Bons ventos do Bósforo
27 de agosto de 2004Fortes ventos orientais sopram em Berlim: uma delegação de mais de 270 artistas vinda da Turquia desembarca na capital alemã para apresentar uma nova imagem de seu país: uma nação em vias de liberalização social, com um crescimento econômico sustentável e uma enorme população jovem, disposta a transformar o caldeirão cultural europeu em uma mistura explosiva.
A cultura turca espelha sua geografia – parte na Europa, parte na Ásia: e é exatamente esse intercâmbio entre a herança cultural otomana e a crescente aproximação com a Europa que a torna tão irresistível aos alemães.
São mais de 40 eventos – entre concertos, shows, filmes, teatro, dança, literatura e discussões – em pouco mais de uma semana, de 27 de agosto a 4 de setembro.
Um time de peso
Três dos maiores astros da música pop turca – famosos também na Alemanha – encabeçam o time de artistas do Bósforo. O show de abertura fica por conta da popstar Sertab Erener, que causou um estouro da música pop turca na Alemanha ao vencer o festival Eurovisão em 2003.
Ela e o cantor Tarkan são os dois maiores sucessos do momento no quesito pop turco. Tarkan nasceu na Alemanha, mudou-se aos 15 anos para a Turquia e estudou nos Estados Unidos. Em 1999, alcançou o sucesso internacional, inclusive no Brasil, com a canção Simarik, que voltou ao topo da parada três anos depois com uma versão "ocidental" da australiana Holly Valance.
Mas ambos devem seu sucesso à madrinha Sezen Aksu, na ativa desde aos anos 70 e também presente no festival. Foi ela quem compôs o hit de Tarkan, Simarik. E foi em seu coro que Sertab Erener começou a carreira.
A música clássica turca também enviou a Berlim alguns de seus expoentes. Em comum com a tradição clássica ocidental, trazida à Turquia por sultões otomanos, a música clássica turca possui o piano. Além das irmãs Ferhan e Ferzan Önder, novos talentos no cenário clássico turco, as renomadas Güher e Süher Pekinel se apresentarão junto com a Orquestra de Câmara de Bremen, sob batuta de Paavo Järvis.
Para fãs da world music, haverá um encontro um tanto aguardado: o do percussionista de jazz Burhan Öçal com o mestre da guitarra flamenca Paco de Lucia.
Até onde vai a Europa?
Também não faltam cineastas e artistas multimídias. Kutlug Ataman, recém-nomeado ao prêmio Turner, apresentará sua nova instalação de vídeo às margens de um canal no bairro de Kreuzberg. O cinema Arsenal apresentará ainda um panorama da sétima arte made in Turkey. Haverá também um colóquio literário com quatro autores turcos.
Nas artes plásticas, diversas exposições: como berlin.istanbul.vice versa, da galeria Bethanien, que contrasta artistas de Istambul e de Berlim.
Mas um dos maiores e mais esperados eventos do festival não vem (só) da Turquia: trata-se do novo espetáculo da coreógrafa alemã Pina Bausch, Nefés (fôlego, em turco), produzido em conjunto com a Fundação Istambul para a Cultura e as Artes.
Além disso, a questão da identidade européia, tão presente quanto ausente na sociedade turca, não poderia faltar no programa – a Turquia, afinal de contas, vem se esforçando para fazer parte da União Européia. Para responder à atual polêmica "Até onde vai a Europa?", haverá um simpósio turco-alemão. E o espetáculo Home Sweet Home, do diretor Emre Koyuncuoglu, vai em busca dessa identidade.
Noticiário em turco
Com a maior população turca fora da Turquia (cerca de 170 mil), Berlim é a cidade ideal para o projeto piloto que, se der certo, será levado a outras metrópoles européias. Para mostrar um pouco do dia-a-dia dos turcos da terceira geração, foram convidados os rappers Sultan Tunç e Aziza A.
Aproveitando a deixa, a Rede de Televisão de Berlim-Brandemburgo (RBB), após exibir filmes turcos no horário nobre do sábado (28), prepara uma estréia um tanto simbólica: o noticiário noturno será apresentado em turco. Quem assume a ancoragem é a jornalista Öney Bilkay, do canal turco de televisão TRT. Claro, com legendas em alemão.