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Brasil aposta nas relações comerciais com o mundo árabe

2 de novembro de 2012

Não só o novo prefeito de São Paulo é um descendente de libaneses: os árabes têm uma forte presença na sociedade brasileira. Também o comércio entre o Brasil e os países do mundo árabe vai bem: desde 2002, cresceu 400%.

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Foto: Antonio Cruz/ABr

Visível nos traços físicos de pessoas, na culinária, nos nome de políticos, personalidades ou empresas, a imigração árabe pode ser facilmente encontrada no Brasil. Basta um passeio por alguns bairros de São Paulo – cidade que concentra uma grande comunidade de sírios e libaneses e cujo novo prefeito, Fernando Haddad, tem origens no Líbano – para esbarrar na herança cultural dos imigrantes árabes.

Eles começaram a chegar ao Brasil no fim do século 19. Estima-se que o país tenha a maior comunidade fora dos países do mundo árabe, formada principalmente por libaneses e sírios. Grande parte dos mais de 12 milhões de brasileiros com ascendência árabe está em São Paulo e na região da chamada tríplice fronteira.

Das várias levas de imigrantes, a primeira foi constituída majoritariamente por cristãos, que saíram de suas terras – atualmente a Síria, o Líbano e a Palestina – por causa das perseguições religiosas do Império Otomano, que era formado por islâmicos. Já os árabes muçulmanos chegaram ao Brasil em grande número durante o século 20.

O Brasil era muito atraente por causa das oportunidades que oferecia. Grande parte dos imigrantes tinha conhecimentos de agricultura, mas, como o panorama agrário não era satisfatório naquele período no Brasil, dedicou-se essencialmente ao comércio e à indústria.

Os primeiros imigrantes eram vendedores de porta em porta e comercializavam pequenos itens como bijuteria, vegetais e frutas e, mais tarde, roupas. "Nos seus vários períodos, a imigração árabe teve uma influência direta na sociedade, na economia e na cultura brasileira", afirma o professor Salem Nasser, da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

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O novo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, é descendente de libanesesFoto: AP

Brasil se volta aos países árabes

Mas foi somente a partir da década de 1970, por razões econômicas e devido à sua dependência do petróleo, que o Brasil começou a dar mais atenção para os países árabes.

Ao mesmo tempo em que o Iraque exportava petróleo para o Brasil, as empresas brasileiras – principalmente do setor de construção civil – investiam naquele país.

Outro setor que fez bons negócios com o mundo árabe foi o automobilístico. Entre 1983 e 1988, época em que a Volkswagen do Brasil buscava novos mercados, a empresa chegou a exportar para o Iraque cerca de 170 mil unidades do modelo Passat.

O caráter da transação era bem inusitado: os carros eram pagos em petróleo, repassado à Petrobras. Quando esta passou a ter um excedente do óleo, os veículos – carinhosamente apelidados de "Passat Iraque" – sobraram e a solução foi vendê-los no mercado brasileiro, a partir de 1986.

Relação sul-sul

O Brasil fez claras mudanças na sua política externa e se tornou um player ambicioso na área internacional durante o primeiro governo Lula, como lembra Nasser. "Houve uma opção por privilegiar a chamada relação sul-sul, fazendo uma aproximação especialmente com os países árabes e africanos e, naturalmente, com os países vizinhos na América Latina", diz Nasser.

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Passat era exportado do Brasil para o Iraque e pago com petróleoFoto: helena.40proof/by/sa

Os efeitos dessa política se fazem sentir. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), entre 2002 e 2011 houve um crescimento de 400% no intercâmbio comercial entre o Brasil e os 22 países que fazem parte da Liga Árabe – de 4,9 bilhões de dólares para 25,1 bilhões de dólares.

Apenas entre 2010 e 2011 o aumento foi de 20,3%. Essa taxa elevada não deve se repetir em 2012, ficando entre 5% e 8%, principalmente por causa da instabilidade política na região – a chamada Primavera Árabe – e a crise econômica mundial.

De olho no crescimento das relações comerciais, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, visitou a Palestina em outubro deste ano. Além de reforçar as intenções do Brasil de servir como mediador nas negociações para a paz na região, a visita teve o objetivo de impulsionar o comércio com os árabes. Foi a primeira viagem de um chanceler brasileiro ao território palestino desde que o Brasil reconheceu o Estado da Palestina, em dezembro de 2010.

Condições favoráveis ao comércio

O bloco árabe é uma das economias mais importantes do mundo: são 22 países que têm uma população total de 370 milhões de pessoas. De acordo com Michel Alaby, diretor da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB), os países árabes importam anualmente cerca de 550 bilhões de dólares em produtos e o Brasil representa somente 2,5% desse valor.

"É muito pouco em relação ao bolo total de exportações do Brasil. Elas podem aumentar muito mais, pois são muitos países árabes. É um começo, o Brasil está explorando esses laços históricos que tem com o mundo árabe", comenta o professor de relações internacionais Argemiro Procópio, da Universidade de Brasília (UnB).

O comércio ainda é concentrado em poucos produtos. "O desafio é diversificar a pauta de exportação para esses países que crescem num ritmo expressivo, que têm uma população que consome cada vez mais e renda cada vez mais elevada", diz a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Tatiana Prazeres.

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Brasil passou a priorizar as relações sul-sul no governo Lula (na foto, o ex-presidente e o palestino Mahmoud Abbas)Foto: AP

Em 2011, o Brasil exportou mercadorias no valor de 15,1 bilhões de dólares para os países árabes, principalmente açúcar, carnes, milho e trigo. "Há nichos de mercado ocupado pelos brasileiros e há um potencial de crescimento, já que os árabes têm uma simpatia muito grande pelo Brasil", frisa Alaby.

Desse valor, cerca de 70% foi direcionado para somente cinco países – Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes, Argélia e Marrocos. "Há muito mercado ainda para ser explorado e o Brasil precisa trabalhar mais com marketing", diz Alaby.

A secretária de Comércio Exterior do MDIC concorda com Alaby e avalia que existem muitas condições favoráveis para aumentar o fluxo comercial com a região. "Nesses países as barreiras tarifárias são relativamente baixas e as barreiras sanitárias foram superadas, sendo que há boas oportunidades, especialmente para o setor de carnes."

O grande desafio, porém, é assegurar a regularidade das exportações. "O Brasil precisa ter uma presença forte e constante na região para conquistar ainda mais esses mercados e o governo brasileiro está consciente disso e contribuindo nesse sentido", avalia Tatiana Prazeres.

Mas ainda falta a cultura exportadora para o empresariado brasileiro. "E para isso, precisamos desenvolver programas de marketing internacional e adaptar as empresas brasileiras ao processo de internacionalização", comenta Alaby.

Copa do Mundo de 2022

As empresas brasileiras – principalmente do setor da construção civil – que acumularem experiência na Copa do Mundo no Brasil de 2014 devem ter um grande mercado para oferecer seus serviços para a Copa de 2022, a ser realizada no Catar.

Tatiana Prazeres, do MDIC, diz que várias empresas de construção já identificaram no Catar boas oportunidades de investimento. "Claramente é uma nova fronteira para as exportações brasileiras no setor de construção civil."

Grandes construtoras brasileiras, como OAS, Andrade Gutierrez, Odebrecht e Queiroz Galvão já estão no Catar. "Não há dúvidas que as empresas que estão construindo estádios no Brasil terão grandes chances de fazer bons negócios na Copa de 2022", conclui Alaby.

Autor: Fernando Caulyt
Revisão: Alexandre Schossler