Babel de 20 línguas
2 de janeiro de 2004Eles emprestam suas vozes a políticos do primeiro escalão, chefes de governo ou a simples funcionários da União Européia. São geralmente qualificados para dar conta do recado em discussões que vão da política externa à importação e exportação de carne. Enclausurados em cabines – que os alemães chamam de "aquários" – os intérpretes são uma das pedras fundamentais para o bom funcionamento da UE.
Ian Andersen, que coordena o Departamento de Intérpretes de Conferência do bloco de países, explica como o sistema funciona: "Uma equipe de intérpretes é, na verdade, uma rede de várias línguas.
No momento, temos 11 delas na UE, o que faz com que tenhamos 33 pessoas, três para cada idioma. O ideal é que cada uma delas fale um número maior de línguas, para poder fazer a tradução simultânea diretamente do idioma de quem toma a palavra em uma conferência".
"Língua ponte" -
Ou seja, na melhor das hipóteses, o que é falado durante uma reunião da UE deveria ser traduzido da língua do orador para cada um dos outros idiomas do bloco, o que nem sempre é possível. Muitas vezes, é necessário apelar para uma "língua ponte".Um exemplo, conta Andersen, "é que não temos nenhum tradutor dinamarquês, que fale grego. Logo, temos que traduzir primeiro do grego para alguma outra língua - espanhol, francês, inglês ou alemão - e daí para o dinamarquês. Trata-se então de um processo de dois passos".
Tradução da tradução - Isso proporciona a um intérprete, por exemplo, optar por uma "tradução da tradução", ou seja, apelar para um terceiro idioma. "Se o intérprete alemão não domina o idioma finlandês, por exemplo, ele pode pegar o que vem da cabine inglesa e simplesmente traduzir.
Na melhor das hipóteses, nosso ouvinte nem percebe que não estamos traduzindo do finlandês", conta Jasminka Dervoux, uma vienense que trabalha há 26 anos para a UE, sendo responsável por traduções simultâneas de cinco diferentes línguas para o alemão.
Idiomas novos -
Apesar de parecer complicado, o sistema conhecido como relay interpreting é simples, segundo os especialistas. Em maio de 2004, todo o aparato da UE será mais uma vez colocado à prova, quando às 11 línguas do bloco forem integradas mais nove, com a entrada de oito países do Leste Europeu, além de Malta e a parte grega do Chipre, na organização.Além da babel já existente, a partir de maio deste ano o político da Ilha de Malta terá que entender o burocrata da Letônia, mesmo que isso venha a ser feito via inglês ou francês.
Reformas - Para que a ampliação do leque de tradutores e intérpretes ocorra sem maiores problemas, já estão sendo reformadas várias salas de reuniões da UE, visando a acomodação de mais cabines para tradução simultânea. Ao mesmo tempo, procura-se desesperadamente por jovens talentos, pois principalmente nos países bálticos e em Malta há enormes dificuldades de encontrar mão-de-obra qualificada.
Diversidade de temas -
A competência exigida dos intérpretes não se reduz ao número de idiomas que estes dominam, mas também à capacidade de compreensão de vários assuntos. "Os campos de trabalho dentro da UE são vastos: há intérpretes que têm pesca na segunda-feira, sistema bancário na terça, política de segurança na quarta, caminhões na quinta e métodos modernos de abate de porcos na sexta", conta Andersen.Próximos e distantes - Muitas vezes os intérpretes são os únicos "leigos" na sala, mas nem por isso podem abandonar a exatidão no trabalho que executam. E tudo isso nos bastidores, atrás do vidro. Mesmo à distância, alguns deles sentem-se de alguma forma próximos de políticos ou chefes de governo.
Jasminka Dervoux fala que às vezes tem a impressão de que alguns deles são tão conhecidos quanto seus vizinhos: "Se eu me encontrasse com Gerhard Schröder, por exemplo, acho que não teria vergonha de chegar diretamente e dizer que ele está usando uma gravata bonita, pois tenho a sensação de que o conheço muito bem, mesmo que isso não seja real".