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Após 35 anos, chega ao fim protesto anti-nuclear na Alemanha

31 de dezembro de 2021

Mensalmente, há mais de três décadas, ativistas e pessoas contrárias à energia nuclear se reuniam em frente à usina de Brokdorf. Agora, a vigília acabou: o reator será desativado nesta sexta-feira.

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Pessoas tocam violão em frente a uma usina nuclear. Outras pessoas seguram cartazes.
Foto: Wulf Pfeiffer/dpa/picture alliance

Um vento gelado sopra sobre a usina nuclear de Brokdorf, que fica entre prados úmidos e um dique coberto por uma fina camada de neve.

Um pequeno grupo, na maioria idosos, pendura uma faixa amarela no portão protegido do reator nuclear: "Desligue as usinas nucleares", está escrito.

Reunidos neste dia cinzento de inverno no estado de Schleswig-Holstein, no extremo norte da Alemanha, os ativistas são, em sua maioria, da região - embora alguns tenham vindo de Hamburgo e de outras partes.

Cantando canções de paz e conversando, o grupo parece bem ajustado ao frio congelante. Não é para menos: há 35 anos, eles se reúnem em frente ao portão da usina no dia 6 de cada mês.

Mais uma vez, eles estão em vigília para homenagear as vítimas das catástrofes nucleares e exigir o desligamento do reator nuclear.

No entanto, dessa vez há uma diferença: esta 425ª vigília será a última.

Nesta sexta-feira (31/12), a usina nuclear de Brokdorf será fechada, como parte do programa de eliminação progressiva de energia nuclear na Alemanha até 2022.

O reator tem sido um dos mais polêmicos da Alemanha e um dos mais produtivos do mundo.

"Estou feliz que esteja sendo desligado", disse Hans-Günter Werner, pastor e cofundador da iniciativa ativista. "Não estou triste, mas estou um pouco nostálgico, porque sei que não nos veremos de novo tão cedo”, acrescentou.

Foto de Werner. Ele é um idoso de cabelos brancos e veste jaqueta, luvas e gorro. Ele segura algumas folhas.
Werner ajudou a organizar os protestos mensais contra o reator nuclear de Brokdorf desde 1986Foto: Tim Schauenberg/DW

"Mas, na maior parte do tempo, sinto-me aliviado que a operação da usina nuclear esteja finalmente chegando ao fim”, acrescentou. "Na época, não esperávamos que precisaríamos ficar aqui por tanto tempo."

Primeiro reator nuclear depois de Chernobyl

Em meio ao crescente movimento antinuclear na década de 1980, centenas de milhares de pessoas protestaram contra a construção da usina nuclear em Brokdorf.

Várias vezes, os manifestantes entraram em confronto com a polícia - especialmente depois do acidente nuclear de Chernobyl, em 1986, que provocou o aumento dos níveis de radiação no solo e nos alimentos em toda a Alemanha.

"Tive crianças pequenas que não podiam brincar na caixa de areia. Todos entramos em pânico", disse Werner.

Inaugurada no final de 1986, o reator nuclear de Brokdorf foi o primeiro do mundo a entrar em operação após o desastre de Chernobyl.

Naquela época, Werner e alguns aliados protestaram pacificamente e decidiram continuar com as manifestações, prometendo se encontrar uma vez por mês até que Brokdorf fosse fechada.

Para ele, "mostrar oposição" e protestar também ajudou o grupo a "combater os próprios medos".

Foto preto e branca mostra muitas pessoas se deslocando ao lado de ônibus estacionados.
Na década de 1980, milhares protestaram contra a construção de BrokdorfFoto: Klaus Rose/imago images

Aumento do risco de câncer e uma pista de gelo

Seus medos não eram injustificados. Em 2008, um estudo mostrou que crianças que crescem nas proximidades de uma usina nuclear alemã enfrentam um risco maior de desenvolver leucemia.

Mesmo assim, as usinas permaneceram abertas em meio a essas ameaças à saúde. Um dos motivos pode ser as décadas de altas receitas auferidas pelo município de Brokdorf por meio de um imposto comercial sobre a usina. Os políticos locais relutavam em desistir dessa verba.

O vilarejo, que tem apenas cerca de 1.000 habitantes, conseguiu financiar uma pista de patinação no gelo de 7 milhões de euros com o imposto da usina nuclear, e os preços dos ingressos para a piscina pública com toboágua de 100 metros foram mantidos extremamente baixos.

"É uma atividade comercial em nosso município e, como município, sempre apoiamos nossas empresas locais", disse a prefeita de Brokdorf, Elke Göttsche.

Ela preferia que a usina permanecesse em funcionamento por mais tempo, argumentando que isso teria facilitado a transição para a energia renovável. Agora, porém, a bonança de financiamento do reator nuclear acabou.

Construção de novas usinas

Enquanto a Alemanha está eliminando todas as suas usinas nucleares restantes até o final de 2022, outros países como França, Reino Unido, Estados Unidos, Índia, Rússia e China continuam dependendo desse tipo de energia.

Globalmente, cerca de 440 reatores nucleares ainda estão em operação, fornecendo cerca de 10% da energia mundial. Cerca de 50 reatores nucleares estavam em construção este ano, 18 deles na China.

Mais 300 usinas nucleares estão atualmente em fase de planejamento. Enquanto isso, o lobby promove a energia nuclear como uma alternativa supostamente limpa e, o mais importante, amiga do clima.

O presidente francês Emanuel Macron chegou a anunciar este ano que, para alcançar a neutralidade climática até 2050, a França reiniciaria, pela primeira vez em décadas, planos para construir novas usinas nucleares menores.

As emissões da energia nuclear são significativamente mais baixas do que as do carvão, petróleo e gás natural. Ainda assim, em comparação com a energia eólica e solar, os custos da tecnologia são muito mais altos e a construção de usinas nucleares leva muito mais tempo.

Motivos militares

O fato de os Estados ainda adotarem a energia nuclear também tem outra razão, segundo Andrew Stirling, professor de política científica e tecnológica da Universidade de Sussex.

"Globalmente falando, os países que são mais verdadeiramente dedicados ao uso civil da energia nuclear, ou têm também armas nucleares ou estão muito interessados ​​em obtê-las", disse ele.

De acordo com Stirling, o uso civil da energia nuclear é frequentemente necessário para a realização de programas de armas nucleares, um ponto admitido por França e Estados Unidos.

Sem os engenheiros e especialistas que trabalham no setor de energia nuclear comercial, seria impossível construir submarinos com propulsão nuclear, por exemplo, explicou Stirling.

"Os relatórios dos EUA são absolutamente claros. Mesmo que os custos da energia nuclear fossem o dobro, ainda faria sentido construir reatores, porque isso lhes permite manter suas atividades militares", disse ele.

Última vigília

Compartilhando café, bolo e sopa de abóbora, os ativistas de Brokdorf lembram os 35 anos de protestos. Eles olham fotos, incluindo imagens de álbuns particulares.

Embora Brokdorf pare de funcionar nesta sexta-feira, a usina continuará servindo por décadas como instalação para armazenamento temporário de lixo nuclear. Ainda não há um repositório final para rejeitos radioativos.

"Portanto, nosso compromisso ainda não acabou", disse um ativista. Pouco depois, alguém começa a tocar violão.

Os manifestantes deixam a fábrica de Brokdorf cantando. Pela primeira vez em 35 anos, eles também estão saindo vencedores.