Ruanda: um exemplo africano, 17 anos depois do genocídio
7 de abril de 2011No dia 7 de abril de 1994, começaram as matanças no pequeno país da África centro-oriental. Membros da etnia majoritária hutu massacraram cerca de 800 mil membros da etnia minoritária tutsi. 17 anos depois do genocídio, o presidente Paul Kagame propaga o Ruanda como exemplo na África.
“O balanço desses 17 anos é positivo, alcançamos resultados satisfatórios. O governo se esforçou muito para criar união e reconciliação. Não conhecemos mais tutsis ou hutus por aqui. Todos somos ruandeses. Não há diferenças”, afirmou por telefone à Deutsche Welle, Florent Janvier, o secretário-geral da Ibuka, uma associação em prol das vítimas dos massacres em Kigali, a capital do Ruanda.
Em público, o único termo étnico que se pode usar no pequeno país da África centro-oriental é Banyarwanda: ou seja, ruandeses. As definições Tutsi e Hutu são proibidas.
Hierarquia dos crimes impede reconciliação social, diz analista
Mas também há especialistas que veem o processo de reconciliação com um olhar crítico. Julia Viebach, por exemplo, é colaboradora do Centro para Pesquisas de Conflitos na Universidade de Marburg. Ela elogia o fato de o governo ruandês ter contribuído para a reconciliação. Mas há um porém: „Existe um problema social: no discurso oficial do governo, os hutus são designados como os criminosos, e os tutsi são as vítimas, o que cria uma hierarquia. E esse tipo de hierarquia não pode levar a uma reconciliação social“, avalia Viebach.
O que não fica sempre claro é que muitos dos autores do genocídio eram hutus. Mas também houve hutus que defenderam tutsis e que também acabaram se tornando vítimas dos massacres.
O presidente Paul Kagame louva os progressos do próprio país, dizendo que é um exemplo africano. Kagame, de 54 anos, criou a Frente Patriótica do Ruanda, que nas origens era um grupo rebelde. Em 1994, Kagame assumiu o poder no Ruanda, desde 2000 ele é presidente de fato no país.
“Exemplo africano” tem fissuras na fachada
Do ponto de vista social e econômico, o Ruanda é um exemplo para países africanos, em muitos setores. Em 2010, a taxa de crescimento atingiu 8%, graças a reformas liberais do governo.
A especialista Julia Viebach disse à Deutsche Welle que as reformas políticas foram as responsáveis pelo impulso econômico do Ruanda, uma vez que alguns processos de investimentos foram facilitados. Ou seja: as empresas são criadas rapidamente, e a corrupção é comprovadamente combatida no país.
Além disso, a nação das colinas recebe apoio generoso da comunidade internacional, o que resultou em sucessos no combate à malária e ao analfabetismo. 90% da população também tem seguro-saúde.
Apesar disso, crescem as críticas à postura política de Paul Kagame. “A liberdade de imprensa e de expressão são muito restritas”, diz Julia Viebach. “Existe uma sociedade civil, mas esta não é independente. A sociedade civil ainda é fiel ao governo. Caso contrário, não haveria sociedade civil. Um fator revelador foram as eleições presidenciais do ano passado, que Paul Kagame venceu com mais de 90% dos votos”, exemplifica a especialista alemã. “Antes das eleições, a oposição foi descartada de diferentes maneiras, o que faz com que o país não possa se desenvolver democraticamente”.
Em fevereiro, o Supremo Tribunal do Ruanda condenou um opositor a quatro anos de prisão, alegando que ele tinha colocado em risco a segurança nacional. A organização de direitos humanos Human Rights Watch avaliou a condenação como revés para a liberdade de expressão e a democracia no país.
Durante a campanha presidencial, o político de oposição André Kagwa Rwisereka, diretor interino do Partido Verde, foi assassinado. A polícia falou em assalto seguido de homicídio. Mas especialistas estrangeiros e defensores de direitos humanos desconfiam de um ato político.
Autora: Renate Krieger (com Elisa Cannuel)
Revisão: Helena Ferro de Gouveia