Denúncia de uso de armas químicas por rebeldes agrava impasse na Síria
6 de maio de 2013Se o novo ataque israelense em território sírio parecia reforçar a pressão por uma intervenção americana no conflito, a declaração de uma investigadora da ONU de que a oposição – e não o regime de Bashar al-Assad – usou armas químicas contra a população pode dar mais tempo ao governo Barack Obama para reavaliar as opções.
A denúncia foi feita pela jurista suíça Carla Del Ponte, membro de uma comissão de investigação independente da ONU, e adiciona mais um elemento ao já complicado jogo de poderes da guerra síria – cada vez mais distante de uma solução diplomática. Segundo ela, com base numa ampla investigação o grupo de especialistas tem indícios de que os rebeldes empregaram o gás sarin, substância altamente tóxica que atua sobre o sistema nervoso.
"Nossos investigadores estiveram em países vizinhos à Síria, entrevistaram vítimas e médicos nos hospitais de campanha. E, segundo os informes que vi, há suspeitas fortes e concretas, ainda que sem provas irrefutáveis, de uso de gás sarín", disse Del Ponte a um canal de TV suíço. "Foi uso por parte da oposição, dos rebeldes, não pelas autoridades governamentais."
Chefiada pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, a comissão da qual Del Ponte faz parte é independente e tem a função de determinar se houve violações dos direitos humanos no conflito. Outra, definida pela Secretaria-Geral da ONU e que busca verificar o uso de armas químicas na guerra, ainda não pôde iniciar seu trabalho, uma vez que não tem autorização para entrar na Síria.
Em comunicado nesta segunda-feira (06/05), a comissão de Pinheiro reiterou que não há "provas conclusivas" do uso de armas químicas pelos rebeldes, mas, ao mesmo tempo, não negou terem sido encontrados indícios, como denunciara Del Ponte.
Opção militar em pauta
Repetidas vezes, Obama deixou claro que o uso de armas químicas seria a "linha vermelha", cuja ultrapassagem justificaria uma intervenção militar internacional. E quando, no último mês, recebeu provas de Israel, França e Reino Unido de que tal armamento havia sido usado (supostamente por Assad), optou pela cautela.
A opção de intervir militarmente no conflito sírio já vinha sendo discutida pelos EUA, o Reino Unido e a França nos dias anteriores ao ataque israelense, segundo fontes citadas pelo jornal New York Times. E parte da relutância de Obama em ir adiante se deveria, de acordo com as mesmas fontes, à capacidade das baterias antiaéreas da Síria e ao fato de as forças rebeldes serem compostas também por jihadistas.
No domingo, reforçando a pressão, o senador republicano John McCain, uma das vozes mais ativas contra Obama, argumentou que a ação israelense refutaria os argumentos de que o sistema de defesa antiaéreo da Síria seria um desafio a uma eventual ação. "Os israelenses parecem ser capazes de penetrar [na Síria] com facilidade", afirmou.
Nenhuma autoridade israelense foi ainda a público assumir a responsabilidade pela ação na Síria – o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, por exemplo, manteve a agenda e viajou para a China, sem mencionar o ocorrido.
Mais de 40 mortos nos ataques
Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos, ONG baseada em Londres, os bombardeios israelenses contra três postos militares na Síria deixaram 42 mortos no fim de semana. A Síria qualificou a ação como "uma declaração de guerra". Israel, segundo fontes da inteligência ocidental, mirava carregamentos de armas iranianas com destino à milícia radical libanesa Hisbolá.
O Hisbolá tem no Irã o seu patrono e, na Síria, sua fonte principal de abastecimento. Sem o caminho aberto pelo regime de Bashar al-Assad, o grupo libanês não teria como receber armas, dinheiro e se manter em operação. Por sua vez, o Irã tem na Síria seu último e mais valioso ponto de apoio no mundo árabe.
Nesta segunda-feira, o general Masud Jazayeri, adjunto do chefe do Estado-maior das Forças Armadas iranianas, negou que os locais alvejados por Israel tivessem armas enviadas por Teerã. "O governo sírio não precisa de armas iranianas, e esse tipo de informação faz parte da guerra de propaganda e psicológica", afirmou.
Segundo o jornal israelense Yediot Aharonot, através de uma carta secreta endereçada a Damasco, o governo Netanyahu teria informado ao regime de Assad que a intenção dos ataques não era "intervir na guerra civil", mas sim atingir bases do Hisbolá em território sírio.
RPR/rtr/ap/afp/lusa