Dia Mundial da Alimentação
16 de outubro de 2008Os governos dos Estados Unidos e da Europa anunciaram pacotes bilionários para conter os efeitos da crise financeira mundial. Só na Europa, foram colocados à disposição quase 2 trilhões de euros, enquanto o total investido na ajuda ao desenvolvimento em todo o mundo é de apenas 75 bilhões de euros – uma redução em comparação ao ano passado. Se esse volume continuar a cair, isso pioraria ainda mais a situação alimentar em países em desenvolvimento.
Apesar da queda drástica do preço do milho, do trigo, da soja e do petróleo nos últimos meses, especialistas temem que a recessão que bate à porta terá conseqüências dramáticas para o problema da fome no mundo.
"Os meios de ajuda ao desenvolvimento estão acoplados diretamente ao produto social bruto. Se ele diminuir, por exemplo se a Alemanha fabricar menos veículos para exportação, diminui também o montante investido em desenvolvimento, o que afeta negativamente a segurança alimentar", explica Rafael Schneider, da Ação Agrária Alemã.
Segundo a ONG, a redução da ajuda ao desenvolvimento implicaria num retrocesso na luta contra a fome. O Programa Alimentar Mundial (PAM) das Nações Unidas recebeu neste ano mais de 4 bilhões de dólares dos governos – 60% a mais que no ano anterior. Mas também o total de vítimas da fome no mundo aumentou. Segundo o PAM, já são mais de 900 milhões.
Para Scheinder, a União Européia (UE) deveria não apenas contribuir mais, mas empregar de forma mais sensata sua ajuda ao desenvolvimento. "A reação correta seria rever seu orçamento e investir uma porcentagem maior em agricultura e desenvolvimento agrário. Atualmente, ela é de 2 a 3% do orçamento total e isso é claro que não basta, há muito o que melhorar nesse aspecto", explica Schneider.
Em países emergentes e em desenvolvimento, muitos agricultores passaram a cultivar, em vez de alimentos, plantas utilizadas na produção de biocombustíveis – tendência que a UE tentou combater ao reduzir de 10% para 4% a parcela mínima de biocombustíveis contida nos combustíveis normais até 2020.
Mercado regional é "caminho errado"
Mais alimentos e menos combustíveis, cobram especialistas. No entanto, produzir alimentos para comercializá-los apenas nos próprios países de cultivo seria o caminho errado para solucionar a crise, alerta Michael Brüntrup, do Instituto Alemão de Política de Desenvolvimento.
"Deve-se produzir para o mercado que oferece os melhores incentivos, que é estável e tem bons preços. Seria errado se países em desenvolvimento se limitassem a um modelo baseado em pequenos mercados regionais."
Segundo ele, preços mais altos para produtos agrários representam uma chance para países em desenvolvimento, onde a maior parte da população vive no campo. Pois, se camponeses ganharem mais pelo que produzem, podem empregar trabalhadores, aumentar sua produção e investir em automação, além de gastar mais com bens de consumo e serviços.
"Se os preços estiverem de 10 a 20% maiores que no final de 2006 e no início de 2007, isso poderia ser digerido pelos consumidores, os governos poderiam amortecer o impacto fortalecendo seus sistemas de seguridade social e isso provavelmente daria estímulos suficientes aos camponeses para investir mais", explica Brüntrup.
Proteger quem não cultiva
A longo prazo, isso beneficiaria toda uma comunidade rural. No entanto, tal modelo só funcionaria se os consumidores realmente pudessem pagar pelos alimentos, o que muitos atualmente não podem. Por isso, é preciso incentivar também os que não cultivam, argumenta Schneider. "É preciso criar sistemas de seguridade social e programas de ocupação profissional", argumenta.
A responsabilidade afinal não está apenas nas mãos dos países desenvolvidos e de organizações de ajuda ao desenvolvimento. Segundo o Instituto Alemão de Política de Desenvolvimento, alterar a política agrária em prol da população rural é uma obrigação moral dos países afetados.