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Rede insegura

10 de julho de 2010

Ao lado de chineses e russos, brasileiros são campeões de cibercriminalidade. Desenvolvimento econômico e mentalidade são fatores centrais, diz Eugene Kaspersky em Moscou. E se revela "paranóico" em termos de segurança.

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Kaspersky é apelidado 'Papa dos vírus'Foto: dpa - Bildfunk

Segundo Eugene Kaspersky, um dos principais especialistas em antivírus do mundo, atualmente a internet é um espaço criminalizado. Ataques de hackers aterrorizam praticamente todos os usuários da rede: de particulares a grandes empresas e instituições estatais. O especialista em segurança calcula em 100 bilhões de euros os danos causados por cibercriminosos a cada ano.

O russo de 44 anos, criador do Kaspersky Lab, sabe tudo sobre cavalos-de-troia, vermes ou hijackers – ou seja, programas que permitem acessar computadores alheios, destruir ou restringir funções e dados, roubar senhas. A comunidade de seus seguidores o denomina, cheia de admiração, "Papa dos Vírus".

Interesse precoce

Na central de seu instituto de pesquisa antivírus em Moscou, o homem rechonchudo, de rabo-de-cavalo bem puxado para trás, se confessa fumante inveterado e fã da Oktoberfest de Munique. Ele conta como, aos apenas 10, 12 anos, manifestava uma paixão por exercícios científicos e fórmulas. "Já na época, em 1975, eu sabia que era uma pessoa técnica. Não gostava de história nem de literatura: as minhas notas eram mais para médias."

Por isso, ele entrou para a Faculdade de Criptografia da KGB. Além de muita matemática, lá aprendeu a programar. "Na época eu era muito indisciplinado, meio arruaceiro, meio hooligan. Achei que não me faria mal andar de ombreiras por um tempo. Por isso entrei para a escola militar. Mas nunca trabalhei para a KGB, só para o Ministério da Defesa."

Embora se dedique, sobretudo, a dirigir seu Kaspersky Lab, o informático confessa viver em estado de alerta constante, 24 horas por dia à procura de vírus. Um trabalho "que faz de qualquer pessoa um paranóico, não sou só eu. No tocante à segurança, sou um paranóico", enfatiza.

Porém o próprio objeto de seu trabalho transformou seu modo de ser: "Quem trabalha muito tempo com computadores desenvolve um 'sotaque de computês'. Pude observar isso depois de três anos: eu comecei a pensar como um computador".

Faturamento é segredo

Nascido em 4 de outubro de 1965 em Novorossiysk, Rússia, ele decifrou no final da década de 80 o seu primeiro vírus. Em 1997, juntamente com a esposa Natalia, fundou a firma Kaspersky Lab.

Antiviren-Hersteller Kaspersky lab
O informático (ao centro) e sua equipeFoto: dpa - Bildfunk

Kaspersky recorda que "em 1991 havia uma crise econômica na então União Soviética. Nós não tínhamos mais dinheiro nenhum para viver. Nessa época tentei vender meus primeiros programas antivírus, infelizmente sem sucesso. Em 1994 começamos a desenvolver as primeiras embalagens para os nossos produtos. Imagine só: não havia nem caixas de papelão, nem manuais de instrução, nada de nada. Em 1997 conseguirmos nos tornar independentes com a nossa firma."

Hoje, os Kaspersky contam, entre seus clientes, tanto multinacionais norte-americanas como empresas de médio porte. Usuários particulares representam apenas 10% de seu faturamento. Além da central em Moscou, sua empresa possui 11 filiais, com 550 funcionários, entre outros países, na Alemanha, Estados Unidos, França e Reino Unido. Seu faturamento absoluto é segredo: por não se tratar de uma sociedade anônima, a Kaspersky Lab não é obrigada a divulgar esse tipo de informação.

Brasil na vanguarda da cibercriminalidade

Atualmente a maior parte dos vírus é produzida na China, Brasil e Rússia, e não dos países industrializados, na Europa ou nos Estados Unidos, ressalta Kaspersky. Dois fatores determinam essa tendência:

"Primeiro: o desenvolvimento econômico. Em países com uma economia intacta, a taxa de criminalidade é mais baixa. Em segundo lugar: a mentalidade. No Japão, ninguém programa vírus, os japoneses não praticam cibercriminalidade, para eles seria uma vergonha."

Voltando o olhar para a Europa e os Estados Unidos, nota-se que a maioria dos vírus de computador é desenvolvida por imigrantes, prossegue o especialista russo. Ele é cético quanto a uma eventual vitória sobre a indústria de hackers: "Só se eliminarmos os computadores e as pessoas. Sempre houve criminosos e hooligans, e sempre vai haver. Mesmo se todo o mundo fosse educado, rico e satisfeito".

Com a palavra, o pânico

Kaspersky rebate a tese segundo a qual as firmas de segurança informática alastrariam o pânico em interesse próprio. Pelo contrário: a maioria das pessoas não tem noção de quão grande é o perigo. Segundo ele, as redes criminosas virtuais podem ser utilizadas até mesmo para atentados terroristas. Afinal, em todos os setores, o mundo da internet cresce para além do nosso mundo real.

"Já houve tentativas de travar uma guerra virtual. Em abril de 2001, um avião de espionagem norte-americano colidiu com um caça chinês. Em reação, hackers de ambos os países começaram a atacar os recursos informáticos do outro lado."

Hoje em dia, as informações da internet são cada vez mais importantes para o sistema estatal, lembra o Papa dos Vírus russo. "A destruição dessas redes computacionais poderia ser parte de operações militares, ou infiltração por propaganda. Pode levar à desinformação do adversário. Tudo é possível. Mas espero, é claro, que isso não venha a acontecer."

Um detalhe torna esse tipo de investida especialmente ameaçadora: no mundo virtual é muito simples apagar indícios, fato que dificulta a identificação dos responsáveis por ciberataques.

Autor: M. Marek / A. Eichenberg / A. Valente
Revisão: Carlos Albuquerque