Defesa vê "ficção sem provas" na acusação contra Temer
5 de julho de 2017Os advogados do presidente Michel Temer entregaram nesta quarta-feira (05/07) a defesa dele à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, que nos próximos dias analisará a denúncia apresentada contra o presidente pela Procuradoria-Geral da República (PGR). A defesa foi entregue pelos advogados Antônio Mariz e Gustavo Guedes.
Análise: Onde Temer se escora para não cair
Áudio é "ilícito" e "não prova nada"
No documento de quase cem páginas, os advogados negam todas as acusações da PGR e afirmaram que elas são apenas "ilações sem provas". Segundo a defesa, a denúncia é "inconsistente, frágil e desprovida de força probatória" para que a Câmara conceda autorização para um processo penal.
Os advogados desqualificam as acusações, que se apoiam sobretudo em depoimentos de diretores da empresa JBS e num áudio entregue à Justiça por um dos proprietários dela, o empresário Joesley Batista. O áudio foi gravado durante uma visita dele ao Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer. A defesa afirma que não há nada comprometedor nas gravações e critica que não tenha sido feita uma "análise técnica independente" para confirmar se, como afirma o presidente, o som foi editado.
"A gravação, em verdade, não possui solidez para dar embasamento às acusações, e isto por tríplice razão. A primeira trata de prova ilícita, visto ter ela sido feita sem um escopo que lhe desse legitimidade. Por outro lado, sofreu adulterações, cortes e interrupções que lhe retiram a autenticidade e, por fim, mesmo que superadas as deficiências anteriores, não possui conteúdo incriminador, pois nenhum só de seus trechos revela prática delituosa", afirmam os advogados de Temer.
Mariz insistiu que "não há sequer indícios de que, pelo conteúdo do áudio, o presidente tenha incorrido em delito de corrupção passiva", acusação feita pela PGR. "Tirante as declarações prestadas por Joesley Batista e Ricardo Saud no sentido de que o dinheiro entregue a Rodrigo Loures seria para Michel Temer, não há nenhuma prova sequer indiciária de que tenha ele praticado qualquer ilícito."
500 mil reais
A acusação também afirma que Temer seria o destinatário de 500 mil reais que seu antigo assessor Rodrigo Rocha Loures recebeu da JBS e que estavam numa mala que foi entregue numa pizzaria de São Paulo. O encontro foi filmado pela Polícia Federal. Rocha Loures, acusado no mesmo processo que Temer, está em liberdade condicional e admitiu ter recebido o dinheiro, mas não disse por que o recebeu nem se ele era para o presidente, como afirmou Batista.
A defesa de Temer assegura que a acusação se apoia em "meras ilações" para "tentar construir" um "nexo que não existe" entre o mandatário e o dinheiro, e exige que sejam apresentadas provas concretas ou que se retire a acusação. "A infamante acusação vem desprovida de provas. Não se aponta quem entregou para quem; aonde ocorreu o encontro para a entrega; qual o dia desse encontro, horário. Enfim, dados fundamentais para que não pairasse a pecha de leviandade e de irresponsabilidade sobre esta malévola atribuição. E esses dados não foram colocados na denúncia simplesmente porque inexistem", afirma a defesa de Temer.
"O acusador não disfarça o seu grande esforço em emprestar alguma robustez a uma acusação manca e anêmica. Para tanto, usa de todos os artifícios criados pela sua inteligência, não só voltados para a cultura jurídica, como também para uma eficiente atividade ficcional, com o objetivo de suprir as carências de fatos no mundo real e substituí-las por hipotéticos e fantasiosos eventos supostamente comprometedores."
Próximos passos
Caberá agora ao relator, deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ), analisar a denúncia e os argumentos da defesa de Temer para elaborar o parecer sobre a admissibilidade dela ou não. Pelo cronograma definido hoje na CCJ, o relator deverá entregar seu parecer já na próxima segunda-feira. Após a leitura e discussão, a defesa do presidente poderá se manifestar.
Também é possível ter pedido de vista coletivo por até duas sessões da Câmara, o qual será decido pelo presidente da CCJ, deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG). Assim, a data de votação do parecer pela comissão ainda é incerta. O governo gostaria que ele fosse votado já na semana que vem, o que pode acabar não ocorrendo. Os prazos também dependem de o recesso parlamentar de julho ser suspenso ou mantido.
Independentemente do resultado na CCJ, o relatório deve seguir para análise do plenário da Câmara – segundo a Constituição, o Supremo Tribunal Federal (STF) não pode analisar uma denúncia contra o presidente da República sem antes obter autorização dos deputados.
Em votação no plenário, são necessários os votos de dois terços dos parlamentares, ou 342 de 513 deputados, para que o processo avance. Se a ação for admitida na Câmara, ela vai ao STF para ser julgada. Mas em caso de rejeição, a denúncia é arquivada e não pode ser analisada pela corte.
Se a ação passar ao STF, o presidente pode ser afastado por 180 dias se a maioria dos 11 ministros forem favoráveis a Temer se tornar réu por corrupção passiva. Nesse caso, quem assume a presidência é o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Se não houver maioria no STF, Temer segue no comando do país.
A ação contra Temer
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou Temer pelo crime de corrupção passiva, tornando-o o primeiro presidente da República a ser denunciado no exercício do mandato.
A acusação tem como base um inquérito contra o peemedebista decorrente da delação de executivos da JBS. Ele é investigado ainda pelos crimes de obstrução de Justiça e participação em organização criminosa, mas, por esses delitos, a PGR ainda não apresentou denúncia.
Segundo Janot, o presidente foi o beneficiário de uma mala contendo 500 mil reais em propina entregue em abril por um diretor da JBS, Ricardo Saud, a Rodrigo Rocha Loures, ex-assessor especial de Temer. A empresa teria prometido um total de 38 milhões de reais, que não teriam sido entregues.
O procurador-geral da República pede que Temer seja condenado a pagar 10 milhões de reais por reparação de danos morais à coletividade. Loures também é alvo da mesma ação.
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