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Berthold Beitz, mais que um ícone da indústria alemã

Erich Reimann (md)1 de agosto de 2013

Empresário dirigiu gigante do aço Krupp por décadas e era respeitado não só por reerguer a companhia no período pós-guerra, mas também por ter livrado centenas de judeus do envio para campos de concentração.

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Foto: picture-alliance/dpa

Berthold Beitz viveu de perto todos os altos e baixos da história recente alemã: desde o terror nazista, passando pelo milagre econômico até a globalização e a recente crise do euro. Mesmo em seus últimos meses de vida, continuou desempenhando um papel de destaque na reestruturação do grupo ThyssenKrupp.

Beitz, que completaria cem anos em setembro, era tido como um dos maiores empresário do período pós-guerra, pelos seus sucessos na reconstrução do império Krupp. Mas suas contribuições foram muito além da área de negócios. O ex-chanceler Helmut Schmidt chegou a chamá-lo de "um diplomata sem mandato", por seus serviços à Alemanha como um pioneiro nos processos de reaproximação com Polônia e Rússia.

O memorial judaico Yad Vashem honrou o alemão com o título de Justo entre as Nações, por ter arriscado sua vida para livrar da morte centenas de judeus na Polônia durante a Segunda Guerra.

Agindo por ímpeto

Beitz viveu o primeiro grande desafio de sua vida já aos 28 anos, quando ocupava o cargo de diretor comercial da petrolífera Karpaten. Na época, ele era responsável pelos campos de petróleo na Polônia ocupada e viu de perto as atrocidades cometidas pela ocupação alemã.

Mas ele não assistiu aos horrores da guerra de braços cruzados. Salvou centenas de judeus da deportação para campos de concentração, convocando-os para trabalhar, afirmando que eles eram essenciais para a produção de petróleo. Chegou mesmo a esconder algumas crianças judias em sua casa. Por sorte, conseguiu escapar, ele mesmo, de ser enviado para um campo de concentração.

"O que eu vivi naquele tempo na Polônia, durante a guerra, me marcou muito. As atrocidades dos nazistas contra homens, mulheres e crianças, o medo e o terror nos olhos dos perseguidos, isso tudo fica gravado mais fundo do que você pensa", lembrou Beitz. "Agora, na velhice, eu volto a sonhar com aquilo. E o fato de que eu não pude salvar mais pessoas naqueles tempos de perseguição me tortura até hoje."

Berthold Beitz gestorben
Beitz, em 1972: uma das personalidades mais importantes da história industrial da AlemanhaFoto: picture-alliance/Sven Simon

Beitz dizia que agiu de acordo com seu ímpeto. "Se eu tivesse pensado muito, talvez não tivesse ousado fazer o que fiz." A coragem e a criatividade moldavam o seu caráter.

E isso ficou patente quando ele aceitou, em 1953, a oferta de Alfried Krupp von Bohlen und Halbach para comandar o saneamento do grupo Krupp, então completamente desmantelado após a guerra. A metalúrgica, que carregava a fama de ter sido uma produtora de armas da Alemanha nazista, reergueu-se das cinzas.

Beitz não hesitou em trilhar caminhos heterodoxos para colocar a companhia de volta aos trilhos. Durante a Guerra Fria, manteve intenso contato com Polônia, URSS, Bulgária e Hungria, e abriu o acesso para mercados até então fechados não só para a Krupp, mas para toda a indústria alemã.

Processo de reorganização

Beitz também abriu o caminho para a criação da Fundação Krupp, que até hoje é o maior acionista da ThyssenKrupp. Após a morte de Alfried Krupp, em 1967, Beitz se tornou o presidente da entidade. Durante décadas, liderou o tradicional grupo sediado em Essen, sempre com respeito ao passado, mas disposto a uma "destruição criativa", caso lhe parecesse necessário.

Assim, ele acompanhou, à distância, o processo de reorganização da indústria siderúrgica alemã como um patriarca: a aquisição da Hoesch pela Krupp e a fusão das duas gigantes alemãs do aço ainda remanescentes, criando o novo grupo ThyssenKrupp.

Hauptversammlung von Thyssen Krupp AG
Ativo até o fim: Beitz em reunião de acionistas da ThyssenKrupp, em janeiro de 2013Foto: picture-alliance/dpa

Seus últimos anos, entretanto, foram ofuscados pelo fiasco bilionário da maior empresa de aço da Alemanha em empreendimentos no Brasil e nos EUA, assim como pelos escândalos de corrupção na empresa. Os incidentes abalaram bastante o empresário.

"Durante anos, ouvia que tudo ia melhorar logo", desabafou Beitz recentemente. "Mas tudo foi ficando cada vez pior."

Há poucos meses, o patriarca perdeu a paciência e, depois de décadas de colaboração, retirou sua confiança no presidente do conselho de supervisão da ThyssenKrupp, Gerhard Cromme. "Eu tinha que agir", disse ele, após a renúncia de Cromme, em uma de suas raras entrevistas. Para ele, a aposentadoria ainda estava fora de questão. "Vou continuar enquanto puder e ainda tiver a cabeça boa."

Beitz morreu na última quarta-feira (31/07), aos 99 anos. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, lamentou sua morte e disse que a indústria do país perdeu uma de suas personalidades mais respeitadas e bem-sucedidas.