João Calvino
7 de abril de 2009Com mais de 360 documentos históricos, obras de arte e objetos litúrgicos, a atual mostra de Berlim é a maior exposição na Europa durante o Ano Calvino, que marca os 500 anos do reformador nascido em 10 de julho de 1509, na cidade francesa de Noyon.
A exposição tem como foco a pessoa de Calvino e sua influência na Europa. A mostra também trata de temas como expulsão, migração e minorias – assuntos problemáticos para o continente durante diferentes épocas. O próprio Calvino foi forçado a fugir da França para a Suíça em 1535, quando a tensão religiosa levou a levantes violentos contra protestantes.
Isso aconteceu numa época em que a Europa estava dominada por monarcas e a Igreja Católica tinha grande influência tanto na política quanto na sociedade civil. E fazia apenas duas décadas que o alemão Martinho Lutero havia pregado suas 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, defendendo a salvação através da fé e acendendo, inadvertidamente, a centelha da Reforma Protestante.
Foi nesse contexto que Calvino desenvolveu e propagou o movimento protestante que se iniciava. Mais tarde, sua doutrina teológica ficou conhecida como calvinismo.
O nascimento do Estado sem corrupção
Em entrevista à Deutsche Welle, o teólogo católico e professor aposentado Arnold Angenendt declara que "o calvinismo influenciou decididamente a forma moderna de vida". Segundo o teólogo, Calvino é interpretado como aquele que disse que qualquer erro é sinal de que se foi abandonado por Deus.
O calvinismo é conhecido por propagar o trabalho duro, a confiabilidade e o perfeccionismo. Angenendt explica que "a ética calvinista criou o funcionário público responsável e profissional". Para o historiador, isso significou "o nascimento do Estado europeu".
Um funcionário público que se comporta conforme a ética calvinista não está passível de envolvimento com a corrupção. Os países ocidentais mais influenciados por Calvino têm governos menos corruptos que seus vizinhos do Leste, afirma Angenendt.
Responsabilidades individuais
As igrejas calvinistas são caracterizadas não somente pela forte consciência ética, mas também pela organização não-hierárquica, diz em entrevista à Deutsche Welle Achim Detmers, da Igreja Luterana na Alemanha. Esta igualdade "democrática", segundo ele, não traz somente liberdade, mas também responsabilidade.
O calvinismo não prescreve um credo universal para cada situação. Em vez disso, novas situações históricas – como o surgimento do nazismo na Alemanha dos anos de 1930 ou tempos de desigualdade econômica – requerem que fiéis leiam novamente a Bíblia e façam interpretações relevantes, diz Detmers.
A redução da influência política eclesiástica e a ênfase no papel do indivíduo são todos ensinamentos do calvinismo, que têm mais em comum com a moderna democracia europeia do que com as últimas monarquias medievais.
"Calvino defendia um democracia aristocrática. Ele defendia uma separação administrativa da Igreja e do Estado, embora quisesse assegurar que a sociedade estava embasada em princípios cristãos como Os Dez Mandamentos", explica o teólogo alemão.
Detmers comenta que particularmente em comparação com outras doutrinas, que são organizadas mais hierarquicamente e dão menor valor à participação dos fiéis, o calvinismo oferece às sociedades "modernas" um grande potencial de inovação e reflexão.
Uma solução calvinista para a crise financeira?
O clérigo luterano adverte, no entanto, que não deve ser estabelecida uma ligação muito forte entre Calvino e o desenvolvimento da democracia moderna e do capitalismo, chamando a atenção para o papel exercido por uma série de outros fatores sociológicos e históricos neste contexto.
Se os ideais calvinistas – baseados mais no medo do que na misericórdia – tiveram uma maior influência na sociedade atual, já é uma outra questão.
Na abertura da exposição em Berlim nesta semana, o premiê holandês, Jan Peter Balkenende, salientou que a forte ética de trabalho, que é parte importante da teologia calvinista,"se transformou num sistema moral".
À luz da atual crise econômica, seria "bom se os mercados financeiros fossem mais fortemente governados por estes princípios", afirmou Balkenende.
Bastiões da teologia reformista
Mais de 25 milhões de pessoas fazem parte da Igreja Luterana na Alemanha, de acordo com informações da própria Igreja. Desses, dois milhões pertencem às igrejas protestantes reformadas. Outros bastiões da teologia reformista na Europa são a Suíça, a Holanda, a Hungria, a Escócia e a França.
Na Alemanha, os membros das igrejas reconhecidas pelo Estado pagam uma dízimo mensal às Igrejas Católica e Protestante. No país, a Igreja Católica conta oficialmente com 25 milhões de fiéis.
A exposição Calvinismo fica aberta até 19 de julho próximo no Museu Histórico Alemão, em Berlim.
Autora: Kate Bowen
Revisão: Soraia Vilela