Retidos em Marrocos, a meio caminho da Europa
28 de abril de 2015No ano passado, mais de 5000 pessoas chegaram a Melilla e Ceuta ilegalmente, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Melilla e Ceuta são territórios espanhóis e estão circundados por Marrocos. Por isso, a sua fronteira é a única ligação terrestre entre a União Europeia (UE) e África.
Muitos camaroneses, senegaleses, costa-marfinenses, mauritanos, malianos e congoleses sonham passar a fronteira e ter uma vida melhor na Europa. Um deles é Jean Benoit, da Guiné-Conacri. "Tenho um amigo que trabalhava na construção civil, na Europa. Quando ele voltou, ele disse que as condições de trabalho eram muito melhores do que no nosso país. Por isso, pensei: por que não? Mas, na altura, era muito mais fácil passar. Ainda não havia vedação", conta.
Há dois meses, 600 refugiados tentaram passar a vedação de seis metros de altura em Melilla. Só 35 conseguiram passar. Vários ficaram feridos. Um ano antes, 15 pessoas tentaram nadar até Ceuta e morreram afogadas. Segundo organizações de direitos humanos, os soldados na fronteira dispararam balas de borracha contra os refugiados.
De volta a Marrocos
Ao chegar a Melilla e Ceuta, muitos migrantes são mandados de volta para Marrocos – uma prática que vai contra as convenções internacionais, mas que foi aprovada pelo Parlamento espanhol. Assim, muitos migrantes acabam por se instalar em Marrocos. Aqui, quem se regista oficialmente como refugiado pode ficar a viver no país durante um ano. E quem consegue um posto de trabalho pode renovar a autorização de residência.
Quem está registado pode mesmo ter acesso gratuito ao serviço nacional de saúde "Ramed". "Foi decidido que os refugiados legais, sem meios de subsistência, podem desfrutar do Ramed. E têm também as mesmas vantagens que os marroquinos no acesso à habitação social", explica o ministro marroquino para a Migração, Anis Birou.
Na teoria, esta lei, aprovada em 2014, é muito bem-vinda, afirma Sophia Wirsching, da organização de ajuda alemã "Pão para o Mundo". Mas da teoria à prática ainda vai um passo. "Os migrantes que mais precisam não têm conhecimento desta lei."
Até agora, só algumas centenas de pessoas legalizaram a sua situação em Marrocos. Segundo Wirsching, estima-se que no país estejam 40 mil refugiados.
Sem autorização de residência, muitos migrantes trabalham no sector informal. Há também quem seja obrigado a ir para as ruas pedir dinheiro e quem entre no mundo da criminalidade.
Acampamentos informais
Frequentemente, as autoridades marroquinas fazem raides nos acampamentos informais de refugiados. O Governo de Marrocos anunciou que não vai tolerar os acampamentos durante muito mais tempo.
Em fevereiro, soldados deitaram fogo a tendas e prenderam centenas de migrantes. Muitos são levados para campos de detenção no sul do país, onde chegam a ser torturados, segundo Sophia Wirsching, da organização "Pão para o Mundo".
Com estas medidas duras, Marrocos concretiza uma exigência da UE: interceptar os refugiados muito antes de eles chegarem à Europa. Entre 2007 e 2010, Marrocos recebeu 68 milhões de euros da UE para proteger as fronteiras.
Em 2013, a UE e Marrocos assinaram um acordo de parceria: em troca da facilitação de vistos para os marroquinos entrarem na Europa, Marrocos comprometeu-se a ajudar a travar os migrantes ilegais que queiram fugir para a União.
O sociólogo marroquino Mehdi Alioua aponta o dedo ao bloco europeu. "A União Europeia é directamente responsável pelas violações dos direitos humanos cometidas em Marrocos. Ela pode não o fazer por si própria, mas deixa os outros fazer."