Quem é o general angolano Bento Kangamba?
5 de março de 2020As polémicas não são novidade para Bento dos Santos Kangamba. Não é a primeira vez que o empresário e político angolano está a contas com a Justiça de Angola. Em poucas palavras, o jornalista Ilídio Manuel carateriza Kangamba como uma "uma figura bastante polémica, controversa e enigmática".
Um dos enigmas é a dimensão dos negócios do general na reserva, de 54 anos, algo que, segundo Ilídio Manuel, levanta dúvidas quanto à origem do seu dinheiro. "Não se tem um Bento Kangamba como aquele empresário que criou emprego…", sublinha.
Kangamba é conhecido como um homem do desporto. É o proprietário do Kabuscorp Sport Club do Palanca, vencedor em 2013 do principal campeonato nacional, o Girabola, e da Supertaça de Angola de 2014.
No ano passado, a equipa terminou o campeonato em quarto lugar, mas foi despromovida da primeira divisão por o clube dever dinheiro a Rivaldo, ex-craque do Barcelona e da seleção brasileira de futebol. Bento Kangamba "teve um papel de criar uma equipa, que tinha como objetivo ganhar o campeonato. E também fez do desporto uma exteriorização de sinais de riqueza ao contratar figuras de desporto de projeção mundial ou mesmo continental, como foi o caso do brasileiro Rivaldo e do congolês Trésor [Mputu Mabi], que ganharam cá em Angola uma fortuna no tempo em que Angola ainda nadava em petrodólares", comenta Ilídio Manuel.
Detenção
Em 2013, Kangamba também se viu envolvido noutras polémicas. Foi acusado de ser o destinatário de cerca de três milhões de euros que foram apreendidos pela polícia francesa. Contudo, o empresário refutou as alegações. Foi ainda acusado pela Justiça brasileira de tráfico de mulheres para Angola para prostituição. Mas, em junho de 2014, foi ilibado por falta de provas.
No sábado passado (29.02), mais uma polémica: Bento Kangamba foi detido no Cunene, junto à fronteira com a Namíbia, por suspeita de "crime de burla por defraudação" e alegada tentativa de fuga. Kangamba é acusado de usar o equivalente a mais de cinco milhões de euros que lhe teriam sido entregues para "financiar uma campanha do seu partido", o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), segundo uma fonte judicial citada pela agência de notícias Lusa.
A assessoria de imprensa de "Kangamba" negou que o empresário estivesse a tentar fugir do país, sublinhando que tem estado a colaborar com a Justiça para pagar a dívida. Entretanto, Bento Kangamba foi libertado com termo de identidade e residência, mas está proibido de sair do país.
"Este termo de identidade e residência permite que Kangamba possa colaborar com a Justiça, mas no âmbito de um processo cível, porque o que está em causa é uma dívida que tem com os seus parceiros, e esperemos que isso seja resolvido", explica o jurista Carlos Viegas.
Violência contra ativistas
Em finais de 2011, o nome Kangamba foi também associado ao alegado recrutamento de "caenches", indivíduos que teriam batido em manifestantes que exigiam a renúncia do antigo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos. O ativista Manuel Nito Alves foi uma das vítimas desses homens.
"Temos áudios, vídeos e fotos. Temos arquivos sobre a milícia de Bento Kangamba e 'Godzilla', que torturava manifestações sob orientação do senhor Bento Kangamba. E a polícia notava com os seus próprios olhos a tortura aos manifestantes. Não tínhamos defesa nenhuma", relembra o ativista.
O caso nunca foi esclarecido pelas autoridades.
Empresário da juventude?
Kangamba pertence à família de José Eduardo dos Santos. O general na reserva casou com uma sobrinha do antigo chefe de Estado. Durante a governação de José Eduardo dos Santos, a influência de Kangamba era grande. Foi, por exemplo, o principal patrocinador de eventos culturais no país. E ficou conhecido como o "empresário da juventude".
Mas o jornalista Ilídio Manuel tem dúvidas quanto ao título: "Embora ele goze do rótulo de 'empresário da juventude', as pessoas não conhecem empresas que gerem crescimento económico e criem empregos. Por outro lado, as pessoas ficam com a ideia de que ele seja uma pessoa que sempre se beneficiou de algum ciclo do poder na perspetiva política e de enriquecimento".
Bento dos Santos Kangamba diz que a sua riqueza é fruto do seu trabalho. Será que a Procuradoria-Geral da República (PGR) deveria investigar a origem do dinheiro de Bento Kangamba?
"Todo o dinheiro quando avulta, quando é de grande importância, por norma, carece sempre de alguma explicação sobre as suas origens no quadro do princípio da transparência, e é normal que isso aconteça", responde o jurista Carlos Viegas. "Mas todos nós sabemos como é que ele foi adquirindo esses dinheiros, qual é o tipo de atividade empresarial que desempenhou e que circunstâncias nortearam a aquisição destes dinheiros".