Um partido, dois líderes: Ala MADEM-G15 elege Satú Camará
18 de agosto de 2024O Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G15), segunda maior força política da Guiné-Bissau, está dividido em duas alas e tem agora dois líderes divergentes: Braima Camará e Adja Satú Camará.
O grupo de dirigentes que apoia o chefe de Estado, e que está de costas voltadas com o coordenador nacional do partido, Braima Camará, elegeu no seu primeiro congresso extraordinário a primeira vice-coordenadora do MADEM-G15, Adja Satú Camará, para dirigir o partido.
Após o anúncio das deliberações saídas do congresso extraordinário deste sábado (17.08), Adja Satú Camará apelou à união de todos os órgãos do partido para que seja ultrapassada a atual crise interna.
"Quero agradecer a todos os delegados que estão presentes aqui. De facto, podemos dizer que este voto é de amizade, mas também é de trabalho. Sobretudo nas condições em que o MADEM está. O trabalho que temos neste momento não é fácil porque precisamos fazer as pessoas compreenderem o que é a democracia", disse Satú Camará.
Ainda nas deliberações do congresso, foram anunciadas novas estruturas do partido, que passa a ter agora oito vice-coordenadores: Marciano Silva Barbeiro, Júlio Baldé, Soares Sambú, Aristides Ocante da Silva, Doménico Sanca, Sandji Fati, Tomás Gomes Barbosa, e Maria da Conceição Évora.
No congresso extraordinário houve ainda espaço para felicitações ao Presidente da República "pelos excelentes resultados que tem obtido no exercício da mais alta magistratura do país". Umaro Sissoco Embaló foi aclamado pela ala como presidente de honra do MADEM-G15.
Antes do início do congresso, o grupo que apoia o Presidente da República realizou ainda o Conselho Nacional no qual foi aprovado o levantamento da suspensão dos militantes Sandji Fati e José Carlos Macedo Monteiro que tinha sido imposta pelo conselho de direito do partido.
A direção superior do MADEM-G15 tinha avançado com um requerimento da providência cautelar junto do Tribunal de Relação, em Bissau, para impedir a realização do congresso extraordinário, mas não obteve um posicionamento do tribunal quanto ao processo. O partido promete avançar com novas ações judiciais.
"Sissoco Embaló acha que pode me enganar"
Contra a realização deste congresso extraordinário, a direção superior do MADEM G-15 realizou, também este sábado, um conselho nacional para debater a situação política nacional face à situação interna do partido. A direção defendeu que, à luz dos estatutos, o único órgão competente para marcar o congresso é o Conselho Nacional.
O conselho nacional do MADEM-G15 conta com 615 membros. A direção superior assegura que 321 participaram na reunião com Braima Camará enquanto os dirigentes que realizaram o congresso extraordinário garantiram que participaram no encontro 423 elementos do mesmo órgão.
Na abertura da reunião do Conselho Nacional, o coordenador nacional do MADEM-G15, Braima Camará, sublinhou que as divergências atuais com o Presidente da República têm que ver com a realização das eleições presidenciais.
"O acordo político que tínhamos era para que Sissoco Embaló pudesse fazer só um mandato. O ex-Presidente do Senegal, Macky Sall, perguntou-me se conseguiríamos ganhar as eleições. Disse-lhe que o candidato do MADEM-G15 poderia ir à segunda volta, mas que Sissoco Embaló faria só um mandato e ele aceitou. Combinamos que depois ele iria apoiar-me para ganhar as eleições presidenciais para que eu pudesse fazer dois mandatos. Cumprimos com a nossa parte e agora ele acha que pode me enganar".
Umaro Sissoco Embaló chegou a Presidência da República como candidato do MADEM-G15 nas eleições de 2019.
"Nenhum país pode avançar se não há liberdade"
O Ex-Presidente da República, José Mário Vaz, esteve presente na abertura do conselho nacional do MADEM-G15 como presidente de honra. Na sua declaração sobre a atual situação do país, Mário Vaz deixou um recado às autoridades do país e afirmou que a Guiné-Bissau está a atravessar "momentos muito difíceis".
“Não estou aqui para defender o coordenador do MADEM-G15, Presidente da República e nem o Presidente da Assembleia. Estou aqui para contribuir para resolver o problema e este clima de tensão que se vive neste momento. Este país precisa de paz, estabilidade, tranquilidade e sobretudo de liberdade porque nenhum país pode avançar se não há liberdade”.
No final da reunião do Conselho Nacional na noite de ontem, os militantes do MADEM-G15 decidiram retirar a confiança política ao Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, por "desrespeitar as leis do país".
Os membros do Conselho nacional decidiram também realizar um congresso extraordinário, sem data para já.
"Tudo por um segundo mandato de Sissoco"
Os principais partidos políticos na Guiné-Bissau estão a atravessar um momento particular com divergências internas e divisões no ceio partidário.
O Partido da Renovação Social (PRS) tem atualmente duas direções, após a realização de dois congressos paralelos no mês de junho.
Vários militantes e alguns dirigentes da Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB) desintegraram recentemente do partido e declaram apoio a Sissoco Embaló.
Agora é a vez do partido MADEM-G15.
O Presidente da República é apontado pelo jurista e comentador político, Marcelino N'Tupé, como responsável pela crise interna nos principais partidos. "Tudo para garantir um segundo mandato e controlar todos os órgãos", acrescenta o analista.
Em declarações à DW, Ntupé diz que, mesmo com estas divisões, o Presidente sabe que não vai conseguir um segundo mandato porque não criou condições para tal.
"É um fenómeno estranho porque desde a independência nunca nos deparámos com este tipo de crise dentro dos partidos na Guiné-Bissau. Mas tudo visa satisfazer um interesse que é o segundo mandato de Sissoco Embaló. Mesmo assim, o Presidente sabe que não vai conseguir ter sucesso com esta divisão nos partidos porque conhecemos a realidade deste país", explica Marcelino N'Tupé.
Questionado sobre o futuro do MADEM-G15 após esta divisão em duas alas, o jurista aponta para uma batalha judicial alertando que, se a justiça for feita, o congresso do grupo que apoia o Presidente da República deve ser anulado porque não foi marcado na base das regras estatutárias do partido.
"Com certeza este caso vai parar na justiça porque o partido terá dois lideres que estarão a falar em nome do partido e alguém terá de sofrer as consequências disso".