Reações opostas a morte de jovem palestino
8 de julho de 2014"Vergonha – foi o sentimento na noite de domingo, quando se revelou a identidade dos assassinos do jovem Mohammed Abu Khder", escreveu uma colunista do jornal israelense Yedioth Ahronothno dia seguinte à notícia. "É uma imensa vergonha que isso tenha acontecido entre nós, que estávamos tão seguros de que essas coisas não podiam acontecer conosco e que só os árabes poderiam ser tão cruéis."
A notícia da detenção de seis jovens israelenses chocou e horrorizou o país. A investigação ainda corre em sigilo, porém a imprensa noticiou que três dos detidos teriam confessado o assassinato brutal do palestino de 16 anos. Segundo as primeiras conclusões da autópsia, Abu Khder foi queimado vivo, informou o procurador geral palestino no fim de semana.
Políticos de todos os campos condenam esse assassinato. Agora, também em Israel o ato é percebido como retaliação pelo homicídio de três adolescentes judeus: três semanas atrás, Eyal Yifrach, Gilad Shaer e Naftali Frankel foram raptados nas proximidades de um assentamento, e em 30 de junho seus corpos foram encontrados na Cisjordânia. O governo de Israel responsabilizou o Hamas pelas mortes, o qual, por sua vez, não assumiu o ato.
Desde então, o clima no país é mais do que exaltado. A morte do jovem palestino e a prisão dos presumíveis autores colocaram em xeque a autoimagem de muitos israelenses. Agitação popular e racismo também existem do lado de Israel, alerta um colunista do diário israelense Ha'aretz: o conceito de superioridade moral, de que "apenas os palestinos glorificam o assassinato de crianças e distribuem doces em seguida a atentados suicidas", precisa agora ser revisto.
Onda de protestos
Ainda no fim de semana, dezenas de ativistas de direita protestaram diante da residência do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Forças de segurança israelenses observavam enquanto alguns manifestantes vestidos de combatentes do Hamas posavam para as câmeras de televisão, segurando fotos dos três israelenses mortos.
"É vergonhoso o que está acontecendo em Israel. Três jovens judeus foram raptados e mortos, e o governo não faz nada, tudo gira em torno desse palestino morto. Esses árabes não conhecem limites. Eles matam as nossas crianças e nós não fazemos nada. É absolutamente vergonhoso", diz Moshe, integrante de um grupo de ultradireita que recusa o convívio com os árabes.
Ron Kaufman, um outro manifestante, acrescenta, brandindo uma bandeira de Israel: "Nós estamos aqui porque o governo não age. Queremos a pena de morte para esses terroristas. Diariamente, 30 foguetes lançados da Faixa de Gaza explodem em Israel. Eu queria ver se o Canadá lançasse um foguete contra os Estados Unidos: aí não haveria mais o Canadá."
Os manifestantes exigem que a Faixa de Gaza seja duramente atacada, e o Hamas, destruído. Porém, algumas ruas adiante, vozes bem diferentes se faziam ouvir: na Praça Sion, no centro de Jerusalém, cerca de 40 pessoas protestavam contra a violência e a escalada recíproca.
"A violência aumentou muito em Jerusalém. É preciso que alguém esteja aqui no centro da cidade, para que a voz das pessoas normais, que são contra a violência e o ódio, também seja ouvida", apela Oron Elior, da organização Combatants for Peace. Esses "combatentes pela paz" se engajam pela convivência entre palestinos e israelenses. "Não se pode ficar passivo nesta situação. Se as pessoas permanecerem indiferentes, nunca nada vai mudar."
Tempos difíceis
No vácuo das negociações de paz suspensas, é ainda mais fácil a situação escalar, argumentavam muitos participantes do protesto. "Não me surpreendo com o excesso de violência. Ela parte do Estado, da ocupação. Não se pode esquecer quantos palestinos já foram mortos durante a operação militar na Cisjordânia", enfatiza o pacifista Amir Khalash.
A poucas centenas de metros da Praça Sion, Matan Israeli acompanha o noticiário. O jovem artista vive em Jerusalém Oriental e trabalha com colegas palestinos em performances artísticas conjuntas. Ele descreve esse trabalho como construção de pontes entre a zona leste de Jerusalém, de maioria árabe, e o oeste judaico da cidade.
Em tempos menos tensos, já não é um trabalho fácil. O artista desabafa: após os acontecimentos recentes, ele quase não reconhece mais o seu país. "Isso me dá medo. Foi assustador caminhar aqui pelas ruas da zona oeste, ver essas pessoas marchando, esse ódio e toda a escalada de violência."
Seus planos de, também neste verão, desenvolver no seu bairro um projeto cultural com palestinos e israelenses, estão por enquanto congelados, revela Israeli. "Fazer algo assim, agora, seria uma catástrofe. Nós fingiríamos que existe uma convivência. Mas a realidade, infelizmente, é outra. Agora um abismo muito profundo se abriu entre os dois lados, vão ser necessários anos para recuperar o pouco de confiança que existia."