Bioenergia não compensa na Alemanha, dizem cientistas
3 de agosto de 2012"O rendimento sugerido pelos políticos para a bioenergia – supostamente capaz de cobrir 23%, às vezes até 30% da nossa necessidade energética – é completamente ilusório a partir da perspectiva atual." É o que afirma Berharnd Schink, professor da Universidade de Constança, e um dos coordenadores do estudo Bioenergia: possibilidades e limites, publicado em julho pela Academia Nacional de Ciências Leopoldina, na Alemanha.
Mais de 20 cientistas trabalharam durante quase dois anos na pesquisa. E os químicos, biólogos, ecologistas e climatologistas envolvidos vêem mais limites do que possibilidades para o uso de energias renováveis na Alemanha.
Enquanto isso, como parte da chamada "revolução energética", o governo alemão aposta no biogás, biodiesel e etanol. Carros alemães utilizam hoje uma gasolina à qual são adicionados de 5 a 10% de etanol, por exemplo.
Difícil equilíbrio
Há dois argumentos básicos a favor do uso de bioenergia. Em primeiro lugar, as reservas de combustíveis fosses, como petróleo e carvão, são limitadas. E a necessidade de importá-los cria dependência política e econômica. Além disso, técnicas de extração cada vez mais sofisticadas – como a utilizada para areia betuminosa – colocam o meio ambiente em risco.
Mas o principal problema dos combustíveis fósseis é que eles liberam gás carbônico, associado ao efeito estufa e ao aquecimento global. Em contraste, com o uso de bioenergia, seria liberada na atmosfera exatamente a mesma quantidade de gás carbônico que fora antes absorvida pelas plantas – aparentemente, um equilíbrio.
Mas todos os aspectos da produção de biomassa relevantes para o clima devem ser levados em conta. E é justamente essa a abordagem do estudo da Academia Leopoldina. O balanço geral deve abarcar o uso de fertilizantes, que provoca a liberação de gases do efeito estufa à base de nitrogênio. Deve incluir também as emissões de tratores durante o plantio, aragem e colheita e as emissões durante a produção e o transporte desses tratores até as plantações.
Outra questão complexa é quanta energia realmente se "ganha" a partir de um litro de bioetanol, por exemplo. É preciso considerar todo o consumo de energia durante a cadeia de produção.
Falta de terreno
O cenário na Alemanha é bem diferente do Brasil, por exemplo, país com uma área enorme e produtor de cana de açúcar. "Na Alemanha, nossa superfície é limitada e hoje importamos um terço da nossa produção total de biomassa, principalmente como ração animal", dizem os cientistas. Nesse contexto, é "difícil defender que cultivemos plantas energéticas em nosso próprio solo enquanto importamos alimentos de outros países".
Para o pesquisador Schink, a agricultura que a Alemanha movimenta fora do país precisaria ser incluída no balanço. Os autores do estudo consideram dignas de incentivos apenas as formas de bioenergia que "não levem à escassez de alimentos nem elevem seus preços por conta da disputa por terra e água".
Para os cientistas da Academia Leopoldina, existe apenas um cenário razoável para a utilização de bioenergia na Alemanha: a reciclagem de resíduos agrícolas e domiciliares – ou seja, produção de biogás a partir de matérias-primas que acabariam num aterro.
Ao invés de adicionar uma parcela de biocombustível à gasolina, a Alemanha deveria explorar outras fontes renováveis, sugerem os pesquisadores. Energia solar e eólica são muito mais eficientes e, no balanço geral, mais sustentáveis, afirmam.
Relatório equivocado?
Elmar Baumann, diretor da Associação da Indústria Alemã de Biocombustíveis (VDB, na sigla em alemão), classifica o estudo como equivocado. "São dados que já foram publicados de maneira semelhante em outros lugares e questões que já foram antes levantadas. Então, pergunta-se: para que serve o estudo?", indaga.
Baumann ressalta que produzir biocombustível a partir da canola alemã, por exemplo, faz sentido. E isso já é regulamentado e certificado no país. De acordo com a Portaria de Sustentabilidade, os produtores precisam provar uma redução da emissão de gases de efeito estufa de 35% com relação aos combustíveis fósseis.
Segundo Baumann, o relatório da Leopoldina desconsidera também o fato de que não há alternativas para o biodiesel e o bioetanol no setor de transportes. "Do ponto de vista objetivo, isso está totalmente correto: não oferecemos nenhuma alternativa nesse sentido", reconhece Schink.
Entretanto, o cientista considera possível poupar combustíveis fósseis em outros âmbitos, e, assim, reservar o petróleo e seus subprodutos gasolina e diesel para motores de combustão interna. Isso até que veículos elétricos tomarem conta das ruas.
O estudo da Academia Leopoldina cita, porém, um exemplo concreto de como se poderia produzir bioetanol de maneira econômica e ecológica na Alemanha. Utilizando um novo procedimento, desenvolvido por pesquisadores alemães da Universidade de Hohenheim, é possível produzir biocombustível e biogás simultaneamente – o que, segundo Schink, melhora o balanço energético.
Contudo, até agora tal modelo combinado funciona apenas em pequena escala. "Uma expansão para o uso industrial certamente exigiria melhoras no processo", afirma o cientista.
Autor: Michael Gessat (lpf)
Revisão: Augusto Valente