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Desglobalizando o fórum social?

Simone de Mello6 de novembro de 2002

O primeiro Fórum Social Europeu, realizado de 6 a 10 de novembro, em Florença, retoma a pauta antineoliberal de Porto Alegre, destacando especificidades regionais e o papel da Europa como pólo de resistência pacifista.

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Seis mil policiais vigiam Florença durante o Fórum Social EuropeuFoto: AP

O Fórum Social Europeu (FSE) começou nesta quarta-feira (6), em Florença, com a ocupação simbólica da base militar norte-americana de Camp Wardy, onde 4000 manifestantes protestaram contra a política militar dos EUA. O enorme contingente policial convocado para vigiar a cidade é sinal de que as autoridades italianas temem conflitos comparáveis aos ocorridos durante a cúpula do G8, no ano passado, em Gênova.

Justamente no país em que os protestos à política neoliberal foram alvo de violenta repressão, o movimento dos críticos da globalização aborda – ao lado de outras prioridades temáticas, como os efeitos do neoliberalismo e a democracia de base – a responsabilidade européia em defender a paz mundial. "Este fórum vai ser um importante sinal de resistência a uma guerra contra o Iraque. No fim de semana passado, os protestos pacifistas em mais de cem cidades alemãs foram realizados com forte apoio da Attac", ressalta Sven Gigold, fundador da Attac-Alemanha, em entrevista à DW-WORLD.

Descentralização ou "desglobalização"?

No entanto, o FSE não quer se reduzir ao gesto de protesto, propondo-se a discutir uma ampla pauta, dominada sobretudo por questões especificamente européias. Com fóruns regionais, os críticos da globalização pretendem descentralizar o movimento, concentrando-se em questões locais, para depois articulá-las numa rede global. "No fundo, a globalização não é organizada globalmente; ela parte de decisões concretas, tomadas em nível local", ressalta Gigold.

Política orçamentária e econômica, auto-suficiência em produção de alimentos, resistência contra a política militar norte-americana, reaparecimento do extremismo de direita, expansão da UE para o Leste Europeu, criminalização de conflitos sociais e militarização de fronteiras, situação trabalhista diante da produção global, migração, racismo e política de estrangeiros: estes são algumas das questões político-econômicas européias que o FSE de Florença vai debater, com a participação de representantes de todos os países da UE, Leste Europeu, Rússia, Turquia, Israel e Palestina.

"A Física pode ter inventado uma fórmula universal, mas não existe uma fórmula política mundial", resumiu Hugo Braun, da ATTAC-Alemanha, em entrevista à DW-WORLD, justificando a importância de os críticos da globalização se organizarem em fóruns regionais. Resta saber se a descentralização do movimento não acabará levando a uma regionalização exagerada das questões, correndo o risco de "desglobalizar" o movimento.

Englobando o mainstream político e institucional

Ao se expandir, o movimento antiglobalização se defronta com o problema de como harmonizar a representatividade da política de base com a eficácia de uma rede de associações locais, que têm interesses semelhantes, mas tarefas completamente diversas. Outra questão fundamental para um movimento espontâneo que vem se estabelecendo cada vez mais é sua proximidade do establishment político e institucional.

Este FSE conta com uma maior participação de sindicalistas e políticos. "Há parlamentares acompanhando o fórum, mesmo sem participar diretamente dele" – explica Gigold – "Ficamos satisfeitos em saber que eles nos apóiam, mas temos certeza de que só a pressão popular pode fazer alguma coisa mudar dentro dos partidos estabelecidos". No entanto, o comitê italiano de organização do FSE chegou a fazer um levantamento de partidos políticos afins ao movimento em diversos países europeus, com a colaboração de organizações não-governamentais.

A exceção brasileira e o PT

Para Gigold, nenhum partido alemão inspira os críticos da globalização a um diálogo direto. "A política econômica do governo social-democrata e verde faz apenas uma crítica mais retórica à globalização, falando de ‘justiça global’, sem tocar entretanto em nenhuma prioridade do nosso movimento" – comenta o economista Gigold, membro do comitê de coordenação da Attac – "Basta ver o programa dos Verdes, que não se opõe ao monetarismo europeu e nem repudia explicitamente os planos de privatização nos setores de abastecimento de água, energia, saúde e educação."

O fato de os fóruns sociais mundiais de Porto Alegre terem sido realizados com o apoio da administração petista é uma exceção, avalia Gigold: "No Brasil, a situação é completamente diferente. Lá existe o PT, um partido que vem implementando com sucesso justamente a política reivindicada pelos críticos da globalização. Na Alemanha, estamos longe disso. Aliás, em toda a Europa estamos longe disso."