações dos direitos humanos nas províncias das Lundas continuam a dar que falarFoto: Maka Angola

Os seus dois filhos que morreram nas Lundas faziam apenas o que a família sempre fez ao longo de gerações: garimpar diamantes. “Os nossos filhos cavam diamantes e fazem o garimpo lá desde o tempo colonial”, lembra Linda, recordando que “quando a UNITA [União Nacional para a Independência Total de Angola] lá entrou” o cenário não se alterou. “Os meus filhos e toda a gente cavavam lá. Eles não impediam”, acrescenta.

Mortes violentas

Segundo Linda Moisés da Rosa, a 5 de Dezembro de 2009, uma patrulha de soldados das Forças Armadas Angolanas (FAA) enterrou 45 garimpeiros vivos que se encontravam num túnel a trabalhar. Um dos mortos era o seu filho Marco João.
“Os soldados angolanos foram lá. Assim que chegaram, começaram logo a bater e a terra desabou”, recorda.

A 5 de Fevereiro de 2010, a camponesa perdeu o segundo filho, Kito Eduardo António, morto à catanada por um guarda da empresa de segurança Teleservice, conta Linda Moisés da Rosa. Os guardas terão ficado furiosos com Kito quando este revelou não ter dinheiro para lhes pagar o acesso à mina, insistindo em continuar a lavar o cascalho, para poder depois efetuar o pagamento. Mataram-no com vários golpes de catana na nuca, na testa e no rosto. Depois “pegaram no corpo e meteram-no no Rio Cuango”, conta a mãe da vítima.

Procuradoria angolana acusada de pressionar vítimas nas Lundas

PGR prometeu investigações

O jornalista e ativista Rafael Marques registou dezenas de casos graves com este, ocorridos na província da Lunda-Norte, onde se concentram as principais áreas de exploração aluvial diamantífera. Segundo os seus relatos, nesta área os habitantes vivem em regime de quase escravatura e as Forças Armadas e as empresas privadas de segurança protagonizam os crimes com total impunidade.

Em 2012, o jornalista apresentou queixa na Procuradoria Geral da República (PGR) de Angola sobre os alegados abusos, incluindo as mortes dos filhos de Linda Moisés da Rosa.

A Procuradoria prometeu investigar o caso e chegou mesmo a receber a camponesa em Luanda e a registar o seu depoimento. Depois de ter apresentado o caso na PGR, Linda Moisés da Rosa diz que lhe foi oferecido dinheiro para declarar falsamente que a UNITA era a responsável pela morte dos seus dois filhos. “Queriam dar-me dinheiro, mas eu não aceitei”, relata. “Foi o MPLA que me meteu nessa desgraça”, sublinha a camponesa.

Processo arquivado

Diamantes de Sangue
No livro “Diamantes de Sangue - corrupção e tortura em Angola” são descritos vários casos de mortes e abusos perpetrados por algumas das principais figuras militares de AngolaFoto: Tinta da China

Poucos meses depois da queixa-crime apresentada por Rafael Marques, a PGR arquivou o processo, no qual estavam implicadas, como acusados, ilustres figuras militares angolanas, como o general Manuel Hélder Dias “Kopelipa”, o general António dos Santos França Ndalu, o general João de Matos e o general Armando da Cruz Neto.

Não foi possível à DW contactar a PGR de Angola. Nem o instrutor do processo, Gervásio Canuênde, nem o procurador adjunto, Sebastião Baxi, se disponibilizaram a confirmar se, de facto, a camponesa Linda Moisés da Rosa foi aliciada a declarar falsamente que “foram elementos da UNITA e não soldados angolanos” que assassinaram os seus dois filhos.

António Cascais
Madalena Sampaio/António Rocha

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