Apatia de autoridades húngaras emperra caça a criminoso nazista
17 de julho de 2012Naquele dia, ele caprichou no visual. Vestiu uma nova calça comprida cáqui, uma camisa recém lavada, um casaco quadriculado cinza e branco e botou um boné na cabeça. Saiu do apartamento e pegou o bonde, indo até um centro comercial próximo, na capital húngara, Budapeste. László Csatáry não sabia que estava sendo observado durante aquele passeio de quatro horas. Desfilava tranquilamente ao largo das lojas e entrou numa banca para comprar jornal.
Mas repórteres de um tabloide britânico seguiam atentamente os passos de Csatáry. O jornal havia recebido informações do Centro Simon Wiesenthal, que caça no mundo inteiro criminosos de guerra nazistas para levá-los a julgamento.
Já em setembro de 2011, o centro havia recebido informações sobre o paradeiro de Csatáry, através de um informante, tendo verificado imediatamente a veracidade delas. Mas as autoridades húngaras não reagiram, e o diretor do Centro Wiesenthal, Efraim Zuroff, colocou Csatáry no topo da lista dos mais procurados criminosos de guerra nazistas. "Mas nada aconteceu", lamenta Zuroff em entrevista à Deutsche Welle.
Matéria no jornal chamou atenção
"Então, encaminhamos nossas informações ao jornal britânico The Sun, com quem temos uma espécie de cooperação e que já rastreou outros criminosos de guerra nazistas no passado", conta Zuroff. "Antes tínhamos zero de atenção, mas depois que o The Sun o fotografou de cueca, o mundo inteiro ficou sabendo da existência dele."
László Csatáry, de 97 anos, foi localizado por repórteres britânicos num pequeno apartamento em Budapeste, onde os jornalistas o confrontaram com seu passado. Ele pareceu constrangido. "Não, não, vá embora!", gaguejou, antes de bater a porta na cara dos ingleses.
Csatáry é considerado responsável pela deportação de quase 16 mil judeus para o campo de extermínio de Auschwitz em 1941, quando era chefe de polícia de Kosice, cidade da Eslováquia que na época pertencia à Hungria. Há registros em documentos do Centro Wiesenthal que relatam ser ele na época famoso por carregar sempre um chicote na cintura, com o qual açoitava cruelmente mulheres. O húngaro foi condenado à morte, à revelia, na Tchecoslováquia em 1948, por seus crimes de guerra.
Após a Segunda Guerra, ele havia fugido para o Canadá, onde trabalhou como comerciante de arte. Em 1955 recebeu a cidadania canadense, revogada em 1997, quando seu passado se tornou conhecido. Mas antes que Csatáry pudesse ser preso em Toronto, ele fugiu para a Europa, retornando a seu país de origem, onde viveu nos últimos anos.
Autoridades húngaras relutantes
Agora, a situação de Csatáry está num impasse. A questão está sob os cuidados das autoridades húngaras. E Zuroff continua se dizendo extremamente surpreso, já que nada acontece. "A Hungria se encontra atualmente sob fogo cerrado devido a várias questões: direitos humanos, democracia, antissemitismo. Na verdade seria realmente muito do interesse da Hungria se Csatáry fosse levado a processo."
O Ministério Público, em Budapeste, argumenta que as investigações sobre László Csatáry são um trabalho difícil, já que os crimes em questão ocorreram há 68 anos, conforme declarou o órgão nesta segunda-feira. Uma "parte significativa", alega, corresponde a tentar encontrar testemunhas oculares ainda vivas, muitas das quais possivelmente se encontram em outros países.
Historiador israelense nascido em Nova York, Zuroff assumiu a direção do Centro Simon Wiesenthal após a morte do fundador da entidade e tem se dedicado principalmente a encontrar criminosos do Holocausto oriundos dos Balcãs. Em 2011, ele publicou o livro Operation Last Chance; one man's quest to bring nazi criminals to justice ("Operação última chance, a busca solitária de um homem para levar criminosos nazistas à justiça", em tradução livre).
No entanto, Zuroff corre contra o tempo. Os poucos criminosos de guerra nazistas ainda vivos têm, em maioria, mais de 90 anos e poucos anos de vida pela frente. Mas assassinato é um crime que não prescreve. Portanto, os criminosos podem ser julgados por seus crimes, mesmo décadas depois de os terem cometido. "Rastrear e caçar os criminosos é, por vezes, um trabalho incrivelmente frustrante", reclama Zuroff. "Mas as dificuldades que enfrento não são absolutamente nada em comparação com o sofrimento e a dor das vítimas e sobreviventes do Holocausto."
Autora: Arne Lichtenberg (md)
Revisão: Alexandre Schossler