África do Sul: Jacob Zuma em tribunal por corrupção
6 de abril de 2018O ex-chefe de Estado da África do Sul, Jacob Zuma, preparava-se se para prestar declarações na primeira sessão do julgamento em que é acusado de alegada corrupção num processo de venda de armamento que terá ocorrido há 20 anos, mas o juiz ordenou o adiamento para o próximo dia 8 de junho, para que ambas as partes possam preparar diligências.
Em causa está um processo de compra de material de guerra. À época "ministro" provincial e, depois, vice-Presidente da África do Sul, Jacob Zuma é suspeito de ter recebido "luvas" da parte do grupo económico francês Thales, na sequência de um contrato de armamento de quase 4 mil milhões de euros, assinado em 1999.
O ex-Presidente sul-africano enfrenta 16 acusações de corrupção, fraude e lavagem de dinheiro. O "Acusado Número 1", como foi designado na audiência desta sexta-feira, tem vindo a negar "categoricamente" as acusações. "Como dizem em inglês, inocente até prova em contrário", voltou a frisar esta manhã, em Durban, perante milhares de apoiantes.
"Essas acusações foram anuladas e são agora relançadas, pelo que se torna claro que são políticas", sublinhou. "É claro que as pessoas que estão na justiça e na política acham que eu não tenho os mesmos direitos que todos. Um dia, aqueles querem dar continuidade a este caso vão desejar que isto nunca tivesse acontecido. Alguém tem de me dizer: o que é que eu fiz?", disse Zuma a uma multidão "pintada" com as cores do partido no poder, apesar de o Congresso Nacional Africano (ANC) ter pedido expressamente que não se usassem símbolos do partido.
Caso reaberto
Jacob Zuma é acusado de ter recebido cerca de 280 mil euros de forma ilegal no âmbito do contrato de armamento com a Thales. O grupo francês de eletrónica e defesa está igualmente a ser julgado. As "luvas" terão sido transferidas em cerca de 800 pagamentos, geridos pelo então conselheiro financeiro de Zuma, Schabir Shaik.
Em 2005, Schaik foi condenado a 15 anos de prisão. O processo contra Zuma caiu em 2009, pouco antes de concorrer à Presidência. Mas os seus opositores continuaram a lutar pela responsabilização do chefe de Estado. Finalmente, em 2016, a justiça ordenou que o caso fosse reaberto.
Em fevereiro, o Congresso Nacional Africano (ANC), partido no poder, forçou a demissão do Presidente, mergulhado em sucessivos escândalos. No mês passado, Jacob Zuma foi formalmente acusado de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro. O sucessor de Zuma, Cyril Ramaphosa, prometeu combater a corrupção no Executivo, que diz ser "um sério problema". Os observadores esperam que o caso dê o mote para a responsabilização de líderes políticos corruptos no continente africano.
Para já, Jacob Zuma vai aguardar em liberdade o início do julgamento. "O caso foi adiado provisoriamente para 8 de junho, para que o Acusado Número 2 [a Thales] possa fazer as suas diligências e para permitir que o antigo Presidente possa contestar a decisão do Ministério Público de reabrir o processo", explicou Luvuyo Mfako, porta-voz da Procuradoria sul-africana.
Figura controversa com apoio popular
De Presidente a Acusado Número 1, no espaço de dois meses: a rapidez com que a justiça marcou a audiência de Jacob Zuma é um sinal da perda de controlo que o ex-chefe de Estado tem sofrido desde que o seu sucessor, Cyril Ramaphosa, se tornou o líder do ANC, em dezembro.
No entanto, Zuma ainda goza de algum apoio popular, especialmente entre os Zulu, o seu grupo étnico. Esta sexta-feira, perante um forte aparato policial, o ex-Presidente orientou milhares de apoiantes ao som de "Umshini Wami" (em português, "Traz-me a minha metralhadora"), uma canção popularizada pelo braço armado do ANC durante as décadas de luta contra o Apartheid.
Além deste processo de corrupção na compra de material de guerra, o nome de Zuma surge em muitos outros escândalos. Em 2016, o Tribunal Constitucional sul-africano decidiu que o Presidente sul-africano violou a Constituição, no seguimento de uma investigação às obras multi-milionárias na sua residência privada com dinheiro do Estado. Zuma devolveu parte do dinheiro.
Actualmente, as autoridades sul-africanas querem deter membros da influente família Gupta, que alegadamente terá usado as suas relações com Jacob Zuma para influenciar nomeações no Governo e vencer concursos públicos.