"Após o 11 de Setembro, fomos expulsos da Disneylândia"
10 de setembro de 2016William e Michelle McNaughton folheiam álbuns antigos. Muitas fotos são do tempo em que o filho James, que carinhosamente chamam "Jimmy", estava vivo e ainda morava com eles. Numa das extremidades do antigo quarto dele, no subsolo, está uma vitrine cheia de medalhas e prêmios.
"Esta aqui é a mais valiosa", explica William, mostrando a Purple Heart, condecoração militar só concedida a soldados que sofreram ferimentos graves ou morreram em ação. Em 2015 Jimmy foi morto por um atirador no Iraque. O pai e a mãe nunca conseguiram superar essa perda.
Eles visitam regularmente o túmulo no cemitério militar Calverton National Cemetery, em Riverhead, a cerca de duas horas de carro de Nova York. "Quando tenho um dia ruim, também venho aqui no meio da noite", conta Michelle.
William e Michelle são policiais nova-iorquinos aposentados. Eles estavam em serviço em 11 de setembro de 2001, viram o horror e as vítimas daquele dia fatídico para os Estados Unido e, mais tarde, o trabalho de reconstrução. Americanos patriotas, conservadores, hospitaleiros, prestativos, eles têm orgulho por uma rua do bairro e um edifício na prisão de Guantánamo terem recebido o nome de seu filho. Para eles – assim como para a maioria dos americanos – Jimmy é um herói.
Ao folhear o álbum de fotos, o pai irrompe: "Para que o nosso filho morreu?" Nesse momento, ele não está colocando em questão a Guerra do Iraque: seu filho era um soldado, e soldados fazem os que os generais ordenam. O que o irrita, enfurece até, é a retirada das tropas americanas do Iraque.
"Para as pessoas do Iraque, a situação está pior do que antes", afirma. Não só foram muitos os americanos que deixaram suas vidas lá: ao se retirarem, os EUA deixaram para trás equipamentos militares no valor de milhões de dólares. "Para quê?", questiona William McNaughton mais uma vez.
Objetivo de Bin Laden: pressionar financeiramente os EUA
Na verdade quem deveria responder a essa pergunta é David Petraeus, ex-diretor da CIA e comandante das tropas dos EUA no Afeganistão e Iraque. A mídia americana o elogiou como um dos líderes militares mais talentosos das últimas décadas. Atualmente ele trabalha na holding KKR (Kohlberg, Kravis, Robert), em Nova York. A empresa negocia, entre outros, títulos de dívida soberana, movimentando bilhões de dólares.
General Petraeus entra na sala vestindo um terno azul escuro, sapatos pretos engraxados e com um copo de papel cheio de café na mão. Ele fala com a clareza de um livro, sorri com simpatia. Nada parece poder surpreendê-lo. A guerra contra o terrorismo internacional vai durar gerações, explica. Em suas complexas frases sobre a guerra, ele usa a palavra "sustentável". Ou seja dizer: guerras são trabalhosas, caras e exigem grande esforço dos americanos. Se os EUA pretendem conduzi-las por tempo longo, elas devem ser financiáveis.
O general sabe melhor do que ninguém que um dos objetivos do mentor do 11 de Setembro, Osama Bin Laden, era pressionar financeiramente os EUA. Envolver o país no maior número possível de guerras que, no fim das contas, Washington não tivesse como ganhar.
Petraeus está confiante de que o "Estado Islâmico" (EI) será derrotado num futuro bem próximo. Ele é pessimista, porém, quanto ao futuro político do Iraque. "Lá, as coisas são brutais. Bem-vindo à mais alta liga esportiva." No fim, ele não tem uma resposta direta à pergunta da família McNaughton: para que o filho deles morreu no Iraque.
O mesmo se aplica ao psicólogo Scott Morgan, da Universidade Drew Madison. Ele pesquisa há anos a "psicologia política" dos americanos. Os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 provocaram neles um trauma, eles viviam no medo de que o atentado se repetiria.
Morgan descreve o tempo entre a queda do Muro de Berlim e o 11 de Setembro como uma época feliz: os EUA eram, indiscutivelmente, a potência mundial número um. Na época, os americanos acreditavam ser "intocáveis". Com o ataque terrorista, porém, tudo mudou: "Depois do 11/09, fomos expulsos da Disneylândia, daquele paraíso encantado em que acreditávamos que ninguém poderia nos atacar. O apavorante mundo, os perigos nos alcançaram."
Insinuações de islamofobia de Trump
Estudos mostram que o ataque terrorista aumentou a desconfiança dos americanos em relação aos muçulmanos, diz Scott Morgan. Um em cada três acredita que o islã encoraja claramente mais o uso da violência do que outras religiões. Um em cada dois americanos diz que muçulmanos não se distanciam suficientemente de potenciais ataques terroristas.
Xenofobia e insinuações de islamofobia fazem parte também do programa padrão do candidato presidencial republicano, Donald Trump, em suas aparições durante a campanha eleitoral.
Aber Kavas, moradora do Brooklyn, é uma das que sofre com as constantes hostilidades. A jovem, de 24 anos, usa véu, mas dá preferência a cores vivas e alegres, principalmente quando precisa ir a um aeroporto. Ela não quer ser detida pela polícia ou causar medo em outros passageiros.
Ao mesmo tempo, a jovem está cansada de ter de se desculpar constantemente por sua fé muçulmana. Há quase dois anos, Kavas trabalha na Associação Árabe-Americana e ministra cursos sobre islamofobia em escolas e igrejas.
Mudança na política de imigração e ruptura familiar
O 11 de Setembro transformou a vida de Kavas. Seu pai, que estava nos EUA sem documentos válidos, teve que deixar o país.
"Cerca de quatro anos depois do 11/09, a política de imigração americana foi mudada. Meu pai ficou preso por três anos e meio. Minha família apresentou queixas para libertá-lo e, assim, ele foi enviado de volta para a Jordânia. Ele não pode mais voltar aos EUA", explica.
Desde então, ela mora com sua mãe e irmãs em Nova York. Elas visitam o pai uma vez por ano e, no resto do tempo, eles permanecem em contato por Skype e telefone. Mas manter de pé um relacionamento dessa maneira é difícil. Hoje é o 30º aniversário de casamento dos pais, e a única coisa que marido pode fazer é ligar para a esposa, diz ela, triste. "Tudo por causa do 11/09", lamenta, enxugando as lágrimas.