RDC: Lista de candidatos às eleições promete poucas mudanças
19 de setembro de 2018Dois candidatos da oposição, Félix Tshisekedi e Vital Kamerhe, e o "delfim" do Presidente Joseph Kabila, Emmanuel Ramazani Shadary, são as principais figuras na lista de 20 nomes apresentada pela Comissão Eleitoral esta quarta-feira (19.09).
Em jogo está a primeira transição pacífica no maior país da África subsaariana, onde os desafios políticos e logísticos para uma eleição "credível, transparente e em paz" ainda são imensos.
A lista final de candidatos apresentada pela Comissão Nacional Eleitoral Independente abre caminho para a campanha eleitoral (a partir de 22 de novembro) das eleições presidenciais, legislativas e provinciais previstas para 23 de dezembro, na qual se irá escolher o sucessor do Presidente Kabila.
Joseph Kabila não pode concorrer às eleições, uma vez que já cumpriu dois mandatos como chefe de Estado, tal como está previsto na Constituição. E fez uma jogada estratégica, segundo os observadores: em agosto, Kabila renunciou a uma terceira – e ilegal – candidatura e apresentou o seu antigo ministro do Interior, Emmanuel Ramazani Shadary como candidato à Presidência. Especialistas dizem que Shadary é leal a Kabila e não tem uma base forte de apoio no partido. Por isso, para muitos, a sua nomeação é uma forma de Kabila assegurar uma parte do poder.
Mudança improvável
"Shadary é claramente o candidato favorito de Joseph Kabila, ele nomeou-o", considera Gesine Ames, analista da Rede Ecuménica da África Central. "Shadary é leal à família presidencial e, se assumir o cargo, seguirá um caminho favorável a Kabila", afirma a especialista em entrevista à DW, acrescentando que isto significa esperanças reduzidas de mudança política, algo que "a população quer urgentemente, dada a situação política e humanitária".
Mas as sondagens não têm sido favoráveis ao antigo ministro do Interior, de 57 anos, diz Ames. Membro do partido no poder, o Partido Popular para a Reconstrução e Democracia, Shadary está numa lista de sanções da União Europeia por crimes contra os direitos humanos na região de Kasai. Além disso, não é muito conhecido no país. Ainda assim, diz a investigadora da Rede Ecuménica da África Central, tem hipóteses de vencer, com uma margem reduzida. E segundo a nova lei eleitoral da RDC, o candidato presidencial precisa apenas de uma maioria simples para a vitória.
Desde o início, segundo a analista, as condições não têm sido as ideais para uma eleição democrática: "A eleição já se tornou uma farsa".
Candidatos fortes excluídos
A oposição enfrenta muitas dificuldades, com os seus candidatos também envoltos em controvérsia. Dos 20 candidatos da lista apresentada pela Comissão Eleitoral, Felix Tshisekedi e Vital Kamerhe são os mais proeminentes. Mas dois nomes da oposição inicialmente vistos como sérios candidatos à sucessão de Kabila foram excluídos da corrida: Jean-Pierre Bemba e Moïse Katumbi não podem candidatar-se à Presidência.
Bemba, ex-vice-Presidente da RDC, voltou ao país a 1 de agosto para apresentar a sua candidatura, após ser absolvido pelo Tribunal Penal Internacional de acusações de crimes de guerra. No entanto, foi condenado num caso paralelo por suborno de testemunhas. E a Comissão Eleitoral congolesa declarou, por isso, a sua candidatura "inadmissível".
Já Moïse Katumbi, um conhecido crítico do Governo, viu recusada a sua entrada no país há algumas semanas para submeter a sua candidatura. Antigo aliado do Presidente Kabila, Katumbi juntou-se à oposição no final de 2015 e vive no exílio desde 2016. O opositor disse ter sido impedido de voltar à RDC - onde é procurado pela justiça desde o início de agosto - quando tentou passar num posto fronteiriço com a Zâmbia.
Com estas exclusões, as atenções voltam-se para o líder da União para a Nação Congolesa e ex-presidente do Parlamento, Vital Kamerhe, e o líder do maior partido da oposição, Felix Tshisekedi. "Reúnem algum apoio, mas os seus campos têm menos poder que os dos candidatos que foram excluídos", diz Gesine Ames.
Falta de bases na oposição
Kamerhe, diz a investigadora, não é suficientemente conhecido para ter sucesso. Nascido na província de Kivu, é uma figura controversa no meio político e faltam-lhe os meios financeiros para organizar uma grande campanha eleitoral. O economista foi um dos colaboradores de Kabila na campanha de 2006, o que permitiu ao Presidente cessante obter um número considerável de votos nas províncias de Kivu do Norte e do Sul. Kamerhe tornou-se presidente do Parlamento, mas acabou por se demitir, pressionado por Kabila. Em dezembro de 2010, abandonou o partido no poder e fundou a União para a Nação Congolesa.
Já Felix Tshisekedi sucedeu no ano passado ao seu pai Etienne, o líder veterano da União para a Democracia e o Progresso Social. Uma mudança que gerou instabilidade, uma vez que havia outros candidatos na calha. Felix Tshisekedi tem pouca experiência política e não tem uma rede forte na RDC, diz Gesine Ames. Segundo a investigadora, falta uma base forte ao candidato de 53 anos, que estou Marketing em Bruxelas. Tshisekedi é membro do Parlamento desde 2011 e líder do seu partido desde março de 2018, mas não teve uma vida política ativa fora destes círculos.
Sem candidato de consenso
As hipóteses da oposição são reduzidas, diz Ben Shepherd, consultor do Programa de África da Chatham House: "Na política congolesa, não se trata tanto de política, mas sim de capacidade de mobilização".
A questão, afirma, não é se Tshisekedi ou Kamerhe podem vencer, mas se "a oposição consegue unir-se ao ponto de chegar a um candidato de consenso, o que poderia dar-lhe uma hipótese realista de assumir a dianteira nas eleições sem manipulação".
A população quer "mais mudanças sistémicas", mas deverá votar por quem acredita que poderá trazer um pouco mais de apoio à sua comunidade, diz o consultor. Uma vez que é pouco provável a oposição chegar a acordo quanto a um único candidato, "Shadary vai provavelmente vencer as eleições", conclui.
A oposição promete dizer mais sobre a sua estratégia num comício marcado para 29 de setembro. Na ausência de um candidato único, não está excluída a hipótese de boicote às eleições, alegando, por exemplo, preocupações de segurança com as controversas urnas eletrónicas da RDC.