Urge preparação minuciosa da exploração do gás em Moçambique
19 de janeiro de 2023O Tribunal de Recurso britânico rejeitou um pedido de impugnação da organização ambientalista Friends of the Earth ao financiamento do Reino Unido a um projeto de extração de gás natural em Moçambique. A organização pondera o recurso.
Em causa estão 1.150 milhões de dólares prometidos por uma agência de crédito à exportação britânica para desenvolver o projeto de gás natural liquefeito 'offshore' na bacia do Rovuma, em Cabo Delgado.
A organização britânica argumenta que o financiamento não foi avaliado em termos das emissões de gases com efeito de estufa, e que contraria o compromisso do Reino Unido para cumprir o Acordo de Paris sobre as Alterações Climáticas para limitar o aquecimento global.
Falámos, a propósito, com, Tomás Langa, coordenador da ONG moçambicana Associação Amigos de Terra, que vê mérito na impugnação mas não se opõe à extração do gás natural, desde que esta se processe de forma ponderada, de modo a garantir um equilíbrio económico, social e ambiental. O objetivo, diz, é beneficiar todos os moçambicanos e não apenas as elites.
DW África: Como veem os moçambicanos a exploração do gás natural?
Tomás Langa (TL): Há várias correntes, muita das vezes díspares, às vezes complementares, no que toca à exploração de gás. E a experiência de Moçambique não é sentida como vantagem comparativa pelo grosso da população moçambicana. Neste momento, as vantagens são sentidas pelas elites. Tivemos, de facto, uma gestão não muito boa sob o ponto de vista das expetativas do povo moçambicano. Houve difusão de informações muito otimistas, de forma até exacerbada. Quando se fala da impugnação, há correntes que defendem que não só é necessariamente pelo aspeto socioeconómico, mas também pelo aspeto ambiental. O gás não é energia limpa. No processo de extração de gás, uma parte que vai para a atmosfera é prejudicial de certa forma.
DW África: Moçambique deve abrir mão desse tipo de investimentos em prol da preservação ambiental? Qual é o seu posicionamento?
TL: O meu posicionamento é neutral e vou explicar porquê. Eu olho para a poluição num sistema de economia mundo e não olho para a poluição somente em Moçambique. Moçambique não fez nem faz parte da elite dos grandes poluidores a nível mundial. Moçambique está sedento de angariação de fundos neste momento. Então, como moçambicano, eu gostaria que houvesse sim uma exploração de hidrocarbonetos, mas que essa exploração não fosse a correr, não fosse às pressas. A população tem as suas motivações. Agora aí está a questão: como angariar dinheiro sem poluir o ambiente? Como angariar dinheiro e, ao mesmo tempo, enfrentar dificuldades para a redistribuição da riqueza? Como angariar dinheiro, como angaria receitas, e satisfazer o grosso do povo moçambicano? Vai ser um desafio para o país. Estamos a falar de uma democracia ainda nova, de um povo cada vez mais exigente. Então, esses aspetos são muito complicados, se tivermos em conta os direitos humanos e que a riqueza seja de facto acessível a todos. Esse é um desafio enorme.
DW África: O que Moçambique pode fazer para superar esse desafio de que fala e alcançar esse equilíbrio?
TL: O que nós devemos fazer é prepararmo-nos, organizarmo-nos, para que, haja vantagens comparativas na exploração de qualquer que for o recurso. Nós temos bons exemplos. Podemos falar da Líbia. A Líbia também se preparou. Ou a Noruega, um país que descobriu jazidas de alumínio que não explorou logo. Levou tempo para se preparar e hoje tem o melhor exemplo daquilo que é um fundo soberano. Moçambique também está a avançar com um fundo soberano, ainda discutível para aquilo que é o pensamento das organizações da sociedade civil, porque nós sonhamos também em sermos investidores. Moçambique deve caminhar ao ritmo da preparação tecnológica cognitiva do seu povo. Os recursos não saem de lá se não forem explorados. Portanto, nada de pressas. Preparar o povo, preparar os técnicos e sonhar em ser um país de indústria transformadora e não de indústria basicamente extrativa.