Zimbabué: esperança e ceticismo à volta das eleições
22 de maio de 2018Com as eleições gerais com data provisória para julho, são muitas as expectativas no estrangeiro, mas um grande ceticismo no Zimbabué de que serão livres e justas como prometido pelo presidente Emmerson Mnangagwa, de 75 anos. O novo chefe de Estado que subiu ao poder depois de um golpe que pôs fim a 37 anos de liderança do ser antecessor Robert Mugabe, é visto como um parte do sistema que ele supostamente quer mudar.
Mas, para o cientista político na Universidade do Zimbabué, Eldred Masunungure, defende que se deve dar, pelo menos, "o benefício da dúvida”.
Quanto à reforma do sistema eleitoral, o académico mantém-se menos otimista. "Já é claramente muito tarde. Não se pode esperar que a lei seja implementada e que o ambiente mude em dois ou três meses. É, simplesmente, impossível”, conta.
Procura-se acordo justo
As negociações entre os partidos do Governo à volta de melhorias a implementar no sistema eleitoral estão a decorrer. Entre outros requisitos, a oposição insiste numa cobertura mediática mais igual e justa, especialmente se realizada por operadoras públicas. No passado, se chegasse a haver cobertura da campanha da oposição, era feita quase sempre de forma negativa.
Nas ruas da capital Harare, o sentimento geral é que nada mudou neste campo, e o partido do Governo continua a receber uma atenção mediática desproporcional."Os partidos da oposição não têm o mesmo tipo de cobertura em comparação com o partido do Governo. O partido no poder está sempre a aparecer nos ecrãs”, disse um cidadão à DW.
Para prevenir fraude eleitoral, a oposição e a sociedade civil querem saber tudo sobre a empresa que vai imprimir os boletins de voto e quantos serão impressos. Uma questão que o governo tem andado a empatar.
Financiamento sob suspeita
Outro assunto potencialmente contencioso é o financiamento da campanha. Todos os partidos receberam financiamento de acordo com o número de representantes no Parlamento. Isso significa que o partido no poder, ZANU-PF (União Nacional Africana de Zimbabué – Frente Patriótica), obteve a fatia maior. Mas têm-se levantado suspeitas de que este partido tem recebido financiamento de outras fontes. O partido tem "alargado os cordões à bolsa” durante campanha, com ofertas de veículos todo o terreno aos seus candidatos em todos os 210 distritos eleitorais, distribuição de bonés, cachecóis e camisas, cartazes gigantes com a cara do presidente, como o que cobre o edifício de 17 andares onde se localiza a sede do partido.
Muita gente acredita que o partido do poder está a usar recursos estatais e a beneficiarem de financiamento.
"Provavelmente vem de parceiros tradicionais como a China, havendo também uma relação próxima com a Rússia, que está interessada na mineração de platina no Zimbabué”, explica o correspondente da DW Priviliege Musvanhiri.
Persuasão em vez de força
Não há uma tradição de atribuição de responsabilidade e boa governação no Zimbabué, que foi liderado de forma autocrática por Robert Mugabe durante quase quatro décadas. Mas o analista Masunungure diz que seria injusto negar que têm havido mudanças para melhor. Isto aplica-se particularmente à liberdade de expressão. A oposição política tem podido organizar comícios sem ser perturbada pela polícia ou por ataques de apoiantes do ZANU-PF, o que antes, afirmou, "era acontecimento comum”
Nas ruas de Harare, as pessoas tendem a concordar. Um cidadão disse à DW que, apesar da compra de votos ainda ser uma realidade, não testemunhou violência política. "A eleição deste ano pode ser diferente. Provavelmente, não vamos testemunhar atos de violência política, assassinatos ou incêndios a propriedades”, diz.
Esta esperança deve-se à postura do Presidente Mnangagwa, que assegurou à população do Zimbabué e ao mundo qual seria a sua forma de ganhar o apoio tanto dos candidatos do próprio partido como de apoiantes. Mnangagwa disse recentemente que não se podia forçar ninguém a votar pelo seu partido. "Podemos persuadi-los a votar em nós”, afirmou.
Ceticismo saudável
Todos estes passos, incluindo convites à União Europeia e aos Estados Unidos da América para que enviem observadores eleitorais têm vindo a mudar significativamente o ambiente político tóxico.
"Mesmo nos nossos estudos qualitativos e inquéritos, há indícios que apontam que o ambiente político mudou muito”, disse o analista Masunungure.
Mas a história do país, que ele considera "desagradável” não permite um otimismo sem reservas. Como os seus compatriotas, Masunungure está alerta, à espera do que vai acontecer depois das eleições. "Estamos céticos, mas ao mesmo tempo, é um ceticismo saudável: para já, tudo bem”, conclui.