Crianças russas aprendem a guerrear nas férias
30 de julho de 2018Exercícios matutinos e um café da manhã com omeletes e aveia: no acampamento militar Razvedbat, numa floresta fora de Moscou, o dia começa da mesma forma que em milhares de outras colônias de férias russas – até as 30 crianças vestirem seus uniformes. Em russo, Razvedbat é a abreviação de batalhão de reconhecimento – e o símbolo do campo é baseado no emblema da inteligência militar da Rússia.
Há apenas uma menina em todo o acampamento. As crianças ali têm entre 10 e 16 anos e são divididas por idade em três batalhões. Algumas delas ainda estão amarrando o seu lenço de camuflagem quando entram em formação ao som de um estimulante rock russo.
Os instrutores estabelecem o cronograma do dia: um exercício de retiradas de minas explosivas de um campo, prática de montagem de fuzis AK-47 e uma sessão de manuseio de armas. O dia termina com uma grande partida de paintball, com a garotada indo pegar suas armas.
Apesar da chuva, o batalhão começa o dia caçando terroristas em construções. Eles se equiparam com capacetes e equipamento de rapel. Com armas de ar, os adolescentes descem uma fachada e pulam pelas janelas. "Limpo!", bradam eles. Os instrutores dizem para gritarem mais alto.
Todos os instrutores do Razvedbat têm experiência militar. Alguns deles são até mesmo soldados na ativa. Eles afirmam que os cenários ali são baseados em missões atuais do Exército russo.
"Tudo o que eu trouxe comigo dos conflitos locais mais recentes, tudo o que vimos lá, tudo o que é novo – passamos tudo isso para as crianças", disse o instrutor do acampamento Aleksey, que prefere não revelar o sobrenome.
Um dos garotos da unidade é Nikita, de 15 anos, proveniente de Moscou. Seus pais não estão no Exército, mas ele diz que pensa em se tornar soldado. Nikita explica que o acampamento é sua maneira de descobrir se a carreira militar é uma opção para ele a longo prazo.
Ele revela que gosta do sentimento de aventura dali, embora admita que às vezes pode passar frio ao dormir nas barracas e que sente falta do contato com família e amigos. No acampamento, a garotada só pode falar meia hora por dia ao telefone.
"Você não se sente como um cidadão russo normal aqui. Você se sente como um soldado, talvez até em outro país e numa missão secreta. É totalmente diferente da vida cotidiana", confessa Nikita. Embora as crianças sejam enviadas ocasionalmente para aprender disciplina no acampamento, os organizadores dizem que, para muitos dos participantes, trata-se de uma "amostra da vida militar".
Os olhos de um participante de 14 anos no grupo brilham enquanto ele fantasia sobre o seu futuro. "Talvez eu me torne até mesmo um mercenário", diz ele, antes de ser afastado do assunto por aqueles ao seu redor.
A programação de duas semanas do Razvedbat inclui habilidades em primeiros socorros e leitura de mapas, mas as armas parecem desempenhar um papel fundamental. Os participantes do acampamento praticam carregar e recarregar fuzis de assalto AK-47, montando-os e desmontando-os e se movimentando com eles. É claro que existem regras: as armas não são carregadas com balas de verdade e não podem ser apontadas para as pessoas – exceto durante o paintball. É nítido o entusiasmo dos garotos. Nikita admite: "Eu sempre senti atração por armas."
"Se dependesse de mim, os meninos dormiriam com suas armas", explica Aleksey entre um exercício e outro. "Um homem sempre deve carregar uma arma. Afinal, é sua tarefa proteger os fracos, proteger as mulheres. Se ele não possuir uma arma, ele basicamente não é mais um homem."
Seu colega Aleksey Skotnikov, outro instrutor, é mais ponderado. Segundo ele, para as crianças mais novas do grupo, ainda "é muito cedo" para aprender a lidar com armas, já que elas devem desenvolver um senso de responsabilidade com armamentos, em vez de sentirem que fazem parte de um jogo.
Skotnikov explica, porém: "Acho que por volta dos 14 anos, crianças precisam ser introduzidas nos armamentos. Se um menino é forte o suficiente para segurar uma arma, ele deve saber usá-la". Ele acrescenta que a Rússia precisa "uma geração forte" de "crianças dignas", particularmente depois que, segundo afirma, uma geração inteira não foi criada adequadamente após o colapso da União Soviética.
Razvedbat é um campo privado e não recebe financiamento do governo. A diretora do acampamento, Olga Lagutina, explica que a programação da colônia de férias não está focada no patriotismo. Em vez disso, a ênfase está na aptidão física e em dar aos meninos uma sensação de responsabilidade e trabalho em equipe. "É claro que, no final, eles defenderiam o seu país e não iriam passar para o lado do inimigo. Mas nós não os estamos preparando para a guerra. Aqui, nós não falamos de guerra", insiste Lagutina.
Mesmo assim, o acampamento militar certamente combina com o clima geral que reina na Rússia. Uma pesquisa de junho financiada pelo governo mostrou que 92% dos russos se consideram patriotas, a maior porcentagem desde que Vladimir Putin chegou ao poder em 2000.
E uma diretriz do governo sobre "educação patriótica" de cidadãos russos, que foi aprovada no ano passado, elogia especificamente os acampamentos militares como uma forma eficaz de suscitar o patriotismo entre os jovens. Desde 2015, o governo deu início até mesmo ao seu próprio movimento militar juvenil patriótico, uma espécie de Exército de jovens conhecido como Yunarmiya. De acordo com o Ministério da Defesa da Rússia, o movimento possui cerca de 200 mil membros.
O patriotismo pode não fazer parte da agenda oficial do acampamento Razvedbat, mas claramente se espalhou entre os adolescentes dali. No final de um longo dia, os meninos da unidade 1 se reúnem em volta de uma fogueira com um instrutor para falar sobre suas impressões.
"O patriotismo é importante para mim", diz Nikita. "E aqui no acampamento, ele também é importante – se você já tem esse sentimento dentro de si, ele se desenvolve aqui. É impossível estar aqui sem ser patriótico."
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