Reviravoltas na descentralização desagradam à RENAMO
16 de dezembro de 2016Terminou esta semana a quinta ronda de negociações de paz sem que nenhum resultado tenha sido divulgado publicamente. Os mediadores internacionais já deixaram o país e ainda não se sabe quando regressam. A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), por seu lado, avançou à DW África que não houve resultados palpáveis.
José Manteigas é chefe da delegação da RENAMO no processo e aponta aspetos que considera problemáticos: "Nesta ronda o que esperavamos era voltar a reativar a sub-comissão de trabalho que tinha sido criada antes do assassinato bárbaro do colega Jeremias Pondeca, tínhamos a sub-comissão que tratava exatamente do processo da descentralização."
Só que, acrescenta, "estranhamente a delegação do Governo veio retirar a sua posição de adesão a essa proposta de descentralização dos mediadores e propuseram a criação de um grupo de trabalho fora da própria comissão mista e pior ainda, sem a presença dos mediadores."
E o chefe da delegação da RENAMO nas negociações finaliza: "Então, isto é praticamente uma violação do entendimento que tivemos de que devia haver negociações com a presença dos negociadores internacionais, uma vez que nós entre moçambicanos a confiança é praticamente inexistente."
Soluções nacionais
Além do Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) há outros que defendem a ideia de uma discussão sobre a descentralização sem a presença dos mediadores internacionais.
Elísio Macamo é um deles. O académico moçambicano defende soluções nacionais: "Sim, acho que faz muito sentido que os problemas moçambicanos sejam resolvidos pelos moçambicanos".
E sugere que "seria até melhor que essa discussão estivesse acontecer no Parlamento e a RENAMO devia ter todo o interesse que essa discussão fosse feita no Parlamento, que envolvesse todos os partidos que estão representados no Parlamento e não procurar este protagonismo fora das estruturas que o sistema político coloca a disposição do país para resolver esses problemas."
A criação de um pequeno grupo para discutir a descentralização sem a presença dos mediadores é agora o maior ponto de desentendimento. O Governo da FRELIMO defende que o mesmo deve ser "flexível, pequeno e competente". O mesmo será responsável pela criação de um documento com os princípios que devem nortear a elaboração da legislação sobre a descentralização a ser submetido ao Parlamento.
Afastamento de mediadores desagrada à RENAMO
Mas José Manteigas faz uma interpretação diferente e diz que "são manobras dilatórias". Defende que "o Governo não quer continuar na mesa de negociações, está à procura de um pretexto para que a RENAMO se zangue e se retire da mesa de negociações, o que não vamos fazer. A outra manobra dilatória é que eles pretendem afastar os mediadores internacionais."
Para o membro da RENAMO, há neste processo contradições. "O próprio chefe de Estado fez convite as várias entidades internacionais e nós não vemos porque, estando prestes a ser alcançado um acordo, porque para nós todas as condições para um entendimento e cessação das hostilidades em todo o país estavam criadas, não vemos porque razão o Governo aparece a afastar os mediadores."
Fim de monopólio das negociações de paz?
Quer a RENAMO quer o Governo concordem ou não com este ponto da descentralização, e até mesmo sobre todos os outros pontos, o que está claro para o académico Elísio Macamo é que o processo de paz em Moçambique tem de deixar de ser monopolizado.
E Macamo adverte que "a principal consequência é que [o processo negocial] vai simplesmente acomodar [os interesses] da RENAMO ou da FRELIMO, mas não vai necessariamente resolver problemas estruturais do nosso sistema político. Esses problemas só podem ser resolvidos com a participação de toda a gente, devidamente representada."
O académico moçambicano não vaticina nenhum final feliz: "Nós pensamos que acomodar os interesses de um grupo específico é a solução para o país, mas não. Nós precisamos de uma solução que seja assumida por todas as forças políticas e sociais do país e isso não vai acontecer neste tipo de negociações sobre as quais a RENAMO e o Governo insistem."