África do Sul também quer sair do TPI
21 de outubro de 2016O ministro da Justiça da África do Sul, Michael Masutha, anunciou esta sexta-feira (21.10) que o país quer abandonar o Tribunal Penal Internacional (TPI). O Governo enviou, quarta-feira (19.10), às Nações Unidas o documento que oficializa a saída, que deverá ser efetiva depois de o secretário-geral receber a carta. O processo de retirada poderá ser completado ainda este ano.
A decisão está relacionada com o ambiente de crispação, em junho do ano passado, quando a África do Sul se recusou a prender o Presidente do Sudão, Omar al-Bashir, que visitou o país para participar na cimeira da União Africana (UA), alegando imunidade diplomática.
O chefe de Estado sudanês é alvo de um mandado de detenção do TPI que o condenou, em 2009, por crimes de guerra na região do Darfur, onde os conflitos causaram cerca de 300 mil mortos e dois milhões de pessoas fugiram de suas casas.
Segundo o ministro da Justiça sul-africano, Michael Masutha, o tribunal com sede em Haia, na Holanda, estava “a inibir as capacidades da África do Sul para honrar as suas obrigações relativas à concessão de imunidade diplomática”. Masutha afirmou ainda que as obrigações do seu Governo na resolução de conflitos internacionais são incompatíveis com as atuações do tribunal.
O Executivo de Pretória levará ao parlamento um projeto de lei para revogar todas as leis aprovadas para aplicar no país o Tratado de Roma, documento que estabeleceu o TPI.
Efeito dominó no abandono do TPI
De acordo com o ministro da Justiça sul-africano, Michael Masutha, “há a visão em África de que o TPI, na escolha de quem processar, aparentemente prefere os líderes africanos”.
Na verdade, o tribunal, estabelecido em 2002, tem sido frequentemente acusado de parcialidade contra líderes africanos. Nove em cada dez investigações do TPI envolvem africanos.
A retirada da África do Sul do TPI acontece dias depois de o Presidente do Burundi, Pierre Nkurunziza, ter sancionado a lei aprovada pelo Parlamento para se retirar do Estatuto de Roma. A Namíbia e o Quénia anunciaram a possibilidade de seguirem o exemplo.
"O mundo tem de perceber que há um problema entre os Estados africanos e o TPI", afirma Martin Oloo, advogado queniano e ativista dos direitos humanos. "Penso que este precedente vai continuar e com as próximas eleições para a presidência da Comissão da UA é provável que se ouça sobre mais saídas".
Segundo o advogado, "alguns países africanos questionam-se se o tribunal foi criado apenas para africanos. De facto, há casos de pessoas como Tony Blair e George Bush que precisam de resposta. Mas porque são líderes de nações poderosas, o mundo fecha os olhos as acusações que pendem contra eles".
Este é mais um revés para o TPI que tem lutado contra a falta de cooperação de vários países, incluindo dos Estados Unidos, que assinaram o acordo, mas nunca o ratificaram.
Em reação, a Aliança Democrática, o principal partido da oposição na África do Sul, considerou que a decisão de deixar o TPI era “irracional” e “mostra um profundo desrespeito pelo Estado de direito no seio do ANC”, o partido no poder.
Para a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, a medida “revela um desrespeito surpreendente pela justiça num país visto, há muito, como um líder global”. A Amnistia Internacional disse que a África do Sul estava a “trair milhões de vítimas de graves violações dos direitos humanos, minando o sistema de justiça internacional.”