Até 2018 o Hamburgo, membro fundador da Bundesliga em 1963, era o único clube da primeira divisão do futebol alemão que orgulhosamente podia dizer de boca cheia que jamais havia frequentado a Segundona. Enquanto outros clubes tradicionais, como Borussia Dortmund, Schalke 04, Colônia, Hannover 96, Kaiserslautern e tantos outros, já tinham experimentado esse dissabor, os hamburgueses seguiam firmes e fortes na primeira prateleira, a Bundesliga.
Na temporada 2017/2018, porém, veio o amargo despertar de um sonho. No Volksparkstadion (Estádio do Parque do Povo) de Hamburgo havia um gigantesco relógio digital que marcava há quantos anos e dias o tradicional clube da cidade já estava na elite. Ele parou marcando 54 anos e 261 dias. A queda já se prenunciava em temporadas anteriores.
Gestões incompetentes, sucessivas demissões de treinadores, equivocadas contratações de jogadores em fins de carreira, além de problemas financeiros, contribuíram, e muito, para a derrocada iminente que podia ser vista a olho nu a cada vez que o time entrava em campo. Jogava mal e apresentava resultados pífios, indignos da gloriosa história do clube.
Em 2014 e 2015, por exemplo, a equipe foi de mal a pior. Nessas duas temporadas teve que disputar a repescagem com o Greuther Fürth e Karlsruher, ambos da segunda divisão. Acabou se salvando na bacia das almas, mas o tiro de misericórdia veio mesmo em 2018. Terminou a temporada em 17º lugar e o rebaixamento foi inapelável. Na última rodada, o Hamburgo ainda venceu o Borussia M'Gladbach por 2x1, mas a vitória não foi suficiente para evitar a degola.
Ao final do jogo cenas deprimentes puderam ser vistas no estádio e apenas uma maciça intervenção das forças policiais impediram a invasão do campo e algo ainda pior.
Três temporadas na Segundona
A expectativa da imensa massa de torcedores do Hamburgo era que logo os Rote Hosen (calções vermelhos) iriam voltar para a Bundesliga. Ledo engano. O clube continuou na segunda prateleira pela terceira temporada consecutiva, mas ao menos agora, pelo futebol apresentado, a longa espera pela volta por cima pode ter um final feliz.
Assim com aconteceu nas duas últimas temporadas, o Hamburgo está diretamente envolvido na luta por um lugar ao sol na primeira divisão. Em 2019 e 2020 quase atingiu esse objetivo. Especialmente na temporada passada, faltou muito pouco para sua volta. Entretanto, em jogos decisivos das últimas rodadas o time tremeu, entregou a paçoca na bandeja e teve que se contentar com um quarto lugar que, como sabemos, não leva a lugar nenhum.
A diretoria demitiu o técnico Dieter Hecking e contratou Daniel Thioune, que durante anos dirigiu os times de base e também a equipe principal do Osnabrück com sucesso. Basta dizer que conseguiu levar o Osnabrück da terceira para a segunda divisão na temporada passada. Ele trouxe na sua bagagem a experiência na luta pelo acesso a esferas superiores na hierarquia do futebol .
Thioune soube mesclar jogadores jovens e talentosos com a experiência de profissionais veteranos, formando um conjunto homogêneo cuja receita, pelo menos até agora, parece estar dando certo.
Decorridos quase dois terços da atual campanha, o Hamburgo lidera a tabela em companhia de Bochum e Holstein Kiel. Todos tem o mesmo número de pontos ganhos (42), mas os hamburgueses estão em primeiro lugar pelo saldo de gols. Será uma luta renhida, mas, pelo futebol até agora apresentado pelos "Rote Hosen”, desta vez as chances de voltarem à elite são consideráveis.
A torcida está esperançosa e acredita que a longa espera de três anos pela volta do seu querido Hamburgo à elite finalmente terá seu fim no dia 23 de maio. Nesse dia, os comandados de Daniel Thioune farão seu último jogo do campeonato e em seguida talvez festejem seu retorno à Bundesliga, que ajudaram a fundar em 1963.
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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças.