Quénia: Três milhões de pessoas a sofrer devido à seca
28 de abril de 2017Numa altura em que a fome ameaça a África Oriental, a atenção da comunidade internacional está voltada para a Somália e o Sudão do Sul, devastados pela guerra civil. Mas, ao lado, no Quénia, mesmo sem guerra, cerca de três milhões de pessoas precisam de ajuda alimentar urgente, devido, principalmente, à seca prolongada. Mas os críticos apontam também o dedo à classe política.
Junto ao campo de refugiados de Kakuma, dirigido pela Organização das Nações Unidas (ONU), estão várias cabanas improvisadas, feitas de peles de animais, ramos de árvores e plásticos, pela tribo Turkana. Por causa da seca que afeta esta região, o grupo viu-se forçado a abandonar a vida nómada e a instalar-se ali. Os 180 mil refugiados de Kakuma são maioritariamente do Sudão do Sul e da Somália, onde a guerra e a seca trouxeram a fome e a pobreza.
Mas, no campo improvisado ao lado das instalações da ONU, quenianos como Ekiru Elimlim também pedem apoio. "Devíamos receber a mesma ajuda que os refugiados. Precisamos de comida, água e empregos", apela.
Para Elimlim, receber esta ajuda é um direito dos quenianos. "Os refugiados estão a instalar-se na nossa terra e nós devíamos ser compensados por isso. Eles recebem ajuda e nós nada. Não está certo".
A tribo Turkana depende do seu rebanho. Sem os animais, os pastores perdem o seu ganha-pão. No campo improvisado junto ao campo de Kakuma, a tribo de Ekiru Elimlim sobrevive à custa de trabalhos esporádicos e esmolas.
Sem apoio do Governo central
Em fevereiro, o Presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, classificou a seca atual como uma emergência nacional. No entanto, desde então, pouco foi feito para resolver o problema. O responsável pela distribuição de água no Governo distrital de Turkana, Emathe Namwar, critica a inércia do Governo central diante desta crise.
"Neste momento o Governo central não está a cooperar com o Governo de Turkana no planeamento da resposta conjunta. Nós já estamos a distribuir ajuda alimentar a mais de 600 mil agregados familiares", diz Namwar, alertando que "se o Governo [distrital] for distribuir comida aos mesmos agregados, há outros que não vão receber ajuda".
Entretanto, na capital, Nairóbi, o responsável pelo Ministério da Agricultura, Andrew Tuimur, afirma que o Governo central, ao contrário do que diz o Governo local, está a financiar a maior parte das ações de ajuda humanitária naquela região do país.
"Desta vez, o Governo central teve mesmo de apoiar o Governo local, porque não estavam, de todo, preparados para isto. Não tinham muito dinheiro para mitigar os efeitos da seca. Por isso, o Governo central fez a maior parte do trabalho", assegura.
Nas últimas semanas, o Governo queniano enviou geradores para a região da Turkana, para alimentar bombas de água. Mas não há combustível para abastecer os geradores. O Governo distrital diz que não tem como pagar o combustível e acusa o Executivo de negligência.
Medidas de emergência
Andrew Tuimur afirma que o Presidente Kenyatta está a trabalhar de forma incansável na mediação dos conflitos entre as tribos que lutam por água e terras. No vizinho Uganda, Kenyatta defendeu pessoalmente a tribo Turkana, para que pudessem levar os seus rebanhos em busca de novos pastos além da fronteira.
Contudo, explica o responsável do Ministério queniano da Agricultura, a situação vai piorar: a seca prolongada está agora a afetar a produção de alimentos. "As previsões dizem que as chuvas vão ser muito fracas. Em termos de colheitas, temos mesmo de nos preparar, poderão não ser tão boas este ano, porque tudo foi plantado mais tarde. É provável que tenhamos falta de alimentos, mas o Governo está a tomar medidas".
Apesar de garantir que o Governo está a preparar medidas de emergência, ainda não é claro que medidas são estas.
A poucos meses das eleições, marcadas para agosto, Governo e oposição continuam a trocar acusações, mas pouco tem sido feito pelo desenvolvimento sustentável das áreas afetadas pela seca. Enquanto os políticos estão de olhos postos nas reservas de petróleo de Turkana, descobertas em 2012, os cidadãos locais vêem-se forçados a mendigar junto a um campo de refugiados para sobreviver.