Checkpoint Berlim: Proposta indecente
3 de abril de 2017Berlim, a cidade que se orgulha por seu multiculturalismo, costuma receber seus novos habitantes de braços abertos. Mas, como para toda regra, neste caso há também uma exceção. A hospitalidade é completamente esquecida se o novo morador vier da região da Suábia, que abrange boa parte do estado alemão de Baden-Württemberg, no sul do país.
A rivalidade entre berlinenses e suábios, principalmente os de Stuttgart, pode ser comparada à existente entre Brasil e Argentina. Em Berlim, o conflito ganhou até um nome: Schwabenhass, ou ódio aos suábios.
Os berlinenses costumavam acusar os suábios, que têm fama de caretas, de estarem acabando com o bairro Prenzlauer Berg, onde muitos que se mudaram para a capital resolveram morar. O conflito ganhou notoriedade em 2012, após um antigo parlamentar reclamar que o pão francês estava sendo vendido neste bairro como Wecken, nome suábio, e não mais como o berlinense Schrippen. Além da polêmica do pão, pichações apareceram no bairro mandando os suábios embora.
Recentemente, essa rivalidade atingiu um novo patamar: no centro da capital, está sendo reconstruído o antigo Palácio de Berlim. Além de recursos federais, a obra seria paga com doações.
Empresários de Baden-Württemberg tiveram a ideia de doar 5 milhões de euros, mas, em contrapartida, pediram que uma das salas do palácio recebesse o nome do estado. Seria como se os argentinos oferecessem esse dinheiro para financiar um museu no Brasil e pedissem que uma das salas fosse chamada de Maradona.
Os brasileiros provavelmente aceitariam a proposta, afinal, dinheiro é dinheiro, porém, virariam o jogo e tirariam sarro dos argentinos, dizendo que eles precisam pagar para que o ídolo deles receba homenagens, diferente do Pelé.
Mas, como os alemães não têm essa habilidade de rir da própria desgraça, a fundação responsável pela obra, mesmo precisando da doação, recusou o dinheiro e disse que só aceitaria se não precisasse homenagear Baden-Württemberg. O governo federal tentou mediar o conflito e fez uma contraproposta aos empresários: chamar uma das salas de Friedrich Schiller, um dos suábios mais famosos. Os doadores, porém, não estavam dispostos a fazer concessões.
E como ninguém estava disposto a ceder, os suábios, que têm fama de pão-duro na Alemanha, puderem economizar esse dinheiro, mas acabaram sem homenagens, e os berlinenses ficaram sem uma importante contribuição.
Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às segundas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.