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História

"Landshut representa força do Estado contra terroristas"

18 de outubro de 2017

Em entrevista, ex-comissária de bordo que vivenciou sequestro em outubro de 1977 fala sobre importância histórica da famosa aeronave alemã. Quatro décadas após o rapto, avião retornou do Brasil à Alemanha.

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Landshut
Landshut durante sequestro em Mogadíscio, capital da SomáliaFoto: picture-alliance/AP

Após ficar enferrujando num cemitério de aviões do aeroporto de Fortaleza durante nove anos, o histórico avião alemão conhecido como Landshut partiu recentemente para seu último voo. Uma equipe da Lufthansa – antiga proprietária do Boeing sequestrado por terroristas há 40 anos – desmontou a aeronave, que chegou à Alemanha no fim de setembro. Na cidade de Friedrichshafen, no sul do país, o avião vai se tornar peça de exposição do Museu Aeroespacial Dornier.

Leia mais: Famoso avião sequestrado será levado de Fortaleza para Alemanha

Durante cinco dias, entre 13 e 18 de outubro de 1977, 91 passageiros e tripulantes do Landshut ficaram nas mãos de terroristas palestinos, que trabalhavam em conjunto com a Fração do Exército Vermelho (RAF). A libertação dos reféns em Mogadíscio pela GSG 9, unidade especial da polícia federal alemã, tornou a aeronave lendária.

A ex-comissária de bordo Gabriele von Lutzau vivenciou de perto o sequestro do famoso avião. Em entrevista à DW, ela fala sobre o valor simbólico do Landshut e compara o terrorismo daquela época ao atual. "Nos anos 1970, somente alguns poucos eram atingidos, hoje o terrorismo faz muito mais vítimas. Ele se tornou incontrolável", afirma.

DW: Você teve alguma participação no retorno do Landshut para a Alemanha?

Gabriele von Lutzau: Não, a iniciativa foi do historiador e jornalista Martin Rupps. Durante cinco anos, ele trabalhou duro para que o Landshut voltasse ao país. Agora, no 40° aniversário do Outono Alemão [período que marcou o auge da luta entre o Estado alemão e o terrorismo de extrema esquerda e do qual o Landshut se tornou símbolo], o ministro do Exterior, Sigmar Gabriel, também se interessou. Desde então, as coisas começaram a acontecer.

Você apoiou a iniciativa?

Gabriele von Lutzau
Gabriele von Lutzau é hoje escultora e mãe de dois filhosFoto: picture-alliance/dpa/J. Kalaene

Total e completamente. Meu objetivo era que o Landshut voltasse e que a exposição em Friedrichshafen se tornasse um centro de documentação contra o terrorismo. Isso é importante para mim, especialmente nos dias de hoje.

Existe uma ligação entre o terrorismo de então e o de hoje?

Os tempos se tornaram mais difíceis. Nos anos 1970, somente alguns poucos eram atingidos, hoje o terrorismo faz muito mais vítimas. Ele se tornou incontrolável. O Landshut representa a não suscetibilidade do Estado à extorsão por terroristas e, para mim, essa mensagem é uma questão pessoal.

Como o Landshut deve ser apresentado no museu aeroespacial?

Para mim, deve se tratar de uma história que pode ser olhada e tocada, ou seja, tridimensional. Isso impressiona muito mais do que ler um ensaio ou observar imagens. Imagino que na parte dianteira da aeronave as cadeiras devam ser recolocadas, a cozinha e a cabine de pilotagem devam ser restauradas e, na parte traseira, deva ser montado um centro de documentação. O Museu Dornier me perguntou se eu gostaria de participar do conselho consultivo da exposição, e o farei com prazer.

O que o retorno do Landshut significa para você pessoalmente?

O meu foco está na libertação. No fato de termos conseguido, de termos sobrevivido, de não termos baixado a cabeça. E de não termos nos deixado levar, como parecia, como cordeiros para o matadouro. Procuro nutrir e cultivar os aspectos positivos e excluir os negativos. Além disso, levo uma vida maravilhosa. Sou escultora e mãe de dois filhos incríveis. Tenho uma neta linda. Minha vida continua e não tenho a mínima vontade de ser controlada por terroristas.

A libertação também poderia ter fracassado. Ninguém sabia melhor disso que seu marido.

Meu marido era copiloto da aeronave que seguiu o "Landshut". Hoje não seria mais permitido que ele voasse, pois a pressão psicológica é grande demais. Meu esposo podia ver que eu estava no avião, o que foi algo bastante difícil para ele. Se a aeronave tivesse explodido, ele teria visto a bola de fogo.

Foto da antiga aeronave da Lufthansa no cemitério de aviões em Fortaleza, em fevereiro de 2017
Foto da antiga aeronave da Lufthansa no cemitério de aviões em Fortaleza, em fevereiro deste anoFoto: Imago/Agencia EFE

E você realmente encerrou este capítulo?

O Outono Alemão é uma área de pesquisa encerrada. Pessoas de todo o mundo escreveram livros sobre nós. Fazemos parte da história. Começou em 1972 com o atentado aos Jogos Olímpicos de Munique; em 1976, aconteceu a libertação do avião da Air France sequestrado em Entebbe e, finalmente, o Landshut em Mogadíscio. Na ocasião, tratava-se ainda de negociações. Com o sequestro, a RAF queria forçar a libertação de seus líderes que estavam presos na prisão de Stammheim, nos arredores de Stuttgart. Mesmo assim, o Estado não se deixou chantagear.

O então chanceler federal, Helmut Schmidt, afirmou na ocasião que não haveria nenhuma troca. E funcionou. É por isso que hoje se pode dizer que aquele foi o ponto de virada, depois cessaram os sequestros. Hoje, no entanto, estamos lidando com um terrorismo completamente diferente. É uma espécie de culto à morte.

As memórias do sequestro podem ser vistas no seu trabalho artístico?

Todo artista trabalha a partir de uma inquietude interna, e esse é certamente o meu caso. Eu crio vigilantes e criaturas aladas. Há uma razão pela qual o desejo por liberdade e mudança sempre se reflete nas minhas obras.

Qual a sua opinião em relação ao debate sobre indenizações?

Naquela época, foi discutido com Helmut Schmidt se o passageiros deveriam receber uma indenização de 3 mil marcos, como consolo, por assim dizer. Em seguida, o chanceler federal falou que eles não deveriam se comportar daquela forma, pois durante a guerra as pessoas teriam passado por situações bem diversas. Ponto, fim da discussão. Eram os anos 1970. Na época, cada um era responsável por si. Eram tempos difíceis, não havia acompanhamento psicológico. Quem não tivesse uma família estava perdido, e muitas pessoas não conseguiram suportar as dificuldades.

Também existem reparações que chegam tarde. As vítimas que ainda vivem ainda devem ser indenizadas?

Não é um pouco tolo receber uma indenização depois de 40 anos? Eu não preciso. Eu não faço parte desse grupo de requerentes. Infelizmente, a maioria dos passageiros do Landshut já morreu. Era um avião que levava passageiros de férias para a ilha de Maiorca, e havia muitas pessoas com mais de 50 anos de idade. Para mim, o assunto está encerrado.

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