RENAMO insiste na suspensão das negociações de paz
22 de outubro de 2018Em Moçambique, os pedidos de impugnação dos resultados provisórios das eleições autárquicas de 10 de outubro apresentados pelos partidos da oposição foram chumbados. Mas os argumentos dos tribunais - que variam entre alegados atrasos para a submissão e a falta das deliberações oficiais e editais anexados aos documentos dos recursos - são classificados como falsas desculpas pela RENAMO.
O maior partido da oposição insiste em interromper as negociações de paz com o Governo da FRELIMO se a verdade eleitoral não for reposta, mas garante que não quer um retorno a guerra. Uma garantia deixada pelo porta-voz do partido, José Manteigas, em entrevista à DW África.
DW África: Depois da rejeição dos recursos apresentados pela RENAMO, quais são os próximos passos?
José Manteigas (JM): Isso foi, digamos, a primeira instância. O que a RENAMO vai fazer é esperar pelo apuramento da CNE e, não havendo a reposição da verdade eleitoral, vamos interpor recurso junto do Conselho Constitucional. É um passo inevitável.
DW África: Uma das justificações dos tribunais para chumbar o recurso apresentado pela RENAMO é que o partido se queixou tardiamente e não na hora certa - enquanto decorria a votação. Confirma que isso realmente aconteceu?
JM: É uma falsa desculpa, porque, na verdade, os problemas começaram a surgir nas assembleias de voto. Quase todos os presidentes foram instruídos para não receberem as reclamações da RENAMO na mesa da assembleia. Vários elementos impediram que nós, de facto, pudéssemos trazer factos para os recursos. O que pesou muito foi que ficámos impedidos de fazer reclamações junto das assembleias de voto, porque os presidentes das mesas foram instruídos para negar essas reclamações. Ficámos sem elementos suficientes para provar aquilo que aconteceu nas urnas.
DW África: A quem se queixou a RENAMO nessas situações em que foram recusadas as queixas?
JM: Nós fizemos a reclamação junto das mesas e fomos aos tribunais, porque a RENAMO não seria tão irresponsável para apresentar os recursos extemporaneamente em todos os municípios. Um partido tão organizado como a RENAMO, tão grande, com tanta maturidade política, não faria isso. Portanto, alguma coisa está mal contada.
DW África: Os resultados definitivos das eleições autárquicas devem ser divulgados duas semanas depois da votação. Isso significa que, em princípio, na quarta-feira (24.10), serão conhecidos. Se a RENAMO não concordar com os resultados, o que é que pretende fazer?
JM: Já o disse, vamos recorrer junto do Conselho Constitucional. Por outro lado, o nosso coordenador nacional já disse publicamente que, não havendo reposição da verdade eleitoral, as negociações [de paz] serão interrompidas. Estaríamos a caminhar para uma situação de má-fé. Queremos um Moçambique estável, queremos eleições livres, justas, transparentes e credíveis e, portanto, não aceitamos que se continue a manipular os processos eleitorais. Isso defrauda a vontade popular e o povo quer ser dirigido por pessoas eleitas de forma direta e voluntária. Esperamos que o Conselho Constitucional, pela primeira vez, demonstre que está isento, livre das amarras políticas, e decida de forma séria e responsável para salvaguarda da nossa soberania.
DW África: Isso significaria voltar aos confrontos armados?
JM: A RENAMO não quer guerra. Nunca quis guerra. Se em algum momento o país esteve em confrontação militar foi por legítima defesa, porque fomos atacados. Nós nunca quisemos ir para a guerra, porque esse não é o nosso objetivo. O nosso objetivo é servir bem ao Estado moçambicano, ao nosso povo.
DW África: Então, o que é que significaria interromper o processo de negociações de paz?
JM: Significa esperarmos da parte do mais alto magistrado da nação que se posicione como garante da estabilidade nacional. Nós estamos num dilema. Queria aproveitar para dizer aqui à DW que tivemos uma denúncia muito grave de Murrupula onde, na sexta-feira (19.10), foram descobertos sete corpos sem vida e, no sábado (20.10), a polícia local pegou nos corpos e depositou numa vala comum. Não há nenhum esclarecimento e estamos a fazer diligências para denunciar isso junto dos órgãos nacionais de comunicação e não estamos a ter colaboração. A RENAMO pede que se averigue no terreno o que está a acontecer. Segundo as informações que temos, não houve nenhuma autópsia, nenhuma investigação.