Apple segue explorando operários na China, afirma ONG trabalhista
3 de agosto de 2013Em seu relatório mais recente, a organização de direitos trabalhistas China Labor Watch (CLW), sediada em Nova York, acusa a multinacional de produtos eletrônicos Apple de operar com a fornecedora taiwanesa Pegatron, que viola os direitos dos operários de forma sistemática e especialmente grave. A DW entrevistou o diretor geral da CLW, Li Qiang.
Deutsche Welle: No ano passado, a Apple foi alvo de críticas, devido às más condições de trabalho nas fábricas da Foxconn, na época maior fornecedora de iPhones. Agora, a China Labor Watch constatou que a situação na Pegatron é ainda pior. Como?
Li Qiang: As práticas na fornecedora Pegatron não colidem apenas com as diretrizes da Apple de proteção aos funcionários, mas também contrariam a legislação trabalhista chinesa. Ao todo, registramos mais de 30 violações. Embora o desrespeito aos direitos dos operários seja muito difundido nas fábricas chinesas, pode-se afirmar que as condições de trabalho na Pegatron estão ainda abaixo dos padrões usuais do setor eletrônico.
Que violações considera especialmente graves?
A lei trabalhista chinesa dita que o operário não faça mais de 36 horas extras mensais. Na Pegatron, a regra é de 100 horas extras por mês. Os documentos sobre as horas extras são manipulados para não chamarem a atenção durante a fiscalização pela Apple. A Pegatron emprega muitos trabalhadores temporários, muito mais do que a taxa legalmente permitida. Para esses, ela não paga nem seguro social, nem aposentadoria.
Durante o período de experiência, os operários têm que entregar seus documentos de identidade e só recebem os papéis de volta semanas mais tarde. Dessa forma, muitos são obrigados a continuar trabalhando. Quem se demite antes da hora, recebe menos pagamento.
No processo de seleção, a discriminação é rigorosa: quem tem menos de 1,50 metro de altura ou mais de 35 anos de idade, é rejeitado. O mesmo ocorre com muçulmanos, uigures, tibetanos ou membros de algumas outras minorias étnicas.
Num mundo globalizado, como é possível combater a exploração dos trabalhadores de forma eficaz?
O governo e as empresas poderiam fazer algo, só que não estão seriamente interessados na proteção dos operários. As autoridades locais na China pagam qualquer preço para atrair investidores, e aceitam tacitamente a violação do direito trabalhista. Afinal de contas, a maioria dos empregados nas fábricas não é natural da própria província – são trabalhadores sazonais vindos do interior, que pouca importância têm para as autoridades.
E as empresas querem baixar os custos, é claro. A competição entre os fornecedores é grande: quem oferece o produto ao preço mais baixo ganha o adicional.
A Apple cita quatro fatores em sua cadeia de valor: preço, qualidade, rapidez e responsabilidade social. Na prática, porém, os três primeiros critérios dominam: eles é que decidem se um fornecedor recebe uma encomenda.
Então, não se pode contar nem com a política, nem com as empresas. Em que pé anda a organização trabalhista na China?
Na China só existe um sindicato oficial. No que diz respeito ao seu financiamento, a Secretaria das Finanças recolhe diretamente as contribuições dos afiliados. No fim das contas, o dinheiro vem das empresas e é repassado diretamente para o sindicato. Por isso, ele não defende os interesses dos empregados, e sim dos empregadores. Os operários da China não têm uma organização própria que defenda os seus direitos. Os conglomerados internacionais precisam tomar consciência da sua responsabilidade social e implementar as normas trabalhistas que propagam. Mas a Apple está longe de aplicar esse princípio.
A pressão pública sobre a Apple não é grande o suficiente?
Contra a pressão pública, a Apple faz trabalho de relações públicas. Vale mais a pena investir um pouco na publicidade do que se preoocupar seriamente com a melhoria das condições de trabalho. Além disso, a onda de indignação logo vai baixar. É improvável que ocorra uma fiscalização mais rigorosa.