Agrava-se crise entre Irã e UE
3 de agosto de 2005As tensões entre a União Européia e o Irã em torno do programa nuclear deste país crescem após o empossamento do novo presidente, Mahmoud Ahmadinejad, nesta quarta-feira (03/08). Segundo o jornal italiano Il Messaggero, o que se anuncia é "a maior crise entre o Irã e o Ocidente desde os tempos da fatwa" (uma referência à ordem universal, que pedia a todos os muçulmanos para matar o escritor anglo-indiano Salman Rushdie, decretada em 1988 pelo aiatolá Khomeini).
Os ministros do Exterior do Reino Unido, França e Alemanha, juntamente com o encarregado de Política Externa da UE, Javier Solana, salientaram a gravidade crescente da confrontação numa carta conjunta às atividades iranianas, divulgada em Paris:
"Caso o Irã retome atividades atualmente suspensas, nossas negociações estariam encerradas e não teríamos outra opção senão adotar outros cursos de ação", dizia o texto, endereçado ao diretor do programa nuclear, o secretário do Supremo Conselho Nacional de Segurança, Hassan Rowhani. Em outras palavras: trata-se do temor de que as pesquisas atômicas do Irã se voltem para o desenvolvimento de armamento bélico.
Em reação à pressão dos ministros europeus, Rowhani afirmou nesta quarta-feira que o país deverá esperar "alguns dias" para dar início ao enriquecimento do urânio.
Ocidente unido contra ameaça atômica
O chanceler federal alemão, Gerhard Schröder, garantiu que o Ocidente se manterá em sua oposição a uma bomba atômica iraniana. Ele advertiu Teerã que não tente nem colocar os países europeus uns contra os outros nem realizar "acordos unilaterais", no tocante a essa questão.
Schröder assegurou que Berlim está disposto a oferecer consideráveis incentivos econômicos, caso Teerã realize esforços claros no sentido de resolver essa situação "difícil e extremamente delicada".
Os governos francês e estadunidense sugeriram, após reunião da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que a tema fosse levado ao Conselho de Segurança da ONU, o qual poderá impor sanções ao Irã, como punição.
"Crise internacional de graves proporções"
Os ministros europeus exigiram ainda que o Irã confirme seu total compromisso com o Acordo de Paris, assinado em novembro de 2004. Neste, aquele país do Oriente Médio concordou em suspender suas próprias atividades nucleares em troca de incentivos econômicos e nucleares por parte da União Européia.
O ministro francês do Exterior, Philippe Douste-Blazy, antecipou que a decisão iraniana pelo programa nuclear poderá "desencadear uma crise internacional de graves proporções".
Conservadores linha-dura
A opção do povo iraniano, no final de junho passado, de entregar a presidência do país ao então prefeito de Teerã, Mahmoud Ahmedinejad, de 48 anos, estabeleceu uma direção inequívoca: fora com o reformista Mohamad Khatami, em favor de um curso ultraconservador.
O fato de, antes mesmo da posse de Ahmedinejad, o Irã retomar oficialmente parte do seu programa de pesquisa e desenvolvimento nuclear demonstra que, na política externa, não é de se esperar, nem mesmo na aparência, um modo de proceder diplomático.
Em vez disso, a hora é de ação decidida e independente: o novo presidente já anunciou que o Irã saberá se defender das pressões ou mesmo de eventuais ataques por parte dos EUA. Porém também a UE pode partir para o confronto: a nomeação do superconservador presidente da TV iraniana, Ali Larijani, para o cargo de ministro das Relações Exteriores, certamente contribuirá para tal.
Responsabilidade européia
O analista Peter Philipp, da Deutsche Welle, atribui à Europa pelo menos parte da culpa pelo presente estado das coisas, pois foram os europeus que insistiram em negociações com o Irã, a fim de provar aos norte-americanos que a diplomacia alcançaria mais do que o brandir de sabres. Ao mesmo tempo, esperavam contentar os iranianos com bagatelas: mais comércio, peças de reposição para aviões e promessas do gênero. Porém, como nem mesmo as promessas pareciam convincentes, Teerã partiu para a ação.
O Irã pode se dar ao luxo de destratar americanos e europeus, continua Philipp. O país não cairá por isso no isolamento econômico, já que a Ásia – em especial a China – nem pensa em reduzir a cooperação com os iranianos. E será justamente a China a frustrar os planos dos EUA, impedindo, com seu veto no Conselho de Segurança da ONU, que se imponha qualquer sanção contra o Irã.