A socialite que quer desafiar Vladimir Putin
20 de outubro de 2017Com o punho erguido em sinal de confiança, Ksenia Sobchak aparece sorrindo na capa do último número da edição russa da revista feminina Glamour. A sua camiseta branca mostra os dizeres: Women, Power.
A matéria da Glamour sobre a famosa apresentadora de TV promete informações sobre as "ambições políticas" dela. Sobchak fala sobre a relação com o marido e o filho, a carreira e sua opinião sobre a igualdade de gêneros. Mas ao ser indagada sobre os seus planos de desafiar Vladimir Putin, ela se mostra evasiva, afirmando interessar-se por tudo.
Mas em carta publicada pelo jornal russo Vedomosti nesta semana, ela foi bem mais clara: "Silêncio suficiente", escreveu a socialite, anunciando a sua candidatura à presidência russa nas eleições de 2018. "Minha participação no pleito presidencial pode ser realmente um avanço em direção à transformação que o nosso país tanto precisa."
"Paris Hilton" da Rússia
O burburinho em torno de Sobchak, uma antiga estrela de reality shows, e sua possível candidatura à presidência teve início em setembro. Na época, o Vedomosti citou fontes não divulgadas da administração presidencial, afirmando que o Kremlin estava à procura de uma parceira feminina com quem Putin pudesse "treinar" na campanha.
O artigo listou uma série de políticas; uma das fontes dizia que Ksenia Sobchak seria a "candidata ideal", já que ela era "inteligente, estimulante e interessante e não correspondia à imagem de uma típica mulher russa."
Sobchak apressou-se em afirmar que não tinha nenhuma ligação com a presidência. No entanto, a mídia russa relatou recentemente que Sobchak teria tido uma conversa privada com Putin, após a filmagem de uma entrevista com o chefe de Estado russo. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, se recusou a comentar a reunião.
Apesar de a jornalista de 36 anos ter se tornado uma figura de oposição nos últimos anos, os russos não associam o seu nome à política séria. Sobchak iniciou sua carreira como "terapeuta de casais" no reality show Dom 2, uma versão russa do Big Brother.
Mais tarde, ela comandou o seu próprio programa de reality intitulado Blodinka v Shokolade, que poderia ser traduzido como A boa vida de uma loura. O show mostrava Sobchak como uma socialite acessível e glamorosa, indo às compras ou falando com os amigos ao telefone. Ela foi até mesmo chamada de a "Paris Hilton" da Rússia.
Apesar de o editor-chefe da Glamour descrever Sobchak como exemplo do que "os americanos chamam de 'self made woman'", ela vem de uma família bastante conectada. Seu pai, Anatoly Sobchak, foi o primeiro prefeito eleito de São Petersburgo e chefe de Vladimir Putin, que trabalhou como seu vice. Sua mãe, Liudmilla Narusova, também atua na política, sendo atualmente membro do Conselho da Federação da Rússia, a câmara alta do Parlamento em Moscou.
Ativista na oposição
Nos últimos anos, Ksenia Sobchak se distanciou dos reality shows que lhe trouxeram tanta fama, passando a assumir um papel ativo nos protestos em massa que se sucederam às eleições para a Duma (câmara baixa do Parlamento) em 2011. Em 2012, ela foi eleita membro do Conselho de Coordenação da Oposição, que visava unir a esfacelada oposição na época. Também faziam parte do grêmio os políticos oposicionistas Alexei Navalny, Ilya Yashin e Boris Nemtsov.
Em 2012, Sobchak falou à DW sobre a sua mudança para a política, afirmando que, durante os protestos, esperava ter convencido as pessoas de suas intenções honestas. Na época, ela disse que tinha a esperança de que o país tivesse "protestos em massa", como também "mídia livre, Justiça independente e um avanço em direção a uma total transformação."
Desde 2012, ela tem apresentado diversos talk shows políticos, inclusive no canal independente de TV Dozhd, emissora conhecida por seus pontos de vista oposicionistas. Em seu programa Sobchak Zhivyom (Sobchak ao vivo), ela realiza entrevistas críticas e recebe políticos de alto escalão, como o presidente bielorrusso Alexander Lukashenko e o ex-chefe de Estado da Geórgia Mikheil Saakashvili. Ao mesmo tempo, ela mantém uma imagem de glamour: Sobchak também é editora-chefe da edição russa da revista de moda L'Officiel.
Papel de outsider
A campanha presidencial russa não começou oficialmente, e o presidente Vladimir Putin ainda tem que anunciar a sua intenção de se reeleger em março de 2018. Mas mesmo antes de Sobchak expressar a sua candidatura, essa ideia já desencadeou um intenso debate na Rússia.
Andrey Pertsev, observador politico no Centro Carnegie de Moscou e jornalista do diário russo Kommersant, ressaltou que "o aparecimento de Ksenia Sobchak nos holofotes da política russa foi inesperado", mas que as "as discussões em torno da nomeação da apresentadora refletem a necessidade de uma alternativa a Putin."
Ele disse ainda que o burburinho evoluiu para uma séria discussão sobre Sobchak como candidata, "uma liberal convicta, bem conhecida entre o público e crítica do regime."
Mas a ideia da nomeação de Sobchak também levou a comparações com a candidatura do bilionário Mikhail Prokhorov nas eleições presidenciais de 2012. O empresário concorreu como candidato da oposição liberal, acabando em terceiro lugar no pleito.
Mas, na época, analistas como Stanislav Belkovsky reclamaram que a candidatura de Prokhorov era uma tentativa do Kremlin com vista a canalizar a frustração política dos manifestantes contrários ao governo. Na mídia russa, muitos observadores afirmaram que Sobchak serviria como a candidata da oposição que o Kremlin estava à procura.
Afinal, o candidato oposicionista Alexei Navalny não pode concorrer oficialmente nas eleições presidenciais por estar em liberdade condicional.
Antes de ela ter feito o anúncio, Navalny reagiu aos boatos da potencial candidatura de Sobchak, conclamando os jornalistas a não se aliar ao "jogo um pouco repugnante do Kremlin chamado 'vamos arrastar uma ridícula figura liberal para as eleições com vista a distrair todo mundo.'"
A própria Sobchak reagiu à declaração de Navalny e disse ao site russo de notícias RBC: "Quero dar um conselho a Navalny: não insulte as pessoas usando informações não verificadas".
Mas falando à TV Dozhd depois de anunciar sua candidatura, Sobchak enfatizou que ela considera Navalny um amigo e almeja manter a oposição unida. Ela explicou que, se no final Navalny for autorizado a participar das eleições presidenciais, ela consideraria retirar a sua candidatura.
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