A reconciliação é de interesse mútuo
16 de maio de 2003Sr. Holbrooke, fala-se de um possível encontro pessoal entre Bush e Schröder, por ocasião da conferência de cúpula do G8, em 1º e 2 de junho próximos na França. O sr. acredita que os dois poderão superar as suas diferenças com tal encontro?
Em primeiro lugar, quero dizer que esse encontro é essencial. Se os dois viajarem a Evian e não se reunirem, este seria o pior dos sinais. Em segundo lugar, os dois não têm simpatias mútuas. Isto foi demonstrado publicamente. Mas ambos representam grandes nações e, por isto, têm de ignorar as suas diferenças pessoais e buscar um relacionamento satisfatório, pois isto é do interesse nacional dos dois, os Estados Unidos e a Alemanha.
Se os dois não têm simpatias mútuas, é difícil para seus assessores acalmar as relações diplomáticas bilaterais?
Isto faz com que tudo seja muito mais difícil. Durante a minha carreira no Departamento de Estado ou em outras posições, eu mesmo vivi várias vezes a experiência de chefes de governo que não se davam. Mas bons diplomatas, neste caso o secretário de Estado Powell e o ministro de Relações Exteriores Fischer, têm de acalmar essas tensões. Por outro lado, bons relacionamentos pessoais de alto nível podem abrir chances históricas, como no caso dos presidentes Bush e Putin. Por isto é importante que as animosidades pessoais sejam superadas e que se pense nos interesses nacionais dos EUA e da Alemanha.
Na sua opinião, o que o chanceler federal alemão Gerhard Schröder poderia fazer para voltar a ser um estreito parceiro dos Estados Unidos, sem rebaixar-se?
Eu creio que ambos – tanto os EUA como a Alemanha – têm de acabar com o seu mau comportamento dos últimos tempos. Os alemães têm de reexaminar a sua política exterior. Falo isto como um amigo da Alemanha e como ex-embaixador, como alguém que tem um grande respeito pelo povo alemão e por tudo o que ele logrou nos anos passados.
Nos meses passados, a Alemanha deixou a sua política exterior nas mãos da França. Isto não pode ser justificado historicamente, nem foi politicamente inteligente. Por que a Alemanha necessita disto? A política exterior alemã foi mais bem sucedida quando se relacionava bem com ambos – os Estados Unidos e a França, mesmo nos momentos em que esses dois países divergiam. Isto foi assim nos últimos 50 anos. Dando uma carta-branca a Paris na questão do Iraque, a Alemanha pôs em jogo os seus próprios interesses nacionais. Chegou a hora, para que a Alemanha reconsidere tal passo e retorne à sua política tradicional dos últimos 50 anos, que foi iniciada de forma tão bem sucedida pelo então chanceler Konrad Adenauer.
Para os Estados Unidos, vale o seguinte: não podemos assumir uma posição de ficar distribuindo pontos positivos e negativos, de conceder ou retirar honrarias, como se fôssemos os juízes do mundo. Tivemos uma séria divergência de opinião com a Alemanha. Mas mesmo durante esta divergência de opinião sobre o Iraque, a Alemanha cuidou da segurança das bases americanas em seu território e aliviou a sobrecarga das tropas americanas nos combates no Iraque. A Alemanha assumiu o comando das tropas internacionais no Afeganistão, na Bósnia e no Kosovo. E a Alemanha continua sendo nosso aliado indispensável na Europa continental. Temos de pensar em tudo isto, vendo tais fatos como perspectiva para o futuro e superando a terrível fase recente.
A melhor maneira para que a Alemanha alcance isto é, na minha opinião, através de uma participação na reconstrução do Iraque, depois da derrubada de Saddam. Eu veria isto com prazer, pois a Alemanha desempenhou um papel importante na Bósnia, no Kosovo e no Afeganistão.
O sr. diz que veria com prazer, se a Alemanha participasse. O sr. acredita que a Alemanha será convidada a fazê-lo?
Esta é uma questão entre o secretário de Estado Powell, o chanceler Schröder e o ministro das Relações Exteriores Fischer. O que eu digo é o que eu, como pessoa privada, imagino que seria o melhor.
O chanceler federal Schröder deixou claro também que deseja uma maior participação das Nações Unidas na reconstrução do Iraque. O sr. acredita que se pode esperar algumas concessões nesse sentido?
Eu não posso falar pelo governo, mas acredito que o chanceler Schröder tem razão com o seu argumento de que a ONU deve desempenhar um papel importante.
Os EUA e a Grã-Bretanha não marginalizaram a ONU quando invadiram o Iraque sem uma resolução das Nações Unidas e agora decidem a melhor forma de administrar o país? Isto não faz com que a ONU pareça bastante impotente? Isto não cria um perigoso precedente?
Quero relembrar, antes de mais nada, que a ONU não é uma organização independente. Ela é simplesmente um organismo burocrático que põe em prática as instruções e o mandato do Conselho de Segurança. Se você diz que a ONU se marginalizou, isto não é bem correto. A ONU foi marginalizada através da disputa entre os EUA, a França, a Rússia, a Alemanha e a Grã-Bretanha. Isto tem de ser superado. A ONU desempenha um papel de valor incalculável no Iraque, mas não em questões de segurança. A segurança tem de ficar nas mãos da coalizão que libertou o Iraque da tirania de Saddam. Creio que todos os americanos e alemães – tenham apoiado ou não a guerra – devem constatar que o povo iraquiano passa melhor sem Saddam, do que com ele. Mas nas questões a que você se refere, de ajuda humanitária e de um governo depois de Saddam, nisto a ONU vai desempenhar um papel vital e de valor inestimável. Seja Washington favorável ou não. É do interesse dos EUA que isto ocorra. (am)