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André Schürrle, da glória à aposentadoria em seis anos

Gerd Wenzel
Gerd Wenzel
21 de julho de 2020

Aos 29 anos, jogador que ajudou a conquistar o título da Alemanha em 2014 pendurou as chuteiras. Sua aposentadoria precoce revela a brutalidade do mundo do futebol profissional, onde não há lugar para fraquezas.

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Andre Schürrle em amistoso da Alemanha contra a Itália em 2013
Andre Schürrle em amistoso da Alemanha contra a Itália em 2013, meses antes do dia de glória no MaracanãFoto: picture-alliance/dpa/El-Saqqa

Maracanã, 13 de julho de 2014, 23 minutos da prorrogação. André Schürrle, então com 23 anos, recebe a bola próximo à linha intermediária, arranca pelo lado esquerdo e, entre dois argentinos, faz um cruzamento sob medida para Mario Götze, que mata no peito e, de canhota e de voleio, emenda para o gol decisivo para o título. Alemães em êxtase no Maracanã e na Alemanha.

Schürrle inscreveu o seu nome na história das Copas do Mundo com essa assistência, com os dois gols que marcou contra o Brasil na semifinal e com o gol contra a Argélia nas oitavas de final.

Apenas seis anos depois do extasiado momento de glória vivenciado em solo brasileiro, o jogador anuncia a sua aposentadoria do futebol profissional. A frase latina Sic transit gloria mundi (Toda glória do mundo é passageira) cai como uma luva sobre o jovem de 29 anos.   

Seu início de carreira foi fulgurante. Aos 19 anos, sob as ordens do técnico Thomas Tuchel, se tornou campeão alemão com o time sub-19 do Mainz 05 ao vencer na final o Borussia Dortmund, que então contava com um jovem de apenas 17 anos chamado Mario Götze. Os dois iriam se tornar grandes amigos e, coincidência ou não, depois da gloriosa noite no Rio de Janeiro, a carreira de ambos, contrariando todas as expectativas, não foi adiante.

São raros os profissionais do futebol que abdicam de sua carreira precocemente. Em 2015, foi a vez de Marcell Jansen do Hamburgo, também com apenas 29 anos, pendurar as chuteiras. Antes dele, Sebastian Deisler, talentoso meio-campista do Bayern, tirou o time de campo em 2007, após inúmeras lesões e fortes crises de depressão. Estava com 27 anos.

Vale lembrar ainda o trágico caso de Robert Enke, goleiro do Hannover e titular da seleção alemã que durante anos sofria de depressão crônica. Cotado para ser o número 1 da Copa do Mundo na África do Sul em 2010, acabou não resistindo às frequentes crises depressivas e se suicidou em novembro de 2009, aos 32 anos de idade.

No grande negócio chamado futebol profissional, os jogadores muitas vezes são considerados meras máquinas que precisam funcionar sempre. A sociedade esquece que esportistas são seres humanos como todos nós. Não é porque recebem vultuosos salários que estão imunes ao que leem na mídia, ao que ouvem dos torcedores e às pressões que sofrem para serem cada vez mais eficientes.

Em exaustiva entrevista ao semanário Spiegel, Schürrle deu pistas sobre os motivos de sua surpreendente aposentadoria precoce. "Foi uma decisão que amadureceu aos poucos. Fui perdendo o prazer de jogar. Faz anos que a pressão da opinião pública se tornou um fardo para mim. Durante um jogo, o medo de errar me assaltava. As reações da mídia em geral eram extremas demais", disse.

"Muitas vezes me senti solitário, especialmente quando não conseguia explorar todo meu potencial. Depois de um mau desempenho numa partida, tive receio de sair na rua e de ser execrado por torcedores exaltados. Preferi puxar o freio de mão agora enquanto ainda posso refazer minha vida."

Schürrle percebeu que o futebol profissional e todo o meganegócio bilionário ao redor do esporte estavam lhe fazendo mal e que há outros valores mais importantes para a vida em sociedade do que gols, taças e estádios lotados.

A autoimposta aposentadoria precoce de Schürrle revela também a brutalidade desse microcosmo do futebol profissional, onde não há lugar para fraquezas e sentimentos. Quem quiser sobreviver nesse mundo precisa ser portador de um escudo que o proteja dos duros e muitas vezes injustos ataques da opinião pública.

Para muitos, numa sociedade pautada pela incontrolável obsessão do "cada vez mais",  Schürrle será considerado um fracassado. Estão errados. Merece, isto sim, respeito pela atitude corajosa de dizer não e seguir o seu próprio caminho.

E tem mais. A camisa da seleção alemã ostenta quatro estrelas. A quarta estrela foi conquistada naquele memorável 13 de julho de 2014 no Maracanã, graças também ao pé esquerdo de André Schürrle, autor do cruzamento mais importante da história do futebol alemão.             

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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Desde 2002, atua nos canais ESPN como especialista em futebol alemão. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças. Siga-o no TwitterFacebook e no site Bundesliga.com.br

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Halbzeit

Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Na coluna Halbzeit, ele comenta os desafios, conquistas e novidades do futebol alemão.