Uma câmara no Parlamento para os sobas angolanos?
22 de agosto de 2019Angola tem mais de 40 mil autoridades tradicionais distribuídas pelo país. Para hierarquizar as suas atribuições e competências, está em consulta pública desde o fim de semana uma Proposta de Lei sobre o Poder das Autoridades Tradicionais.
O soba Lucas Pedro "Muene Macongo", oriundo da província de Malanje, defende que a auscultação pública deve ser feita no máximo possível de comunidades. "As consultas devem ser feitas de região em região, [para se saber] o que se pode fazer sobre a lei de autoridade tradicional", sugere.
Entretanto, ele avança já com uma ideia: a criação de uma câmara para sobas no Parlamento angolano, para valorizar o poder tradicional. "Esta câmara é que poderia falar pelas autoridades tradicionais e para as comunidades. Doutores, engenheiros, psicólogos é que ficam no Parlamento. Nós devíamos ser representados também no nosso Parlamento. Seria uma câmara das autoridades tradicionais", explica.
Choque entre poderes?
Angola prepara-se para implementar as autarquias em todo país a partir de 2020. Questionado sobre se haveria algum choque entre o autarca e a autoridade tradicional, "Muene Macongo" responde que autoridade tradicional, no seu todo, já foi autarca. "Desde a sua criação, nós dividíamos os poderes antes da colonização. Nós dividíamos as matas, rios, lagoas, etc."
Para "Muene Macongo", no âmbito da cruzada contra a corrupção, impunidade e o nepotismo, o Presidente João Lourenço devia ouvir os sobas. "Tem que prestar atenção às autoridades tradicionais, nos receber no seu gabinete, que não é preciso audiência que demora 40 a 50 dias. E quando vai às províncias, não se limite apenas a falar com os governantes, é melhor ouvir das autoridades tradicionais, ouvir das comunidades", diz.
O Governo angolano tem estado a realizar vários encontros de reflexão sobre autoridades tradicionais. Em junho, por exemplo, o Ministério da Cultura organizou o III Encontro Nacional sobre as Autoridades Tradicionais. As reflexões decorreram sob o lema: "As Autoridades Tradicionais Face ao Estado Moderno no Fortalecimento da Democracia".
Ainda assim, Tiago Catumo, secretário-geral do Conselho Angolano de Coordenação das Autoridades Tradicionais (CACAT), pede mais respeito aos sobas e queixa-se que a sua organização não está a ser valorizada. "Somos reconhecidos e estamos no Diário da República. Mas estamos há dez anos para nos darem uma declaração definitiva para criarmos a nossa agricultura. Veja como esse Governo funciona", critica.
Tiago Catumo defende que organizações como a sua, a Mosaiko - Instituto para a Cidadania, a Associação para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA) ou a Mãos Livres têm de adquirir o estatuto de utilidade pública: "Uma associação de direito tradicional, que recebe reis, que trabalha com as comunidades e temos as nossas terras [porque não é de utilidade pública?]. No Ministério da Justiça, procura quais são as associações que têm o direito de utilidade pública - são todas dos membros do Comité Central do MPLA".