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Disputas de terras no Paraguai movimentam autoridades brasileiras

5 de março de 2012

Políticos do Brasil planejam visita a colegas paraguaios para discutir conflitos envolvendo produtores brasileiros no país, os "brasiguaios", e grupos de sem-terra no país.

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Foto: Friends of the Earth

Parlamentares brasileiros planejam, em abril, ir à capital Assunção pedir aos colegas paraguaios um maior empenho para resolver os conflitos agrários na região de fronteira entre os dois países. Nas últimas semanas, sem-terra paraguaios, conhecidos como carperos, intensificaram invasões a propriedades de colonos brasileiros que há décadas vivem no Paraguai – os chamados "brasiguaios" – despertando apreensão entre os produtores.

"Queremos conversar com o Congresso paraguaio e mostrar o que o Brasil poderia fazer para ajudar na regularização fundiária daquele país, principalmente no que diz respeito à reforma agrária, para que ela dê certo por lá, assim como tem dado no Brasil nos últimos anos", explica o senador Sérgio Souza, idealizador de uma comissão externa do Senado para tratar do assunto.

De acordo com Souza, os parlamentares também devem pedir a intermediação dos colegas paraguaios para uma maior "segurança jurídica" aos cerca de 350 mil brasileiros que, segundo o senador, atualmente respondem por aproximadamente 20% do PIB paraguaio, especialmente através do plantio de soja.

Há cerca de 20 dias, o governo comandado pelo presidente Fernando Lugo retirou aproximadamente 6 mil carperos que estavam acampados em terras dos brasiguaios em Nacundae, no Alto Paraná. A maioria ocupava uma área dentro da propriedade de Tranquilo Fávero, conhecido como o "Rei da Soja" do país. Os sem-terra foram levados provisoriamente para uma área próxima, que estaria dentro do perímetro do Parque de Nacundae.

"Precisamos muito dessa segurança jurídica e do respeito à propriedade privada, que é inviolável e estabelecida pela lei nacional. Só queremos que ela seja cumprida", afirma a advogada Marilene Sguarizi, representante dos "brasiguaios".

Escalada para pedir ajuda ao governo brasileiro a fim de intervir em favor dos colonos na questão, Marilene esteve há poucos dias em Brasília, onde conversou com diversas autoridades. Ela obteve a promessa do Itamaraty de um acompanhamento bem de perto da questão. Cautelosa, porém, a diplomacia brasileira ressalta tratar-se de um "assunto interno" do Paraguai.

Troca de acusações

Os sem-terra alegam que grande parte dos títulos de propriedade das terras, adquiridos nos tempos do então ditador paraguaio Alfredo Stroessner, são falsos, e exigem que o governo paraguaio realize uma reforma agrária efetiva. Eles reclamam que, enquanto muitos brasileiros fizeram fortuna explorando terras paraguaias, boa parte da população amarga péssimas condições de vida.

Já os "brasiguaios" garantem que não há nada de errado com sua documentação. As terras foram adquiridas entre as décadas de 60 e 70 a preços ínfimos. Filho de alemão, Stroessner teria incentivado a imigração de agricultores brasileiros – a maioria de ascendência italiana ou alemã, como o próprio ex-presidente – para modernizar e profissionalizar a exploração da terra no país. Estes produtores dedicaram-se a cultivo da soja e ajudaram a fazer do Paraguai o quarto maior exportador mundial do grão.

Marilene Sguarizi explica que cerca de um quarto dos "brasiguaios" tem enfrentado dificuldades com a Justiça paraguaia nos últimos tempos. Um dos problemas, segundo ela, é a "sobreposição de títulos de propriedade" – ou seja, dois donos para o mesmo terreno – problema que começou a aparecer a partir da década de 1970 com a reforma do registro civil paraguaio. "Foram expedidos mais títulos do que terras", afirma Sguarizi.

Outro entrave seriam as constantes ameaças de reforma agrária sobre terrenos considerados pelo sem-terra "excedente fiscal", os quais os produtores alegam serem produtivos. "São terras produtivas e documentadas. E mesmo que houvesse excedente, é o Estado que deveria fazer a reforma, as pessoas não podem invadir", reclama.

Conflitos antigos

De acordo com o Ministério do Interior do Paraguai, porém, a questão é complexa e vem de administrações anteriores. Cerca de 85% das terras cultiváveis paraguaias estão nas mãos de apenas 3% dos produtores. O ministério, no entanto, não precisa quantos seriam brasileiros. Até porque, como chegaram há três, quatro décadas, muitas terras são administradas por filhos dos "brasiguaios", ou seja, paraguaios.

Tensões entre agricultores brasileiros e os campesinos paraguaios vêm de longa data. O sociólogo Ricardo Costa de Oliveira, professor da Universidade Federal do Paraná, ressalta que além do conflito de origem econômica, há ainda o de fundo étnico. De origem europeia, a pele branca e os olhos claros dos colonos brasileiros os diferenciam dos paraguaios de origem guarani, com seus traços indígenas e a pele mais escura.

"Em vários países hispânicos, como Bolívia, Venezuela, a questão étnica, indígena, entrou na agenda política dos governos", diz o professor. Segundo ele, com o início, no Paraguai, da gestão Fernando Lugo, de esquerda, houve ainda um reforço ao discurso nacionalista e aos movimentos sociais, como o dos carperos.

O sociólogo, no entanto, não acredita que o movimento dos sem-terra contará com grande apoio do governo, até pelo peso econômico e político dos produtores no país. Ele fala de uma "teatralização" da relação entre o governo paraguaio e os sem-terra. "O Paraguai é extremamente dependente de tudo do Brasil, como portos, energia, mercados. A projeção do Brasil é muito intensa em todos os países de fronteira", avalia o especialista.

Autora: Mariana Santos
Revisão: Augusto Valente