1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Meio Ambiente

Valéria Noleto11 de maio de 2007

O professor Manuel Cesário denunciou durante conferência em Bonn o risco do aumento do número de casos de malária devido aos danos ambientais que poderiam ser provocados por projetos do governo local.

https://p.dw.com/p/AXCv
Amazônia tem segundo maior total de mortos por malária no mundoFoto: picture-alliance /dpa

Uma nova epidemia de malária poderá ocorrer nos próximos anos na Amazônia ocidental em conseqüência do desflorestamento que poderá ser provocado por projetos de desenvolvimento econômico a serem implementados na região. O alerta foi dado pelo professor Manuel Cesário, da Universidade de Franca, durante a conferência "Towards Sustainable Global Health", realizada de 9 a 11 de maio em Bonn.

Segundo Cesário, existem quatro grande projetos nesta região: as usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau em Rondônia e uma terceira na fronteira entre este estado e a Bolívia, além da construção da estrada Interoceância, que ligará o Acre ao oceano Pacífico, atravessando o Peru, para escoar a produção de soja brasileira. Ele teme que esses empreendimentos acarretem mudanças ambientais que propiciariam o aparecimento do mosquito Anopheles, transmissor da doença.

Manuel Cesário, Professor der Universität Franca in Brasilien
Professor Manuel CesárioFoto: CNPq

A construção de rodovias, por exemplo, incentiva a ocupação de suas margens e a destruição da vegetação ao redor. O professor revelou que 90% dos desmatamentos na Amazônia ocorrem justamente numa faixa de até 50 quilômetros de distância das estradas. Ele teme que esses projetos atraiam trabalhadores de outras regiões do país, que se instalem nessas áreas e acelerem o ciclo de devastação.

Além de desmatar para criar gado e praticar agricultura de subsistência, esses trabalhadores deixariam pelo caminho árvores caídas que acumularim água da chuva, criando poças propícias à reprodução do mosquito transmissor. Cesário explica que, para cada 1% de área desmatada, há um aumento de 8% na quantidade do mosquito Anopheles.

Problema antigo

O professor lembra ainda que essa não seria a primeira vez que um projeto de desenvolvimento econômico provocaria uma epidemia de malária na região. Entre o final do século 19 e o início do 20, a construção da ferrovia Madeira-Mamoré, planejada para promover o escoamento da borracha, atraiu uma grande quantidade de trabalhadores estrangeiros e de outras regiões que não tinham contato com a malária.

Esses operários adoeceram da forma mais aguda da enfermidade, o que provocou a morte de cerca de 7 mil pessoas. A construção desta rodovia e a migração de nordestinos para extração de borracha foram os responsáveis pelas primeiras epidemias de malária na Amazônia. O outro boom da doença, segundo Cesário, foi durante a década de 70, devido aos grandes projetos de desenvolvimento do período do "milagre brasileiro".

Amazônia ocidental já sofre com a doença

Atualmente, existe uma tendência de aumento dos casos da doença em todos os nove estados da Amazônia brasileira, principalmente na parte ocidental, ou seja, Rondônia, Acre e parte do Amazonas. A causa desse crescimento seria a migração de habitantes de outras regiões provocada pelas políticas econômicas dos estados do Acre e de Rondônia.

Segundo o professor, tais políticas aliadas ao trânsito de traficantes de madeira na região fez com que a quantidade de casos de malária no Acre mais que dobrasse entre 2003 e 2004, e aumentasse em 50% entre 2004 e 2005, resultando num aumento de quase 200% ao longo desses três anos.

Cerca de um milhão de crianças morre por ano no mundo devido à malária. A região com maior número de óbitos é a África Subsaariana, seguida pela Amazônia, que concentra 90% dos casos da doença nas Américas.

Regenwald in Amazonas
Desmatamentos ocorrem a até 50 kms de distância das estradasFoto: AP

"A solução é cumprir a lei"

Para o pesquisador, a solução é cumprir a legislação. A Resolução nº01/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) determina que, antes da implementação do projeto, a empreiteira faça um estudo de impacto ambiental para ser analisado pelo Ibama. Se avaliação for negativa, o instituto poderá obrigar a construtora a realizar medidas compensatórias para reduzir os danos previstos.

"O que se faz muitas vezes no Brasil é prestar uma atenção cada vez maior, mais minuciosa aos estudos de impacto, mas ainda está faltando prestar atenção na implementação das medidas mitigatórias. Ou seja, os mecanismos legais já existem, o que precisa é que sejam respeitados e colocados em prática ", defendeu Cesário em entrevista à DW-WORLD.

O professor reclama ainda da acusação do presidente Luís Inácio Lula da Silva de que os Ibamas regionais e nacional estariam retardando a aprovação de projetos de desenvolvimento. Para ele, a demora é causada pela complexidade das análises e a necessidade de assegurar medidas compensatórias aos possíveis danos causados.

"É complicado ver o presidente da República tentar inverter a ordem das coisas. Infelizmente, o que tem uma prioridade maior no Brasil é a economia e não a área ambiental e de saúde. A raiz do problema é o nosso modelo econômico que prioriza a exportação de soja para China em detrimento de danos ambientais e de saúde que poderiam ser evitados."